28
de novembro de 2012 | N° 17267
EDITORIAIS
ZH
A Anatomia da Fraude
A
organização criminosa desmontada pela Polícia Federal, composta por pessoas
consideradas inatingíveis pelo fato de terem as “costas quentes” por terem sido
indicadas por poderosos, é cruelmente ilustrativa de como a máquina pública se
presta em muitos casos mais para atender aos interesses de grupos do que aos do
conjunto da sociedade.
A própria
figura-chave do esquema montado para a prática de tráfico de influência e
corrupção é uma síntese do que ocorre quando o critério de preenchimento de
postos-chaves é o mero apadrinhamento.
Rosemary
Nóvoa de Noronha, a Rose, foi levada ao poder pelo ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva, que a preservou no governo Dilma Rousseff. Blindada na condição
de chefe de gabinete da Presidência em São Paulo, tinha marido e filha bem
instalados na esfera pública. Mais: transformou as agências de regulação numa
fonte de enriquecimento com base na venda de pareceres. Enquanto a tolerância
com esse tipo de comportamento for mantida, o setor público continuará nas mãos
de especialistas em lesar o setor público.
Um
aspecto particularmente inaceitável dos fatos desvendados agora é que os danos
desse tipo de deformação não podem ser atribuídos apenas a más escolhas,
embora, em sua maioria, os episódios mais recentes de corrupção acabem
envolvendo os chamados braços direitos de figuras poderosas.
Um
dos principais envolvidos no esquema de venda de facilidades instalado em órgãos
federais, Paulo Rodrigues Vieira, só assumiu a direção da Agência Nacional de Águas
(ANA) porque o Senado resistiu em aprovar sua indicação, mas acabou cedendo na
terceira tentativa. Instituições como essa, inicialmente previstas para atuar
com independência na regulação dos serviços concedidos, acabaram se
transformando com o tempo em meras autarquias de ministérios.
Em
conse- quência, ficaram sujeitas a pressões político-partidárias no jogo do
vale-tudo entre companheiros de partido e na busca de apoio do Congresso a
projetos de interesse do governo.
Como
se não bastassem todas essas deformações na configuração da máquina pública, na
maioria dos casos pessoas guindadas a postos-chaves pela mão de políticos
influentes são encaradas como quem pode tudo. O país precisa dar um basta à tolerância
excessiva com a atuação de apadrinhados que entram pela janela para transformar
o setor público em balcão de negócios, como demonstrou a chamada Operação Porto
Seguro.
Ao
lançar luz sobre a anatomia da fraude, a Polícia Federal oferece ao país mais
que uma oportunidade de punição dos fraudadores. Contribui também para o
desenvolvimento de antídotos de transparência que efetivamente façam efeito
contra a corrupção.
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