24
de junho de 2013 | N° 17471
PAULO
SANT’ANA
O tsunami nas ruas
Estamos
vivendo nas ruas um momento de sublime irracionalidade.
Noto
todo mundo tentando explicar esse fenômeno de manifestações nunca antes vistas
no Brasil. Até que muitas análises são bem razoáveis, outras bem fundamentadas.
Mas
eu penso que esse fenômeno não se explica. Por acaso, o terremoto se explica?
Os cientistas tentam explicar a origem dos terremotos, mas são explicações
insuficientes.
Assim
também esse terremoto que se instalou nas ruas carece de mais fundada explicação.
Eu não quero dizer que não haja motivos para que as multidões protestem nas
ruas. Há milhares de motivos.
O
que eu quero dizer é que não se explica que esses motivos sempre existiram e
nunca ninguém saiu para as ruas com tanta intensidade, tanto que ninguém sabe
quando é que vão parar as manifestações.
Hoje
dizem que vai haver mais.
Um tsunami
não se explica. E estamos diante de um tsunami social, que inunda as casas
pelas internet e se derrama pelas avenidas.
Um
terremoto, um tsunami, essas passeatas todos os dias são forças da natureza. Elementos
da natureza que de repente explodem. E não adianta querer procurar as causas.
O
colega Luiz Antônio Araujo escreveu ontem em ZH brilhante artigo, por acaso no
dia de seu aniversário, pelo que lhe mando um abraço.
Ele
terminou seu sensível e inesquecível artigo assim: “Este espanto que as manifestações
causam em tantas pessoas me lembra da senhora que foi assistir ao filme Troia e
levou um susto quando os gregos começaram a sair do interior do cavalo de pau”.
Mas
sempre que olho para as manifestações ligo-as às emergências lotadas dos
hospitais a recusar pacientes, ligo-as à fila sinistra do SUS que só vai
atender os que se inscrevem dali a cinco anos, oito anos, quando já estarão
mortos ou mutilados. E vá Copas das Confederações e do Mundo bilionárias para
divertir os desgraçados.
Essas
passeatas, sem dúvida, em parte inconscientemente, são um libelo contra o caos
da saúde no Brasil.
E são
libelos conscientes contra a construção de estádios de futebol suntuosos,
enquanto faltam milhares de hospitais no Brasil. Tanto se constituem em acusação
ao sistema político que ostentam cartazes condenando a Copa do Mundo no Brasil.
Da
minha parte, faz anos que empunho cartazes exatamente com esses dizeres aqui
nesta coluna: fui o primeiro jornalista que se declarou contra a Copa do Mundo
aqui e fui o primeiro e único jornalista a verberar com veemência e
continuidade as filas mortuárias do SUS.
Por
isso, enquanto vejo as multidões desfilar pelas avenidas, descanso em paz com a
minha consciência: eu fiz o que tinha de ser feito.
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