RUTH DE AQUINO
20/09/2013 21h14 - Atualizado em
20/09/2013 22h13
Como sobreviver a tantas
inovações
A maior inovação, hoje, seria
inventar uma maneira de esticar o tempo... Não se trata de
rejuvenescimento ou expectativa de vida – nem distinção entre
trabalho e ócio. A inovação seria um aplicativo para esticar as
horas, os minutos, os segundos. Para situar nossos desejos e
compromissos dentro das medidas de tempo.
Quando percebo o grau de ansiedade,
frustração e superficialidade que invade hoje os relacionamentos
interpessoais, em qualquer idade e profissão, torço para que
estejamos vivendo uma transição para algo melhor. É preciso
encontrar...
Tempo para escutar
Escutar o filho, a mãe, o pai, o
namorado, o marido, a mulher, o colega de trabalho, o chefe, o
subordinado, o amigo, o vizinho, o paciente, o desconhecido. Ninguém
escuta mais ninguém. Falamos sozinhos e deixamos o outro falando
sozinho. Tem gente que ainda acha que pode escutar alguém fazendo
outra coisa simultaneamente. Não pode. No fim, há uma algazarra de
palavras jogadas fora, que batem na parede e voltam.
Tempo para ler
Nem me refiro a romances e livros. As
pessoas não leem sequer um e-mail inteiro, do início ao fim. A não
ser que seja uma frase apenas. É enorme a quantidade de
mal-entendidos gerados porque as pessoas não têm mais tempo de ler
um e-mail inteiro. E também não têm tempo de responder aos
e-mails, nem para agradecer.
Tempo para fazer amor
Não falo de preliminares, carinhos
antes ou depois. E sim do ato em si. Quantos deixam de fazer amor por
teclar aparelhos na cama sem cessar. Por trabalhar na cama. Ou por
demorar a deitar na cama. Quantos interrompem o sexo para atender um
celular ou responder a uma mensagem. Quantos fazem amor com a cabeça
em outro lugar. Não dá para ser multimídia no sexo. Estar presente
é condição para o prazer pleno.
Tempo para pensar
Em vez de pensar duas vezes antes de
agir, as pessoas agem duas vezes antes de pensar. Essa agilidade
exacerbada pode até dar certo em alguns casos, mas pode custar caro.
A falta de tempo para refletir leva a decisões e conclusões
precipitadas, que não costumam ser as mais sensatas.
Tempo para encontrar amigos (e não
seguidores)
As redes sociais ameaçam tornar a
amizade uma ilusão. Os rituais da amizade se perderam na exposição
obsessiva e narcisista de detalhes da vida pessoal. Noutro dia, ouvi
alguém dizer que o Facebook é a melhor maneira de perder amigos.
Porque aquela pessoa que você achava bacana se revela um chato na
rede social. E provavelmente você também se revela uma mala.
Tempo para curtir, até mesmo no
Facebook
Muita gente dá “like” no FB sem ao
menos ler o que foi postado. Dá “like” por gostar de quem postou
aquilo e por querer que essa pessoa contribua dando “like” no que
ela postou. Isso não acontece sempre, mas acontece muito. Falta
tempo para curtir qualquer coisa com um mínimo de consistência.
Tempo para férias. verdadeiras
A extrema competitividade faz com que
muitos não tirem férias ou então continuem ligados no trabalho. Há
também quem ocupe as férias com a tarefa incessante de relatar aos
outros o que está comendo e o que seus bebês e cachorros estão
fazendo.
Tempo para comer
É preciso comer mais devagar, e sem
ficar teclando e olhando o celular.
Tempo para respirar
Não é por acaso que os cursos de
respiração fazem hoje tanto sucesso. Desaprendemos a respirar e,
por isso, tanta gente vive com excessiva sofreguidão e insônia.
Tempo para cuidar da saúde
Não faz sentido o ser humano não ter
tempo para fazer exames ou se tratar. Ou sentir culpa por dedicar
tempo a sua saúde. Isso se chama autodestruição.
Com isso, poderíamos viver com um
mínimo de cordialidade, leveza e calma. Qualidades que parecem ter
sofrido curto-circuito num mundo interconectado demais.
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