14
de junho de 2013 | N° 17462
PAULO
SANT’ANA
O Odilon e o
Alceu
Anteontem
foi Dia dos Namorados e eu me senti profundamente sozinho, com o que redigi uma
carta de amor à minha utópica namorada: “Querida, tua sincera indiferença
tem-me causado graves danos. No início, vinguei-me fingindo também indiferença,
mas depois cansei dessa atitude e estou me ajoelhando a teus pés, em busca de
piedade: vem até mim e entrega-te finalmente à nossa relação, te farei a mais
feliz de todas as mulheres.
Escreveste-me
dizendo que a culpa da frieza que há entre nós é minha. Pois quero te afirmar
que eu sou assim quem sou por seres tu quem és. E assim vamos nós vivendo nosso
caso natimorto”.
Cansado
das monotonias conjugais, enveredei no domingo rumo ao Mercado Público, em
busca de devorar um linguado à milanesa no Gambrinus.
Sentei-me
e quem enxergo na mesa da minha frente? Exatamente o Odilon, a quem não via
fazia 10 anos. Ele foi sentar-se à minha mesa e travamos um papo excelente e
curioso.
– E
daí, Odilon, há quanto tempo? Onde andas? Estás trabalhando? Ainda continuas
solteiro?
Ele
me respondeu que com a criação de milhares de cargos de confiança na
administração federal, conseguiu uma boquinha na Funai e está residindo e
trabalhando em Brasília.
Quanto
a sua condição civil, me disse que finalmente tinha se casado e se sentia feliz
na vida conjugal.
Perguntei
com quem ele se casou.
E
ele respondeu: “Com o Alceu. É uma maravilhosa criatura”.
Este
mundo está mesmo virado.
Não
me espantou que o Odilon estivesse casado com um homem. Afinal, os costumes
mudaram muito de uns anos para cá.
O
que me espantou é que o Odilon confessou isso para mim com a maior
naturalidade, acrescentou que ele e sua mulher (ou será seu homem?) já se
inscreveram no órgão competente para adotar uma criança, não têm preferência
pelo sexo do futuro adotado, pode ser negro ou branco, desde que tenha menos de
quatro anos de idade.
E me
contou também que faz sexo praticamente todas as noites com o Alceu, que nunca
cessa há três anos o desejo sexual entre eles, que mantêm uma empregada
doméstica, ou melhor, uma arrumadeira que lava a louça e a roupa dos dois,
nunca foi tão feliz na vida.
Foi
quando perguntei ao Odilon se ele nunca briga com o Alceu.
E
ele me respondeu que, como os dois são homens, eles nunca brigam, conhecem como
ninguém a natureza masculina e por isso tratam um com o outro com conhecimento
de causa. Não há nem atrito entre os dois.
Depois
de me autorizar com tranquilidade que publicasse sua história nesta coluna,
indaguei ao Odilon como funciona o seu casamento com o Alceu, se registraram
algum pacto no cartório. Em caso de separação ou morte, como serão divididos os
bens ou apurada a herança do sobrevivente?
E o
que respondeu o Odilon: “Se o Brás é tesoureiro, a gente ajeita no final”.
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