05
de julho de 2012 | N° 17121
L. F.
VERISSIMO
De areia
O
homem estava caminhando na praia e passou por um garoto que fazia uma construção
de areia. Parou para olhar. Lembrou-se do seu tempo de garoto, quando também
gostava de fazer aquilo.
– Bonito,
o seu castelo de areia – disse o homem para o garoto.
O
garoto olhou para o homem. Depois falou:
– Não
é castelo. – O que é então?
– Condomínio
fechado.
Mais
tarde, no grupo que se reunia para um papo à beira-mar, todos mais ou menos da
mesma idade, o homem contou que o que lhe parecera serem as torres do muro do
castelo na verdade eram guaritas para os guardas do condomínio, segundo o
garoto.
– Vejam
vocês. Que fim levaram os castelos de areia da nossa infância?
– A
realidade do garoto é essa – disse alguém.– No outro dia minha neta quis saber
por que a Cinderela não deu o número do celular dela pro príncipe.
– O
curioso é o pulo, de castelo para condomínio fechado. Do feudalismo para a
paranoia contemporânea, sem etapas intermediárias. Quinhentos anos de
arquitetura ignorados.
– Mas
os castelos feudais não deixavam de ser condomínios fechados. E os condomínios
fechados não deixam de ser fortalezas medievais.
– Portanto,
o garoto, na verdade, é um gênio da síntese.
No
dia seguinte, o homem avistou o garoto no mesmo lugar da praia. Viu com satisfação
que ele dava os retoques finais na sua obra, fazendo escorrer areia molhada da
mão nos pontos mais altos da sua construção. Talvez ele tivesse decidido fazer
um castelo, afinal. Castelos eram irresistíveis, seu fascínio atravessava o
tempo e as gerações. O homem perguntou se o que o garoto estava fazendo eram
ornamentos para os torreões do castelo.
– Não
– disse o garoto. – O que é então?
– Antenas
parabólicas. O homem seguiu seu caminho, suspirando.
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