quarta-feira, 16 de maio de 2012



16 de maio de 2012 | N° 17071
PAULO SANT’ANA

Um país em chamas

É impressionante e inédito o que acontece no México. Já são 71% dos municípios mexicanos controlados pelo narcotráfico. Ou seja, o poder do Estado em 71% dos municípios mexicanos transferiu-se para os narcotraficantes.

Nesses municípios, o poder da Justiça e dos governantes pertence, pelo terror, aos narcotraficantes.

Os narcotraficantes adotam ações cada vez mais ofensivas para amedrontar a população e as autoridades, usando carros-bomba e armas de guerra.

No domingo passado, entre milhares de atentados que já se verificaram nessa tomada de poder pelos traficantes, autoridades de Monterrey, no Estado de Nuevo León, encontraram 49 corpos mutilados, num crime ligado a um acerto de contas entre quadrilhas de narcotraficantes.

Os números são avassaladores: a guerra contra o narcotráfico, até agora vencida pelos criminosos, já alcançou 50 mil mortes.

A estratégia dos criminosos para dominar o país ganhou um novo e terrível ingrediente: cresce cada vez mais o número – já são 80 – de jornalistas assassinados pelo tráfico desde o ano 2000.

O jornal El Mañana, em Nuevo Laredo, estampou no domingo um editorial estupefaciente: deixará de publicar, por tempo indeterminado, qualquer notícia relativa à violência na cidade e em outras áreas do país.

Esse jornal sofreu um atentado com tiros e explosivos na sexta-feira passada e afirma que seus diretores resolveram nada mais noticiar sobre violência do narcotráfico pela falta absoluta de condições para o livre exercício da imprensa.

Esse ataque foi o sétimo a um meio de comunicação no Estado de Tamaulipas nos últimos seis anos.

Em 2010, o jornal El Diario, de Ciudad Juárez, já tinha publicado um editorial polêmico em que pedia trégua aos traficantes depois que dois de seus jornalistas foram assassinados.

Os jornalistas, principalmente do Norte, podem ser considerados correspondentes de guerra. E, quanto mais aumenta o crime, mais jornalistas que noticiam os fatos relacionados com o conflito são assassinados.

É como se os jornalistas estivessem no Líbano ou no Iraque. O México já é hoje o país mais perigoso para se exercer o jornalismo na América Latina, é o terceiro no mundo e fica à frente de Paquistão e Afeganistão.

Recentemente, o governo editou uma lei em que passa para o âmbito da Justiça federal toda ameaça ou ação contra jornalistas, mas ninguém acredita na eficácia dessa medida.

Assim, calando a imprensa, aterrorizando a população e pondo em xeque a independência da Justiça, falta pouco para os narcotraficantes possuírem o domínio total sobre o país.

Ainda assim, o governo combate tenaz e energicamente os criminosos e essa guerra se tornou uma queda de braço institucional.

Vejam a que ponto pode, em qualquer sociedade, progredir o poder do crime, o que vinha acontecendo até pouco tempo nas favelas do Rio de Janeiro.

No México, o povo está à mercê dos traficantes, a Justiça sente-se encurralada pelos atentados, e a imprensa, um dos últimos baluartes da ordem, vai soçobrando aos poucos.

Tomara que não seja necessária uma intervenção externa no México, que ainda assim, se ocorresse, seria difícil de ser executada e redundaria banhada em sangue.

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