28
de novembro de 2012 | N° 17267
PAULO
SANT’ANA
A fiança
Um
dos momentos mais nervosos e cruciais do campo espiritual é aquele em que uma
pessoa pede fiança para outra.
Eu
tenho um amigo que não tem nenhuma propriedade imobiliária. No entanto, durante
toda a vida ele teve inúmeras oportunidades de adquirir imóveis. Nunca adquiriu
algum porque tem a família muito numerosa e, se tivesse adquirido imóvel,
fatalmente alguém iria lhe pedir fiança.
A
relação entre o fiador e o afiançado é uma das mais conflituosas que se
conhecem no campo das relações humanas.
Há pessoas
que não concedem fiança nem para os seus irmãos de sangue, quanto mais para os
cunhados.
E não
há instante de pior ruptura entre as pessoas do que quando alguém nega fiança
para outrem: está assim quebrado o cristal da amizade.
Outro
amigo meu tem uma expressão: “Dou tudo o que tenho para quem me pedir, menos
fiança”.
Não
há nada mais injusto do que um fiador pagar uma fiança para um afiançado que não
cumpriu com seu compromisso.
O
fiador, em última análise, não tem nada a ver com aquele compromisso financeiro
que assumiu o afiançado. E, no entanto, ele é obrigado a pagá-lo. Paga sem ter
usufruído do aluguel ou qualquer outro bem que tenha gozado o afiançado.
Por
outro lado, para o afiançado se torna muito dolorido e constrangedor pedir fiança
para o provável fiador. Há afiançados que relutam durante anos em pedir fiança,
envergonhados, inibidos, destruídos ante a possibilidade de que tenham de pedir
a fiança, o supremo momento de dor e covardia dos afiançados.
Há outros
caras de pau que nem se tocam para pedir fianças, pedem-nas a torto e a direito
e por certo não honram nenhuma delas.
Ainda
na semana passada narrou-me um conhecido meu as imensas dificuldades por que
está passando em face de ter de pagar uma fiança concedida a um parente seu que
não foi honrada.
Ele
me disse que o juiz que executou a fiança ainda foi compreensível e parcelou a
dívida, até mesmo porque não teria como pagá-la por inteiro.
Mas
ele me contou que está sendo obrigado a restringir todos os seus gastos, até mesmo
os de alimentação, em razão de que a prestação a que foi obrigado reduziu a
escombros o seu orçamento.
Felizes
dos que, ou por se precaverem, ou por sorte, não são solicitados a dar fiança a
ninguém.
Se há
instituto do Direito Civil que é infeliz e inadequado, é o da fiança, que
separa as pessoas, que cria ódios e inimizades, que tinha de ser substituído
por outro mecanismo que não transformasse os seus atores em inimigos da noite
para o dia.
Maldito
abismo criado entre as pessoas essa encrenca máxima da fiança.
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