13
de maio de 2012 | N° 17068
TEMA
PARA DEBATE
Internet e
privacidade
Há
quase um ano, o jornal Zero Hora publicou, na edição de 20 de junho de 2011
(página 30), notícia sobre o debate ético suscitado acerca de imagens de uma
cirurgia publicada na rede social Facebook, e dos comentários postados na
internet a respeito das referidas fotos, que geraram a indignação dos leitores
e a manifestação sobre a adequação ética do uso de imagens não autorizadas pelo
paciente. O que causa consternação é perceber que, transcorrido esse tempo, uma
situação semelhante ocorreu recentemente num hospital do Paraná.
O
vídeo de uma cirurgia para a retirada de um peixe do intestino de um paciente
foi colocado na internet sem a sua autorização e, mais, as imagens, que aparecem
numa recente reportagem do telejornal Bom Dia Brasil, retratam que as referidas
fotos e vídeo passaram de celular para celular durante a própria cirurgia, até
serem postados na rede. A matéria traz o depoimento de familiares do paciente,
que se sentiram desrespeitados com a situação. O Conselho Regional de Medicina
abriu uma sindicância para averiguar o caso.
Neste
tempo de polêmicas sobre a publicação de imagens na internet – nestes últimos
dias, a mídia tem retratado o caso que envolve a publicação de fotos íntimas da
atriz Carolina Dieckmann e a tentativa de extorsão que ela sofreu para que
essas mesmas fotos não fossem colocadas na rede –, é interessante lembrar o
ponto de partida do direito à privacidade. Em 1890, na cidade norte-americana
de Boston, a esposa de um conhecido advogado aparecia constantemente nas
colunas sociais da época.
Esse
fato incomodou o advogado, que, juntamente com um amigo que se tornou juiz da
Suprema Corte Americana, publicou o artigo “The Right to Privacy” na Harvard Law
Review daquele ano. O texto demonstra que existe uma esfera da vida que
pertence unicamente à própria pessoa, ou também às pessoas com quem queremos
compartilhar nossa intimidade. Ela, a intimidade, torna-se, assim, fundamento
da privacidade.
Mais
do que indicar, agora, os responsáveis legais pelas situações citadas, é
importante lembrar da nossa própria responsabilidade na utilização da rede e na
publicação de imagens e vídeos que possam comprometer ou ofender nossa
privacidade. Se, como o próprio nome já diz, temos uma esfera privada, não
podemos deixar de nos questionar, de refletir e de perceber que somos os
principais cuidadores da nossa imagem e, assim, das nossas vidas.
E
essa percepção reflete-se em nossa formação profissional e pessoal. Devemos ser
instigados a olhar a realidade como ela é, na sua natureza palpável, e não na
transposição pura e simples dessa mesma realidade para uma tela de computador,
tornando a vida um filme que posso editar, cortar, copiar, espetacularizando e
levando a público momentos que fazem parte de uma história efetivamente
privada. Cabe apenas e tão somente a cada um de nós decidir a quem mostrar (ou
não) o filme sem cortes das nossas vidas.
*Professora
universitária, professora de Teoria Geral do Direito do UniRitter, doutora em
Direito pela Scuola Superiore Sant’Anna de Pisa, Itália, mestre em Direito pela
UFRGS
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