quarta-feira, 19 de junho de 2013


19 de junho de 2013 | N° 17466
PAULO SANT’ANA

Boca no trombone

Mais de 300 mil pessoas saíram às ruas nas principais cidades brasileiras anteontem para protestar contra fatos que agora vão ficando mais claros e definidos.

Entrevistados pela imprensa, disseram que protestavam contra a corrupção, contra o dinheiro público gasto nas obras para a Copa do Mundo e em protesto contra as condições da saúde brasileira, entre outros motivos.

Fico pensando que, em grande parte de seus motivos, esta coluna já protesta há muitos anos.

Eles protestam contra a fila sinistra do SUS que não atende os miseráveis inscritos, que levam de quatro a oito anos para serem operados, a maioria deles morrendo antes do atendimento. Não posso entender como é que uma pessoa que sente uma dor em determinada parte do corpo e marca uma consulta só será atendida dali a dois anos, é muito claro que não há atendimento nenhum, pois ele deveria ser de urgência. E incrivelmente leva anos.

Não tem de ter fila nenhuma, isto é um absurdo colossal, um dia, como eu esperava, o povo iria sair às ruas para protestar.

Eles protestam contra a corrupção: a única condenação sofrida pelos políticos nos últimos tempos, a do mensalão, não foi levada a efeito, não foi ninguém preso, e ao que tudo indica ninguém o será.

Isso não chega para levar às ruas centenas de milhares de brasileiros? Isso é uma barbaridade. A maioria dos manifestantes se comportou pacificamente. Menos de 1% deles cometeu desordem e vandalismo.

Em Nova York, 300 brasileiros lá residentes protestaram contra a corrupção e as condições precárias de atendimento de saúde no Brasil. Até quem está lá longe sente que nós, brasileiros, estamos sofrendo aqui.

E esses protestos que começaram pelo preço das passagens de ônibus agora vão encontrando maior sentido junto aos manifestantes, eles têm muitos motivos para protestar.

A presidente Dilma deu uma entrevista, logo após as manifestações, muito ajuizada: ela entendeu direitinho o protesto, ele é principalmente dirigido contra a corrupção e por uma melhora urgente do atendimento de saúde ao povo brasileiro.

O Brasil não vai ser o mesmo depois das manifestações de anteontem, vai ser melhor e mais democrático. Porque os governantes passaram a sentir medo do povo desde anteontem. E vão andar na linha, pelo menos mais na linha do que andavam antes.

O povo brasileiro mostrou que é capaz de protestar e que seu protesto tem o poder de ecoar pelo mundo inteiro, ou seja, todo o planeta ficou sabendo anteontem que o Brasil não é só o país-sede das Copas das Confederações e do Mundo, ele é também uma terra de miséria, de descaso com a saúde de seus habitantes e de agentes públicos corruptos.

Demos assim uma demonstração de que somos capazes de protestar, de gritar, de verberar.


O Brasil deixou anteontem de ser cordeirinho. Vai agora vestir outra pele: a dos que não se conformam em ser maltratados e põem a boca no trombone quanto isto acontece.

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