WALCYR
CARRASCO -
08/06/2013
00h18 - Atualizado em 08/06/2013 00h18
A técnica do bruxo
Vivo
recebendo recados ameaçadores de uma cartomante. É pessoa próxima de um amigo,
que me telefona: – Ela mandou dizer pra você tomar cuidado. Entrará uma pessoa
na sua vida que, em dois anos, arrancará tudo o que você tem. Já pedi, já insisti.
Não quero saber das tais mensagens.
A
expressão usada, “entrar na vida”, pode se referir a qualquer tipo de relação,
desde um vizinho que se mude para a mesma rua a uma relação íntima. Qualquer um
vive esbarrando com pessoas perigosas. Interesseiras, invejosas e mal-intencionadas.
Faz parte da vida saber quem é quem. Meu amigo, impulsionado pelo medo, de
tempos em tempos não resiste e me avisa.
– Ela
está muito preocupada. Há muita inveja e forças negativas em torno de você. E
você está frágil porque anda tomando drogas. – Como assim, não uso drogas! – Ela
teve uma visão de você tomando comprimidos.
Algum
poder essa mulher tem, não resta dúvida. Quando esse aviso chegou, eu iniciara
um tratamento ortomolecular com uma infinidade de pílulas diárias: complexos
vitamínicos, clorofila etc. Mas uma coisa aprendi na vida: o fato de alguém ter
intuição, um certo sexto sentido, não quer dizer que seja dono absoluto da
verdade. Seu desejo é transformar essa qualidade em investimento. Porque sempre
vem a segunda parte do recado.
– Ela
diz pra você procurá-la, pra fazer um trabalho pra te livrar das sombras. Há um
exército de cartomantes, bruxos de todo tipo dispostos a arrebanhar clientes
incautos
Vejam
bem, não estou falando de pais de santos – existem muitos sérios – ou de
qualquer outro tipo de crença, religião ou espiritualismo. Me refiro a um exército
de cartomantes, bruxos de todos os tipos dispostos a arrebanhar clientes. As técnicas
são muitas. Uma conhecida foi ler a sorte e sentiu um arrepio ao saber:
– Um
homem está interessado em você.
Mesmo
bem casada, qualquer mulher ficaria satisfeita com a notícia, nem que fosse por
vaidade. Minha amiga estava no desvio fazia tempo. Imediatamente quis saber
quem era o tal. Tentava identificá-lo entre os conhecidos.
– Como
ele é... jovem? Maduro? – Ainda está nebuloso. – Conheci um rapaz... – Louro! –
Castanho. – Estou vendo nas cartas um castanho-alourado.
– Isso.
Ele até sugeriu que me ligaria, mas não ligou. – É porque há outra mulher no
caminho dele. – É casado?
– Essa
outra é uma amiga sua, que tem muita inveja e lança energia negativa sobre você.
Vai fazer de tudo pra vocês não se relacionarem.
Foi
o suficiente para a paranoia baixar. Rapidamente, ela identificou quatro ou
cinco amigas que poderiam ser as invejosas. O rapaz, assim acreditava, era um
que conhecera numa festa e trocara telefone com ela – para oferecer serviços de
marcenaria VIP.
– Ele
pode se aproximar inicialmente por trabalho, mas depois haverá um interesse
afetivo, se as más energias forem dispersadas.
Chegaram
ao momento fatal: – O que faço para abrir meus caminhos?
A
adivinha balançou a cabeça, pensativa, com parte do rosto iluminado pelas velas
de um altar logo atrás. – Posso fazer um trabalho. – Quanto é? – Imagine, não
cobro nada. Só o material.
E dá-lhe
material, que a cartomante, por gentileza, disse que ela mesma compraria: sete
pombas brancas, alguidares, incensos, um arco-íris de velas. Minha amiga
iniciou uma rotina de banhos com pétalas de rosas, arruda e alecrim. Tinha
alergia a um desses elementos. Ficou com a pele cheia de borbulhas vermelhas. O
rapaz telefonou, e ela marcou uma visita, para trocar os armários.
– Está
dando certo. – Você só não pode parar agora. Quanto mais ele se aproximar de
você, maiores serão a inveja e as forças negativas.
Toca
a buscar encruzilhadas solitárias de terra à meia-noite, com risco de assalto. Ela
aprendeu a acender velas no vento, mãos em concha. As despesas com o material
subiam. Com o rapaz também. Ele pediu um orçamento exorbitante para trocar o
armário. Ela aceitou, encantada pela possibilidade de amor.
Só desistiu
quando acendeu velas com o nome dele escrito na parafina em cima da geladeira. Uma
delas caiu e gerou um princípio de incêndio. Só aí tomou consciência de que,
havia meses, o tal marceneiro vip levara a entrada e nunca mais aparecera. Telefonou,
e o celular não era mais o mesmo. Finalmente, pôs toda a culpa na cartomante.
Acredito
no mundo espiritual, em intuição, sexto sentido. Sábios não misturam matéria e
espírito. Mas há bruxas que querem transformar você em cliente. E, se
desdenhadas, ainda podem lançar uns feitiços.
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