28
de setembro de 2013 | N° 17567
PAULO
SANT’ANA
Sua Majestade, o
burro
O
burro, indivíduo que se caracteriza por oblíquos raciocínios, quando envereda
pela burrice, faz um trajeto reto, nunca desvia de rumo. Interessante é que o
burro para si próprio parece ser brilhante: o burro possui atilado orgulho.
Não
raro, em nosso meio, o burro se consagra exatamente por ser burro. Alguns
burros ficam famosos pela sua burrice. O burro é como uma parede de aço, sua
burrice é imarcescivelmente férrea: a ideia bate na cabeça do burro e volta,
ela não penetra.
Invariavelmente,
o burro é um debatedor, quase ninguém concorda com ele, aliás, só concorda com
ele quem for também burro. Existem os burros cordatos e os burros enraivecidos.
O burro enraivecido é aquele que puxa briga quando discordam dele.
E o
burro cordato é o que se conforma com sua burrice. Ele é humilde, sabe que é
burro e admite sua inferioridade: é o tipo mais raro de burro. O burro não se
corrige, não se regenera, nasce burro e morre burro.
A
caixa craniana do burro é feita de material impenetrável, nada a vaza, nem as
ideias mais magistrais. Se você atirar um burro na água profunda, a sua cabeça,
podem notar, será a única parte de seu corpo que ficará boiando, ela é vedada
completamente à água e às ideias inteligentes.
Também
interessante é que o burro quase sempre se acha inteligente, exceção feita ao
burro humilde. Ele passa a vida inteira achando que é brilhante e que a
sociedade não lhe faz justiça.
Mas
ele vai em frente na esperança de que um dia lhe considerem genial. A burrice é
um exercício de perseverança, de não desistência. Afinal, o que o burro vai
fazer, se não sabe fazer outra coisa senão ser burro para sempre?
O
mundo é feito de burros e inteligentes. O burro dá azar de ser burro. Mas há um
ponto de vista que considera um burro feliz por ser burro: por passar a vida
inteira sem se dar ao trabalho de pensar, o que desgasta muito os que pensam.
Com
o burro não se dá assim: sabe lá que vantagem têm essas criaturas burras de
viver a vida inteira sem pensar? É uma moleza! Quem não pensa não sofre.
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