Nossas universidades precisam
falar inglês
A
Argentina recebe mais alunos dos EUA do que nós... Temos a tradição de resistir
a cursos em inglês na universidade, como se fosse uma questão de soberania
Nosso
ensino superior está se internacionalizando. É uma via virtuosa: as
instituições se internacionalizam porque se qualificam e se qualificam porque
se internacionalizam.
Há
um pequeno fluxo de estudantes de graduação europeus que passam alguns anos da
sua formação em nossas melhores universidades em programas de duplo diploma.
Na
pós-graduação, o Brasil é um destino importante para estudantes de países
vizinhos. O Brasil é extremamente atraente para eles: tem um sistema
universitário desenvolvido; oferece formação de primeira linha; ao contrário do
que ocorre na maioria dos países, não cobra taxas ou mensalidades de nenhum
estudante, brasileiro ou estrangeiro; há abundância de bolsas e oportunidades
de financiamento. Falamos uma língua facilmente acessível para quem fala
espanhol.
Mas
os resultados atuais estão muito aquém do que poderiam ser.
O
Brasil ainda tem um número pequeno de universidades entre as 500 melhores do
mundo. O número de alunos estrangeiros no Brasil é bastante reduzido. Há mais
estudantes norte-americanos na Argentina do que no Brasil. Isso se deve à
preferência dos estudantes por um país que fala espanhol, mas também pela
disponibilidade de programas de graduação em inglês.
As
universidades brasileiras deveriam considerar a possibilidade de oferecer
cursos superiores em inglês -de preferência até completos- juntamente com o
português.
Na
idade média, quando as universidades foram criadas, as pessoas cultas se
comunicavam em latim. Graças ao latim, um estudioso de Oxford ou de Bolonha no
século 12 podia trocar ideias com alguém de Salamanca ou da Sorbonne.
Com
o passar do tempo, o latim caiu em desuso e o inglês tomou conta do universo
universitário. Atualmente não existe nenhuma conferência internacional
importante que não adote o inglês como língua franca. É LEANDRO
TESSLER, 50, é professor do Instituto de Física Gleb Wataghin da Unicamp e
assessor para internacionalização da universidadefundamental para o
avanço do conhecimento que pesquisadores possam se comunicar e se fazer
entender diretamente.
Nós,
brasileiros, historicamente temos resistido a introduzir o inglês como língua
de instrução nas nossas universidades.
Há
quem afirme que ensinar em inglês seria renunciar à soberania nacional, como se
a nossa nacionalidade estivesse estritamente associada a falar português. Não
se tem notícia de que algum país não anglófono no qual há ensino superior em
inglês (como Portugal, berço da língua portuguesa) tenha renunciado a sua
nacionalidade por isso.
Outra
posição recorrente é a do esforço: alguém realmente interessado em estudar no
Brasil deveria aprender a língua.
Em
tese, isso está correto. Na prática, os estudantes preferem dirigir-se a países
onde as aulas são dadas em inglês. Eles sentem-se muito mais seguros com a
garantia de que a língua não será um problema para o aproveitamento de sua
estada.
Na
verdade, se ensinássemos regularmente em inglês estaríamos fazendo muito mais
pela divulgação e expansão da cultura brasileira e da língua portuguesa.
Uma
última objeção é que isso elitizaria ainda mais as já elitizadas universidades
brasileiras. Isso talvez fosse correto se deixássemos de ensinar em português.
No entanto, a coexistência de cursos em inglês e português ofereceria
oportunidades para estudantes brasileiros conviverem com estrangeiros e
aperfeiçoarem sua proficiência em inglês.
Foi
divulgado recentemente que no programa Ciência sem Fronteiras foram concedidas
duas vezes mais bolsas para Portugal e Espanha do que para o Reino Unido, os
Estados Unidos e a Austrália, onde se concentram as melhores universidades do
mundo.
Isso
só pode ser explicado pela deficiência na formação dos estudantes em inglês. É
urgente mudar isso.
Os
primeiros passos para uma internacionalização efetiva do nosso ensino superior
já foram dados. Falta sermos mais atraentes para estudantes de todo o mundo,
como somos atualmente para os estudantes latino-americanos. Falta termos mais
resultados de pesquisas publicados em inglês. Publicações acadêmicas em inglês
atingem a um público muito maior e têm mais impacto sobre o desenvolvimento
científico e cultural da humanidade.
O
Brasil tem tudo para se tornar um centro importante mundial de ensino superior.
Precisamos saber aproveitar a oportunidade histórica.
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