quarta-feira, 12 de junho de 2013


12 de junho de 2013 | N° 17460
LUCIANO ALABARSE

Caixa de surpresas

Sandra Dani e Luiz Paulo Vasconcellos, cúmplices permanentes de aventuras teatrais, estão em São Paulo, onde estrearam Dias Felizes, de Samuel Beckett, sob a direção de Rubens Rusche, um grande especialista na obra do célebre dramaturgo.

A montagem, arrebatadora, está confirmada na programação do 20º Porto Alegre Em Cena, em setembro. Em função desse trabalho, pela primeira vez em muitos anos, nenhum dos dois integrou o elenco de um espetáculo meu, no caso Marxismo, Ideologia e Rock’n’roll, primeiro texto de Tom Stoppard montado na cidade, dirigido em conjunto com Margarida Peixoto.

A peça de Stoppard, complexa e desafiadora, acompanha as transformações sociais das últimas quatro décadas do mundo ocidental e não dá mole: confronta ideologias, certezas políticas e avanços comportamentais, com pertinência incomum. Chamei Áurea Baptista para dar conta da difícil tarefa de compor os personagens destinados à Sandra, e fiquei pasmo. Áurea é uma atriz dramática de grandes recursos, fundamental para o resultado do espetáculo.

Meu elenco, inclusive porque a obra assim exige, agrega talentos de idades e formações diferentes. Veteranos como Carlos Cunha Filho e Marcelo Ádams brilham ao contracenar com talentosos atores da nova geração. Gustavo Sussin e Pingo Alabarce, meu primo querido, estão aí e não me deixam mentir. E é bonito ver que, 35 anos depois, o palco ainda é o mesmo território agregador e libertário dos meus tempos de estudante.

Peter Brook, em O Espaço Vazio, defende que a criação teatral legítima precisa começar por um estado de disponibilidade total, sem repetições de fórmulas prévias, sem truques, sem medos. O grande mestre está absolutamente correto. Teatro bom é o que provoca, expande e transforma – quem faz e quem assiste.

Ensaios de teatro, aliás, costumam ser momentos de encontros geniais ou afastamentos definitivos. Véspera de estreia é fogo. Urgências variadas vêm à tona: expectativas, frustrações, generosidades e avarezas, tudo e todos à flor da pele. Uma coisa é certa: não é fácil acertar o tom de uma direção teatral.

O teatro gaúcho ainda é uma caixa de surpresas variada. Encenações de altíssimo nível se apresentam ao lado de espetáculos sem importância nenhuma, profissionais qualificados dividem espaço com gente de formação mínima, todos empenhados em marcar presença e conquistar prestígio. Marcar presença até que é relativamente possível. Já prestígio... sei não.


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