segunda-feira, 14 de maio de 2012



14 de maio de 2012 | N° 17069
KLEDIR RAMIL

Diário de Bordo – 3ª parte

Recapitulando: não sei que dia é hoje e não tenho noção das minhas coordenadas. O que não faz a menor diferença. O que interessa é que estou com fome e com sede, em uma lancha sem combustível, boiando no meio do oceano, com um pagodeiro chato que salvei do afogamento por pura caridade.

Já estou começando a colocar em dúvida minha própria sanidade mental. Eu, um sujeito calmo, cheguei ao ponto de enfiar o pandeiro na cabeça do sujeito. Tenho que me acalmar.

DIA DE HOJE, ou de ontem, tanto faz

Como todo dia tem um santo protetor, comecei a rezar de forma generalizada para todos os santos. Quem sabe algum me escuta? O tempo está bom. Bom pra quem está na praia. Aqui, nessa situação, sem uma nuvem no céu, o sol não é bem-vindo. Infelizmente, não sou eu quem decide isso.

Na falta de chapéu, improvisei um guarda-sol com a tampa do isopor. Só sei que nada sei. Latitude, longitude, calendário gregoriano... Não sei minha posição no tempo e no espaço, o que me fez lembrar da Teoria da Relatividade de Einstein. Pensei em comentar o assunto com meu companheiro de viagem, mas desisti. Tô com fome. O maluco tá comendo peixe cru.

Eu sou vegetariano. Me ofereceu algas marinhas, dizendo que é uma espécie de alface aquático. Tô morrendo de sede. Dei mais um gole na cerveja quente, o que foi uma péssima ideia. Aleluia! Debaixo do colchonete encontrei uma garrafinha de água. A sorte está começando a sorrir para nós.

É o que parece. Tomei um gole discreto, medindo nossa reserva do líquido precioso e passei para meu companheiro. O maluco meteu a boca no gargalo e esvaziou a garrafa. Perdi a compostura. Peguei o pandeiro e enfiei de novo na testa do cara.

Foi quando ouvi, em inglês, uma voz com som de megafone: “Mãos na nuca! Largue sua arma, cucaracho! Aqui é a Guarda Costeira dos Estados Unidos da América. Você tem todo direito de ficar calado... Caso não tenha advogado etc, etc...”.

AMANHÃ, ou melhor, tomorrow

Como é que eu, só de bermuda e sem documentos, vou explicar que não sou imigrante ilegal tentando entrar em Miami? E que, apesar de todas as evidências, pandeiro é um instrumento musical?

(continua)

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