09
de setembro de 2013 | N° 17548
ARTIGOS
- Paulo Brossard*
Metástases
Depois
dos episódios gerados pela intemperança bolivariana nas relações com o nosso
país, que, aliás, as vem suportando com insensibilidade córnea, assim como por
sua benquerença em relação à prática agressiva, levou o governo ao silêncio. Se
esta foi a reação na esfera oficial, fora dela não desapareceu o desconforto.
Deste, pode ser apontado programa que teve marcante repercussão dada a
qualificação de seus participantes. Trata-se do programa Painel, semanalmente
produzido sob a direção de William Waack, profissional de larga experiência.
A
ideia central não poderia ser mais objetiva acerca do que aconteceu com o
Itamaraty e a política externa do Brasil nos últimos anos. Da conversação
participavam o embaixador Rubens Antônio Barbosa, que encerrou sua atuação
diplomática à frente das duas mais importantes embaixadas, em Londres e em
Washington, o professor Marco Antônio Villa e o cientista Guilherme Casarões.
O
embaixador começou dizendo que não ocorrera mudança na política geral, que
continuava voltada aos mesmos objetivos, mas que ocorreram certas preferências
antes inexistentes, de inspiração ideológica e, o que é mais, por vezes
contrárias aos interesses brasileiros, o que é muito grave; exemplificou com o
procedimento dado ao Paraguai, quando por muitas razões merece um tratamento
especial, fatores antigos e atuais como os milhões de brasileiros que lá vivem
e trabalham, a necessária energia elétrica gerada em Itaipu, e assim por
diante;
no
entanto, o Brasil contribuiu para a suspensão paraguaia do Mercosul, sem uma
justificativa e contra os interesses do Brasil; não é tudo, a Bolívia tem feito
poucas e boas em desfavor do Brasil e, não obstante, não lhe cessam as blandícias
por parte do nosso governo, lembrou a brutal expulsão da Petrobras e suas
instalações, a revogação do acordo de fornecimento de gás e o consequente
agravamento do preço a níveis quase insuportáveis, o incidente em avião do
Ministério da Defesa revistado arbitrariamente, o afastamento de três
embaixadores de postos importantes em solidariedade à Bolívia, em razão da
revista em avião de Evo na Europa, e, por fim, a recusa de salvo-conduto ao
senador boliviano asilado pelo Brasil, descumprindo cláusula expressa na
disciplina internacional do asilo e que veio a motivar o desencontro atual.
Isto sem falar na reiterada submissão à Argentina, como agora está ocorrendo
novamente.
E,
para encerrar, o sumaríssimo afastamento do embaixador a quem fora confiada a chefia
do Itamaraty, em horas, coisa jamais vista, sem precedente. Teria sido a
derradeira mesura de homenagem ao governante boliviano. Tudo era consequência
de uma novidade inserida na estrutura da instituição, quebrando mais de século
de observância, a política externa é nacional, e não partidária. Por uma
espécie de metástase que se propaga, a deformação tem se ampliado a outros
setores, como a Petrobras e o Banco do Brasil, e de outros de maior expressão
transformados em sucursal de um partido.
Para
encerrar, recorro a que disse o professor Marco Antônio Villa, o Itamaraty foi
atingido como instituição e parece não saber o que quer.
*JURISTA,
MINISTRO APOSENTADO DO STF
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