25
de novembro de 2012 | N° 17264
VERISSIMO
O tio
rico
Todos
em casa tinham sido avisados. O tio rico iria visitá-los. O tio rico era uma
espécie de figura mítica para a família. Não sabiam muito a seu respeito, só
sabiam que era rico, muito rico. Não sabiam nem, exatamente, qual era o
parentesco dele com a família. A mãe tinha uma vaga ideia.
–
Acho que ele é filho da Valdinha.
A
Valdinha, também conhecida na família como a Prima Devassa, tinha se envolvido
com um comerciante de tapetes trambiqueiro, que trazia imigrantes clandestinos
enrolados nos seus tapetes orientais.
Um
dia um dos imigrantes morrera sufocado dentro do tapete. Abnir, o comerciante
de tapetes, protestara. Não sabia como aquele cadáver tinha surgido no meio da
sua mercadoria. No noticiário sobre o escândalo aparecera uma foto de Abnir e a
Prima Devassa num restaurante, de mãos dadas. A mãe não sabia que fim tinha
levado a prima Valdinha ou o Abnir. O tio rico podia ser filho deles. Ou
então...
–
Ele pode ser neto da tia Hortência, a que herdou um hotel.
Fosse
como fosse, ficariam sabendo o grau de parentesco do tio rico com a família do
próprio tio rico. E o que o tio rico queria com eles. O tio rico podia – por
que não? – ter decidido distribuir sua fortuna entre seus familiares. Mesmo os
que mal o conheciam. Por que não?
A
família reuniu-se para receber a visita do tio rico. O pai botou gravata, a mãe
um vestido melhorzinho. As crianças foram instruídas a se comportarem.
Decepção: o tio rico não chegou num carro com motorista. Não chegou nem de
táxi. Veio a pé. Quando entrou na sala disse:
–
Ah, bem como eu imaginava. E pediu: – Posso ver o resto da casa?
E a
cada peça da pequena casa que examinava, dizia “Maravilha”
Depois,
na sala, tomando um licorzinho, o tio rico contou que acompanhava a vida da
família de longe.
–
Acompanha, como? – perguntou a mãe, espantada.
–
Sei tudo sobre vocês. Sei até onde estudam as crianças. Vocês não acreditariam
no número de vezes em que passei aqui na frente, imaginando como seria
participar da vida de vocês. Vocês são uma família perfeita.
O
pai também estava espantado. Perguntou: – Mais licor?
–
Não. Olhe. Vou fazer uma oferta. Eu sei que vocês não têm empregada. Estão
usando o quarto de empregada como depósito. Eu proponho me mudar para cá e
ocupar o quarto de empregada. Pagando um aluguel, é claro.
–
Mas, mas... É um quarto minúsculo! – disse a mãe. – Para mim, é perfeito. Tudo
para participar da vida de vocês.
E o
tio rico acrescentou: – Afinal, somos uma família!
Depois
da visita, a mãe se lembrou. Não tinha perguntado se o tio rico era filho da
Valdinha e do Abnir ou neto da tia Hortência, a que herdara um hotel. Mas nos
dias que viriam eles teriam muito tempo para saber da vida do tio rico. Na mesa
do jantar ou em volta da TV, na sala. O tio rico já tinha dito que não era de
sair muito e adorava uma boa novela.
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