sábado, 15 de junho de 2013


15 de junho de 2013 | N° 17463
NILSON SOUZA

Nossos medos

A volta do Bicho-Papão, em meio ao time de monstrinhos que agora lutam pela educação, me fez recordar uma das mais geniais ideias da autora da série Harry Potter, a britânica J.K. Rowling. Na sua inventiva história, essa criatura que habita armários e lugares escuros não tem forma definida. Ao ser libertada, transforma-se na coisa que a pessoa mais teme.

Ou seja, o Bicho-Papão nada mais é do que a materialização do nosso maior medo. Pode ser uma múmia ensanguentada ou uma barata repugnante, a primeira inexistente e a segunda inofensiva, mas vá convencer disso alguém que está apavorado. Na verdade, elas são apenas representações de algo muito mais terrível, que é o medo atávico de sermos devorados e que todos nós carregamos nos recônditos da nossa alma pré-histórica.

Portanto, os medos infantis não devem ser menosprezados. Ainda que sejam imaginários, têm que ser respeitados. Equivoca-se o adulto que ridiculariza uma criança atemorizada, ou que a repreende para que supere o temor. Os mais conceituados manuais de psicologia ensinam que a melhor atitude é ouvir a criança para entender o que a amedronta, e conversar com ela sobre o assunto. Lembram, ainda, que o medo pode ser saudável, pois às vezes protege a criança de situações realmente perigosas.

E nós, adultos, não vivemos também cercados de medos? A violência, o trânsito, as doenças, as guerras, as tragédias e a solidão são os bichos-papões dos crescidinhos, sempre prestes a sair de algum canto escuro do cotidiano. E não nos resta outra alternativa a não ser enfrentá-los. É automático: diante de qualquer ameaça, nosso organismo se prepara para lutar ou fugir. Essas reações são apontadas pelos cientistas como causas da sobrevivência da nossa espécie, pois predadores e riscos não nos faltaram desde os primórdios da existência humana.

E o irônico da história é que jamais saberemos se somos descendentes daqueles que lutaram ou daqueles que fugiram. Preferimos, obviamente, pensar que nossos bisavós integravam a tribo dos corajosos. Mas coragem – todos sabemos – não é a ausência de medo, mas a nossa capacidade de agir com o monstrinho paralisante enredado nas nossas pernas.

Um dos maiores bichos-papões da humanidade sempre foi o desconhecido. Por ignorância, os navegadores imaginaram monstros marinhos e sereias, onde só havia água salgada, ilhas e terras habitadas por índios. Por ignorância – mas também por deboche –, o homem moderno fantasiou extraterrestres verdes e destruidores, mas, pelo menos até agora, os astronautas só encontraram poeira na Lua e lixo espacial na estratosfera.


Rir e fantasiar são bons antídotos para o medo.

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