FERREIRA
GULLAR
No limite
Matam
mesmo quando o assaltado não oferece resistência. Matam para matar, por nada,
para nada
O que,
afinal, está acontecendo? Em três meses, milhares de motocicletas são roubadas
em São Paulo, centenas de residências e transeuntes são assaltados,
trabalhadores, mulheres e pais de família são assassinados com uma frequência
assustadora. Viver em São Paulo tornou-se risco de morte, é isso? Quer dizer,
então, que a cidade está em guerra?
Pior:
a cidade está ocupada por bandidos armados que surgem a qualquer momento e em
qualquer ponto dela, empunhando fuzis, armas automáticas, decididos a tirar a
vida de qualquer um.
Pelo
modo como agem, parecem particularmente empenhados em matar, como se isso lhes
desse especial satisfação. Matam mesmo quando o assaltado não oferece resistência.
Matam para matar, por nada, para nada.
Mas
por que razão agem assim? Uma hipótese é a de que estejam drogados, por ser difícil
admitir que sejam todos homicidas natos.
Sou
da teoria de que o cara nasce poeta e nasce homicida. Digo isso porque sei de
gente que em hipótese alguma admitiria tirar a vida de alguém, enquanto outros,
a primeira coisa em que pensam, se alguém os ofende, é acabar com ele. Felizmente,
raras pessoas são assim.
Daí levantarmos
a hipótese de que, se tantos assaltantes matam gratuitamente, é por estarem
fora de si, drogados.
Aliás,
a droga é um dos motivos que levam aos roubos e assaltos. Com frequência, a polícia,
quando prende assaltantes, encontra drogas com eles. Isso explica parte do
terror que assusta a cidade, mas não explica tudo.
Não
explica, por exemplo, ações criminosas levadas a cabo por verdadeiras equipes
de bandidos, munidos de armas pesadas, sofisticadas, obedecendo a um plano
minuciosamente traçado.
Quando
a polícia chega à sede da quadrilha, depara-se com vasta quantidade de armas,
munições e até planos de ação cuidadosamente elaborados.
Esses
dados parecem indicar que, fora os bandidos comuns e os drogados, há organizações
criminosas, diferentes das antigas quadrilhas do passado: estas de agora se
valem de novos recursos teóricos e tecnológicos, que fazem delas organizações
eficazes.
Além
dos novos meios de comunicação e um conhecimento detalhado do aparelho
repressivo, de que dispõem, parece-me haver, em algumas delas, pelo menos, a ação
organizada e planejada, apoiada em uma infraestrutura capaz de acumular o
produto roubado para vendê-lo, mais tarde, dentro de um esquema que inclui o
comércio legal.
Do
contrário, como se explica a descoberta frequente de galpões e armazéns cheios
de mercadorias roubadas, numa quantidade que tornaria inviável comercializá-las,
a não ser com apoio num sistema legal de comércio?
Ou
seja, nestes casos, legalidade e ilegalidade se confundem, ou melhor, o comércio
legal se alia ao crime e lucra com isso. Trata-se, portanto, de um tipo de
criminalidade bem mais ameaçadora, porque capaz de minar a estrutura social e
corromper setores inclusive responsáveis pelo combate ao crime, incluindo aí os
aparelhos policial e judicial.
Estas
são algumas considerações e especulações de alguém que não é especialista no
assunto, mas que foi levado a refletir sobre o problema.
Não
tenho dúvida de que as autoridades responsáveis pelo combate à criminalidade,
em São Paulo e no país, estão igualmente preocupadas e buscando solução para tão
grave problema.
Mas
isso não basta para tranquilizar as pessoas. Ouvi, outro dia, na televisão, um
cidadão afirmar que nem ele nem qualquer membro de sua família sai mais à noite,
seja para ir ao cinema seja para jantar num restaurante.
Significa
que os cidadãos são agora reféns dos bandidos? Isso se torna tanto mais
assustador quando se sabe que o Brasil mesmo, como país, é um dos mais
violentos do mundo. Li que se mata mais gente aqui do que na guerra civil da Síria.
É hora,
portanto, de o governo, em suas diferentes instâncias, buscar com seriedade a
solução desse problema.
Não
por acaso, faz poucos dias, o governador de São Paulo admitiu quanto é grave a
situação, tanto que anunciou um programa de combate à criminalidade, prevendo bônus
aos policiais que mais se empenharem no combate ao crime, além da ampliação do
efetivo policial. Tais medidas não solucionarão o problema, mas, pelo menos,
implicam o reconhecimento de quão grave ele é.
Nenhum comentário:
Postar um comentário