19
de junho de 2013 | N° 17466
MARTHA
MEDEIROS
Delicadeza
Ninguém
tem dúvida sobre a potência da internet, e o fenômeno Clarice Falcão é uma
prova mais do que evidente. É bem verdade que não se pode falar de Clarice sem
falar em Gregório Duvivier, namorado e colega no hit Porta dos Fundos, o
programa humorístico mais comentado da atualidade, que só veicula na web.
Mas
Clarice não é só a parceira do Gregório, nem só atriz, nem só roteirista, nem
só filha dos talentosos Adriana e João Falcão – a garota, além de ser também
compositora e cantora, é, antes de tudo, um acontecimento.
Comprovei.
Estive no show Monomania, que ela apresentou no Bourbon Country no último
domingo. Casa lotada. Mal entrou no palco, surto coletivo – antes de abrir a
boca, ela já tinha a plateia na mão. Vestida com uma capa de vinil negro,
galochas e um guarda-chuva em punho, estava ali para contar sobre como o amor
fecha o tempo. E contou. E cantou. Encantou.
O
espetáculo foi rápido como um raio, um flash, um clarão. Quantas músicas?
Talvez 15, no máximo. Uma mais adorável que a outra, com letras espirituosas,
inteligentes, de um humor para entendidos. E quem não é entendido em dores de
cotovelo que nos tornam seres risíveis? Ela lembra o tempo todo: morro por
você, mas não perco a piada.
Nada
de bolero, tango, canções ao estilo rasga coração. O barato de Clarice é expor
a natureza tragicômica de todos nós, as nossas inseguranças, infantilidades e
maluquices, principalmente as maluquices, o termômetro de toda paixão não
correspondida – ou mal sintonizada. Que sanidade, o quê. Amor é a casa dos
loucos.
Clarice
é boa de rima, boa de trama, boa de ritmo – não se estende demasiadamente, é
rápida na transmissão do recado. Linda e doce, nos remete à infância, mas não à
infância babaca dos príncipes encantados e finais felizes delirantes. O que ela
assinala é que os ideais românticos sofrem uma influência perversa da vida
real, simplesmente isso. Simplesmente mesmo. Clarice é simples como um sorvete
de creme.
Pelo
pouco tempo que Clarice está aí, eu esperava um espetáculo ligeiramente amador,
mas ao contar com a experiência e a sensibilidade da sogra, a cantora Olivia
Byington, que produz a turnê, o que se viu foi profissionalismo aliado a uma
despretensão cativante. Clarice é quase tímida, quase deslocada, quase não
entende como foi parar nas capas de revista, quase não sabe como tudo se deu –
mas sabe, ou não teria dado a largada para uma carreira que promete ser um
refresco para estes tempos de passeatas febris e necessárias – aliás, tomara
que o movimento amadureça, sem nos dar motivos para perder o sono.
Então,
salve Clarice, que faz canções de ninar para adultos.
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