Contardo
Calligaris
Segurança (uma modesta
proposta)
A
certeza de que o socorro será precário, lento ou ausente alimenta a sensação de
insegurança
A
CIDADE de São Paulo está insegura como não estava há tempos. Claro, estão
acontecendo ataques mortíferos contra policiais e prováveis execuções dos
supostos responsáveis por essas mortes. Mas não é só isso.
A
nova insegurança de nossas ruas é óbvia para qualquer paulistano, no aumento
dos crimes contra ele mesmo ou contra seus próximos. No dia 21 último, a morte
de Caroline Silva Lee, de 15 anos, confirmou o que já sabíamos: a cidade,
absurdamente perigosa, parece voltar aos piores momentos do fim dos 1980 e
começo dos 1990.
Naquela
época, as grandes acusadas eram a exclusão social e a desigualdade excessiva de
nossa sociedade. Hoje, parece mais provável que alguns jovens da novíssima
classe C estejam adotando, como símbolo de status, uma necessidade imperiosa de
consumo -e isso sem incorporar hábitos menos tentadores e menos conspícuos da
classe média (ética do trabalho, meritocracia etc. Nota: melhorias
socioeconômicas não implicam necessariamente melhorias do tecido social da
comunidade).
Hoje,
como naquela época, é pífia, se não nula, a confiança dos cidadãos no socorro
da força pública.
A
prova disso está nas estatísticas apresentadas pela Folha na sexta, 26,
(http://migre.me/bsb4k). Em 2012, os latrocínios (roubo seguido de morte)
aumentaram 27% em relação ao mesmo período de 2011 e os roubos de veículos
aumentaram 13%, enquanto os roubos simples aumentaram apenas 4%. Nenhum
mistério nessa disparidade: o crime é denunciado quando há morte ou roubo de
veículo (o seguro pede o boletim de ocorrência). No mais, chamar a polícia e
registrar a ocorrência é fora de questão: já pegaram meu relógio, vão querer
meu tempo também?
Silogismo.
1) A certeza de que o socorro será precário, lento ou ausente alimenta a
sensação de insegurança; 2) a sensação de insegurança entrega a rua aos
criminosos; 3) diminuir a sensação de insegurança seria uma maneira de combater
a insegurança efetiva da cidade.
Um
carro de bandidos em fuga capotou na sua frente atropelando duas pessoas, que
agora gemem debaixo do carro revirado. Você, escondida, tem como dar um
telefonema.
Qual
é o número mesmo? Dos bombeiros, para que levantem o carro acidentado e salvem
os atropelados? Seria 193, se não me engano. Da Polícia Militar? Esse, a
maioria das pessoas conhecem: 190. Ou da Polícia Civil? Seria 147, é isso? O
pronto-socorro médico é 192, mas será que são eles que despacham as
ambulâncias?
O
190 responde, em tese, no primeiro ou segundo toque. Já, se você for atrás de
uma ambulância, pode acontecer a situação descrita num tweet de @toledoana (em
"Mdrama", SP Escola de Teatro, Gov. do Estado): "Você ligou para
Godot. Por favor, aguarde na linha. Sua ligação é muito importante para
nós".
A
segurança pública deveria ter um número único, que respondesse obrigatoriamente
com a rapidez que constatei no 190. Quem atende deveria 1) decidir qual é o
socorro certo e despachá-lo (ambulância, guindaste, polícia) com a urgência
adequada, 2) permanecer na linha, assistindo quem ligou até a chegada do
socorro, 3) preparar, enquanto isso, o encaminhamento do socorro (encontrar e
prevenir o melhor hospital de destino, por exemplo).
No
atendimento, a prioridade deveria ser saber o local e a natureza da urgência (o
CPF e o RG de quem chamou não são condições para escutar e assistir).
A
rapidez e a competência desse atendimento unificado seriam uma piada de mau
gosto se não houvesse um tempo de resposta decente entre a chamada e a chegada
do socorro.
As
unidades móveis de socorro (carros das polícias e dos bombeiros, ambulâncias
públicas ou privadas) já dispõem (ou deveriam dispor) de GPS, de maneira que
pode ser monitorada constantemente a cobertura do território do município,
garantindo que nenhuma área esteja fora de um alcance rápido.
Em
Nova York, o tempo médio é de quatro minutos para os bombeiros e oito minutos
para a polícia (esse tempo desce drasticamente se a urgência for uma ação
criminosa armada em curso).
Que
tal propor uma meta -um tempo médio de resposta- até o fim do ano? Muitas
vezes, de qualquer forma, os socorros chegarão tarde demais, mas 1) será
possível medir, em cada caso, onde e por que se originou o atraso e, sobretudo,
2) será bom os cidadãos sentirem que, na hora em que eles pedem socorro, alguém
se apressa.
Como
disse, a segurança é, antes de mais nada, uma sensação.
ccalligari@uol.com.br
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