23
de junho de 2013 | N° 17470
O
CÓDIGO DAVID
ISSO NÃO É UM
ASSALTO
A
polícia do Rio se orgulha de não ter disparado um único tiro em Copacabana nos
últimos 12 meses. Nenhum um só tiro, e há cinco anos foram mais de dois mil. Se
é preciso reprimir, os policiais usam pistolas que dão choque elétrico. É o
efeito da política de segurança das UPPs. Só que o crime não acabou; migrou. Os
bandidos não deixaram de existir, mudaram de endereço.
Eliana,
a senhora que faz faxina aqui no meu apartamento de Copacabana, Eliana vive em
Niterói e conta que, por lá, agora as pessoas sentem medo de andar na rua, o
que antes não acontecia. E o filho de uma amiga dela, um garoto de 13 anos,
morador de Icaraí, ele vinha caminhando pela calçada, perto de casa, quando um
gaiato o abordou.
–
Seguinte: – disse o outro, sem perder tempo em se apresentar – Isso não é um
assalto. Entendeu? Não é um assalto. Mas eu queria saber se você tem algo aí
pra me dar...
O
menino piscou: – Não tenho nada, só o meu celular.
–
Pode ser o celular mesmo – conformou-se o homem.
Depois
de receber o celular, o homem repetiu:
– Ó:
isso não é um assalto.
E
estendeu a mão, para cumprimentar o garoto. Que se recolheu, com medo. O homem
respirou fundo:
–
Pô, eu disse que não era um assalto. Não é um assalto! Não é!
E
foi-se embora, indignado, mas de celular novo.
Pés
e mãos
Rachmaninoff,
aliás, dizem que ele era um pianista inigualável devido ao tamanho de suas
mãos. Com os dedos bem abertos, alcançava 30 centímetros de teclas do mindinho
ao polegar. Um fenômeno.
Já o
Phelps nada do jeito que nada por ter pés número 48. Outro fenômeno...
No
futebol é diferente: Rivellino calça 37. Pé de moça. E tinha a patada atômica.
E era o melhor de todos.
O
piano de Copacabana
Meu
apartamento em Copacabana tem um piano. Sempre quis morar em uma casa com
piano. Não sei tocar um parabéns a você, mas, se tivesse um piano em casa,
talvez me animasse a aprender.
Houve
tempo em que todas as casas de respeito tinham de ter um piano. Bom tempo,
aquele. Um piano dá certa nobreza a uma casa e, ao mesmo tempo, certa animação.
Imagino
esse grande e velho apartamento de Copacabana em sua época de glória – anos 60
ou 70, suponho, pelas curvas da decoração. Imagino os saraus que foram feitos
em torno deste piano. Quem sabe Tom Jobim não tocou aqui, exatamente aqui onde
estou escrevendo em meu laptop vulgar?
Quem
sabe ele, Vinícius, Chico e Toquinho não saíram uma noite quente de Ipanema,
contornaram a orla e pararam bem nesse apartamento em frente ao Atlântico, e
aqui entraram às risadas, e terminaram a noite cantando ao piano, atraídos pela
muita idade do uísque e pela pouca idade da filha do proprietário? Quem sabe?
Ou
então o antigo dono desse antigo apartamento sabia tocar piano. Você lembra de
O pecado mora ao lado, divertidíssimo filme com a Marilyn Monroe? O filme é
mais ou menos da época de ouro deste meu apartamento de Copacabana.
No
apartamento do protagonista, um sonhador editor de livros, existe um piano.
Numa cena clássica, ele se imagina tocando para Marilyn, a vizinha que lhe
inspira o pecado, ela sentadinha ao lado dele na banqueta, ele dizendo que
executaria Rachmaninoff, ela gemendo em sua loirice e balbuciando que não
resiste a Rachmaninoff.
Rachmaninoff.
Quem sabe o dono deste meu apartamento não tocou Rachmaninoff para uma loira
sinuosa como Marilyn?
Pensando
nisso, às vezes aliso as teclas do piano silencioso de Copacabana. Como deve
ser bom ter um piano em casa.
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