29
de maio de 2012 | N° 17084
FABRÍCIO CARPINEJAR
Máfia
Sou
brigão. Um Hulk amarelado. Um caixa automático do Procon.
Minha
aparência é calma, educada e sensível na maior parte do tempo. Mas é cometer
uma injustiça contra mim ou querer me enganar, que enfureço. Subo nos tamancos.
Monto no porco.
Babo,
esbravejo, cerco a conversa, acelero a fala para não permitir que o oponente
pense e revide.
Em
casa, são folclóricas as refregas com garçons, taxistas e vendedores. No Súper
Trunfo familiar, minha agressividade é 9,5, a campeã absoluta das cartas.
Os
filhos são os que mais sofrem com os escândalos públicos. Mariana, 18 anos, se
cala de cantinho, envergonhada, pedindo desculpa por existir.
Aquele
que discute alto deveria ter consideração com seus acompanhantes. Ou, pelo
menos, consultá-los antes de tomar uma atitude intempestiva de chamar atenção
do restaurante ou da loja ou da rua.
Busquei
me reabilitar na última semana. Não me esquentar por qualquer atrito, não
estragar o passeio com minha sede de justiça.
Em
Belo Horizonte, veio a primeira chance de desfazer a fama. O taxista roubava de
modo escancarado. Aumentava o trajeto, costurava rumos desnecessários, salteava
entradas com destemor, assobiava malandragem. O trajeto de R$ 10 da ida (linha
reta na Avenida Afonso Pena), já resultava o dobro no taxímetro da volta.
Respirava
cachorrinho para não latir. As têmporas cresciam, a dor de cabeça aumentava,
mas não iria constranger novamente minha filha. Dessa vez, suportaria o erro em
silêncio, conteria o ímpeto de pegar a falha em flagrante e
exigir
explicações.
A mão
suava, a garganta arranhava de raiva. Repassei o dinheiro para Mariana disposto
a evitar o conflito direto, o confronto final, o choque da verdade. Não
desejava sequer ouvir a voz fanhosa do sujeito.
Festejei
quando saí do carro para pegar as sacolas no porta-malas. Finalmente controlei
a fúria, estava curado da maldição, merecia estrelinhas douradas no caderno
escolar.
Mas
estranhei a demora de Mariana para deixar o táxi. Fui conferir pela janela e
ela apontava o dedo e gritava com o motorista, chamava o cara de ladrão, de
criminoso, de estúpido, de grosseiro, de nojento.
Levantou-se
e bateu a porta com força. Lacrou a porta do Sandero. Nunca a vi assim.
– Que
safadeza, a corrida custou R$ 22,10 e ele insistiu pelos 10 centavos, não
aguentei e explodi – esclareceu.
Nas
férias de minha cólera, ela ocupou meu lugar. Bem coisa de máfia.
As
maiores brigas de nossa vida acontecem quando defendemos as dores dos outros. Nossas
maiores brigas acontecem quando defendemos as dores dos outros.
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