FERREIRA
GULLAR
Fim da geração ideológica
O
mensalão tirou da jogada algumas das figuras mais destacadas do petismo; às novas
falta carisma
Até onde
consigo compreender o quadro político brasileiro, percebo que nos aproximamos
de uma mudança importante. É como se acabasse uma fase e começasse outra. Aliás,
já tentei formular essa minha suposição quando escrevi que a geração ideológica,
que lutou contra a ditadura militar, já cumpriu seu papel, e agora dará lugar a
uma outra, posterior àquele conflito.
Não
sou cientista político nem pretendo estar dizendo algo incontestável. No
entanto, parece-me evidente que se inicia um novo período, com outros
protagonistas. É claro que essas coisas não se dão com óbvia clareza nem como
um corte abrupto, que assinale o fim de uma etapa e o início de outra. Mas a
nova etapa já se insinua.
Em
artigo aqui publicado há algum tempo, arrisquei afirmar que PT e PSDB -os dois
partidos que, no apagar das luzes da ditadura militar, surgiram como oposição
clara à política do regime- já cumpriram seu papel: o PSDB, com o governo
Fernando Henrique Cardoso, e o PT, com o de Luiz Inácio Lula da Silva.
O
primeiro ajustou a economia e criou as condições para a manutenção do regime
democrático; o segundo, embora tenha se oposto àquelas medidas, entendeu que o
caminho certo era aquele e deu prosseguimento ao que havia sido implantado.
Se o
PSDB chegou primeiro ao governo do país, foi porque sua atitude moderada
atendia à visão da maioria do eleitorado. Lula, por seu radicalismo, sofreu três
derrotas consecutivas e, em face disso, impôs a seu partido a moderação necessária
na campanha política de 2002. Com isso, ganhou as eleições e assumiu a Presidência
da República.
No
governo, decidido a nele ficar para sempre, evitou a aliança com o PMDB, para não
dividir com ele o poder, e comprou os deputados de partidos menores, aos quais
ditava suas decisões. Como não teria cabimento impor ao país as medidas
esquerdistas inviáveis, optou pelo populismo, ou neopopulismo, no estilo de
Hugo Chávez.
E
como esse, tentou mudar a Constituição, a fim de candidatar-se ao terceiro
mandato, mas a pesquisa que encomendou com esse propósito o fez desistir da
ideia. Elegeu Dilma Rousseff, que foi uma invenção sua, já que ela jamais
disputara qualquer eleição.
O
escândalo do mensalão tirou da jogada algumas das figuras mais destacadas do
petismo, o que complicou, para Lula, escolher um candidato que lhe garantisse o
poder. Por isso, escolheu Dilma como sua substituta eventual, o que torna
particularmente inevitável o encerramento dessa etapa pós-ditadura.
Mesmo
que a saúde de Lula o garanta, dificilmente voltará ao poder. Sem falar na delação
premiada de Marcos Valério, que o apontaria como o verdadeiro chefe do mensalão.
Dilma, por sua vez, após o segundo mandato, se houver, terá que se retirar de
cena, uma vez que não tem muita vocação para líder.
Por
sua vez, Fernando Henrique Cardoso, que prolongara seu governo com a reeleição
em 1998, tentou passar o bastão a José Serra e depois a Geraldo Alckmin, que
foram derrotados seguidamente por Lula.
Na
referida crônica em que tratei desse tema, afirmei que José Serra não teria
chance de chegar à Presidência da República. Como se viu, não pôde chegar
sequer à Prefeitura de São Paulo. Com isso, encerrou-se a possibilidade de o
PSDB voltar à Presidência da República.
Assim,
daquela geração ideológica, resta Dilma Rousseff, que certamente tentará reeleger-se
em 2014. Quer ganhe, quer perca, com isso se encerrará a etapa dessa geração no
governo do país.
É impossível
determinar em que momento exato isso se consumará, mas parece evidente que novas
lideranças políticas começam a se impor no cenário nacional, como Eduardo
Campos, Aécio Neves, Sérgio Cabral Filho e Eduardo Paes.
Eles
constituem uma geração não ideológica, caracterizada, por isso mesmo, pelo
pragmatismo político, como se evidencia em suas respectivas atuações como
governantes. A fase da ideologia passou.
É por
perceber isso que Lula se preocupa, hoje, em dar força à candidatura de novas
figuras do seu partido, com o propósito de não deixar que o lulismo termine com
a sua morte e a aposentadoria de Dilma.
A
dificuldade reside não apenas no pouco carisma dos candidatos que inventou, mas
sobretudo na inconsistência da proposta petista, que só se manteve até aqui graças
ao carisma do próprio Lula.
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