29
de junho de 2013 | N° 17476
NILSON
SOUZA
Cartazes com
crases
Depois
que os velhos começaram a entrar no Facebook, os jovens saíram para as ruas.
Digo isso por mim: não paro de receber pedidos de confirmação de amizade de
gente da minha idade. Em breve, tomaremos conta desse brinquedinho inventado
pelo tal Zuckerberg, que no ano que vem passará para o nosso lado. Vai fazer 30
anos, a fronteira da confiabilidade. Pelo menos é o que dizia uma frase
emblemática dos meus tempos de juventude, imortalizada na canção de Marcos
Valle, este prestes a completar 70:
–
Não confie em ninguém com mais de 30 anos.
Força,
portanto, para os que ainda não chegaram lá. É animador ver a garotada
envolvida com os problemas do país. Quem não se emociona ao ver tantos rostos
adolescentes semiencobertos pelas máscaras da insatisfação, ou pintados de
verde e amarelo, gritando por mudanças?
Para
ingressar no novo mundo da consciência social, muitos levaram com eles a mesma
estratégia da comunicação digital que utilizam cotidianamente. Todos querem ser
vistos e ter suas mensagens comentadas. Embora o romantismo inicial já comece a
ser substituído pela realidade, pelas manipulações político-ideológicas, pela
violência e até pelo desencanto, ainda acredito que muita coisa boa ficará
desta surpreendente revolução comandada pelo anonimato coletivo das redes
sociais.
Uma
delas é a reafirmação da língua portuguesa. Achávamos que a garotada só se
comunicava em internetês, com palavras abreviadas e uso confuso dos símbolos
gráficos do idioma. De repente, começaram a surgir cartazes com mensagens bem
escritas e bem-humoradas, com verbo, predicado e complemento (como se dizia
antigamente), com vírgulas no lugar certo e até com crases apropriadas.
A
parte mais empolgante das manifestações, para mim, era aquele momento em que
meninos e meninas chegavam cedo ao local da concentração munidos de cartolinas
e canetas coloridas para redigir suas mensagens em praça pública. Muitos faziam
esse trabalho em casa, pesquisando poesias, trechos do Hino Nacional ou frases
de artistas e pensadores célebres. Só nisso já tivemos um ganho cultural
incomensurável.
Pena
que agora já comecem a prevalecer faixas e cartazes impressos em gráficas,
reproduzidos em série, expressão inequívoca de grupos organizados que tentam
pegar carona na espontaneidade da juventude. Dê no que der, porém, aqueles
primeiros cartazes ficarão como registro dessa energia criativa que surpreendeu
o país e o mundo. Em bom português.
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