quinta-feira, 15 de novembro de 2012


15 de novembro de 2012 | N° 17254
 L. F. VERISSIMO

Se fosse um filme

Confesso que foi com um certo sadismo que fiz questão de acompanhar a confirmação da vitória do Barack Obama na rede de televisão Fox, que chama seu próprio noticiário de “justo e equilibrado” mas é escancaradamente de direita e fez campanha contra o Baraca desde o seu primeiro dia como candidato a presidente, na eleição anterior. A Fox até que foi justa e equilibrada ao anunciar antes da rival CNN que os números asseguravam a vitória do democrata, mas lutaram contra a realidade até o último minuto.

A cena mais cômica da resistência à derrota eu perdi: Karl Rove, um dos cérebros do Partido Republicano, estrategista e eminência nada parda do governo Bush, transformado em comentarista político da rede, recusou-se a aceitar os cálculos dos próprios tabuladores da Fox e foi protagonista do grande vexame da noite, exigindo que as contas fossem refeitas, até ser convencido de que não havia mesmo mais esperança.

Se as eleições americanas fossem um filme do Frank Capra, o enredo seria simples e cativante: mais uma vez políticos sem escrúpulos e os lóbis do dinheiro eram derrotados pelo homem comum, no caso minorias que não se deixaram levar por campanhas milionárias e mesmo com muito menos recursos reelegeram o candidato da solidariedade e da justiça.

O filme poderia terminar com o Karl Rove – que além de tudo tem o físico para o papel de “gato gordo” – vociferando contra o resultado. Mas o Frank Capra já morreu e não fazem mais filmes como os dele. Romney mobilizou uma quantidade fabulosa de dinheiro, mas parece que o Obama mobilizou ainda mais.

Desde que a Justiça americana permitiu que empresas doassem dinheiro para campanhas eleitorais como se fossem pessoas físicas, sem limites, o que havia de disponível para gastar ultrapassava qualquer divisão entre dinheiro bom e ruim, ou nosso e deles. Nunca se gastou tanto numa eleição americana como nesta, e as campanhas foram sujas de lado a lado. Mas o vexame do Karl Rove compensou tudo o que os democratas gastaram.

No dia seguinte, na Fox, um figurão do Partido Republicano – sim, o Karl Rove de novo, sem nenhum sinal aparente de ter sentido o golpe – analisava a derrota do Romney e recomendava ao seu partido o óbvio, que tentasse conquistar as minorias que deram a vitória ao Baraca. Ele deve continuar como comentarista do “justo e equilibrado”. No filme imaginário do Frank Capra, ele talvez terminasse com uma banca de frutas.

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