15 de setembro de 2013 | N° 17554
VERISSIMO
Nosso
tempo
O Alfredo contou para o Binho que estava escrevendo um livro
sobre o nosso tempo. O Binho entendeu que o Alfredo estava escrevendo sobre o
nosso tempo no sentido, assim, de O Nosso Tempo. O século 20. A era moderna.
Mas o Alfredo esclareceu:
– Não, não. O nosso tempo. Nosso, da turma. A nossa
juventude.
Depois disse: – Nós aprontamos algumas, hein Binho?
O Binho fez uma cara de “sei não”.
O Régis ficou sabendo do livro pelo Binho e telefonou para o
Alfredo. Era verdade que o Alfredo estava escrevendo um livro sobre a turma,
sobre “aquele nosso tempo”? Era, confirmou, o Alfredo.
– Romanceado? – perguntou o Régis.
– Como, romanceado?
– Você vai usar os nomes verdadeiros?
– Claro. – Você acha?
– Por que não? Tem histórias fantásticas. Aquela vez em que nós fomos
com a Maria Estela pra...
– Alfredo, usa pseudônimo!
Quem procurou o Alfredo não foi a Maria Estela. Foi o Argeu,
que, apesar de tudo, tinha casado com a Maria Estela. Queria saber sobre o
livro.
– Não tem nada demais – começou a dizer o Alfredo.
Argeu o interrompeu. – A Maria Estela faz muito trabalho na
igreja.
– Sim, mas...– Não põe a Maria Estela no livro, Alfredo.
O próximo foi o Pinto, que não fez rodeios. – Que história é
essa de livro?
– Pois é. Estou pensando em escrever sobre aquele nosso
tempo. Acho que tem algumas histórias...
– A da galinha no velório, por exemplo?
– É. Essa é uma delas. – Não bota o meu nome.
– Mas você foi um dos que...– Não bota o meu nome. Ou bota
um pseudônimo.
– Mas foi uma coisa de adolescente, perfeitamente...
– Você sabe o que eu sou hoje, Alfredo? E você se lembra de
quem era o velório?
– Mas...– Quer um conselho? Esquece esse livro.
O Alcides disse que era uma boa ideia escrever o livro, que
o livro resgataria uma época, que seria divertido e ao mesmo tempo importante,
que muitas gente ia se lembrar do seu próprio passado lendo o livro, e meditaria
sobre as loucuras e os sonhos perdidos de uma geração, e que o Alfredo devia,
sim, escrever o livro – desde que não o citasse. Explicou que sua terceira
mulher tinha uma carreira e que o livro poderia prejudicá-la. E, além do mais,
ele já era avô.
– Pô, Capitão – disse Alfredo. – Capitão?
– Você não se lembra? Seu apelido na turma era Capitão
Fumaça.
– Sabe que eu não me lembrava?
Alfredo decidiu reunir a turma para falar na sua ideia para
o livro. Explicou que ele mesmo financiaria a edição. O que significava que
seria uma edição pequena, que sua circulação seria restrita, que poucas pessoas
leriam.
Explicou que sua intenção era capturar um momento na vida
deles, da turma. Para que todos pudessem lembrar “aquele nosso tempo”. O tempo
em que todos eram jovens, e o que eles sentiam, e pensavam, e tinha aprontado.
Ninguém seria prejudicado, só se divertiriam. Tudo tinha acontecido há muito
tempo. Como se fosse em outro país. E com o tempo, disse Alfredo, tudo vira
literatura. Mesmo com os nomes verdadeiros.
Aí o Pinto disse: – Tá doido.
E o Régis disse que se o livro saísse com o nome dele, ele
processava. E o Argeu anunciou que e Maria Estela fosse mencionada, embargaria
a edição. E a Suzaninha disse que queria mais era esquecer o seu passado, mas
se o Alfredo insistisse em escrever o livro de qualquer maneira, queria que seu
pseudônimo fosse Tatiana.
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