30
de setembro de 2013 | N° 17569
ARTIGOS
- Paulo Brossard*
Impropriedade não é altivez
Pretendia
escrever sobre assuntos bem diferentes dos que estou agora a ocupar-me, mas fui
praticamente obrigado a fazê-lo considerando a passagem da senhora presidente
da República pelos altiplanos da Assembleia Geral da ONU. A despeito de suas
debilidades, aliás, desde sua constituição decorrentes da reserva do poder de
veto reservada a cinco Estados, a ONU não se libertou até agora dessa mácula.
Contudo,
nela continua a existir a tribuna de caráter mundial da qual o Brasil tem o
privilégio de ocupar na abertura dos trabalhos da Assembleia Geral, como legado
de um alegretense que reunia ao talento a bravura e a ambos o fascínio de sua
personalidade de escol: a Osvaldo Aranha se deve essa prerrogativa. Isto posto,
nada mais natural que nessa ocasião nosso país seja representado pelo chefe do
Estado.
Não
faz muito tempo, foi amplamente divulgado que a senhora presidente pensava em
suspender a viagem aos Estados Unidos a convite daquele país e sem demora a
suspensão foi convertida em cancelamento. Ao mesmo tempo, foi descoberto o
acesso de fontes americanas a assuntos referentes ao nosso país, fato objeto de
ampla publicidade.
Ambas
as ocorrências foram noticiadas reiteradamente como alvo do discurso a ser
proferido pela senhora presidente na oração que deveria pronunciar ao ser
aberta a Assembleia Geral, o que foi confirmado. Ocorre que a novidade
descoberta não se sabe se pela senhora presidente, se pelo Itamaraty ou pelo
inominado assessor especial da presidência, de novidade não tinha nada.
Esses
dados me parecem significativos, pois sucessivamente divulgados de maneira a
dar caráter internacional a um expediente de evidente endereço eleitoral que,
aliás, tem sido reconhecido por gregos e troianos; saliente-se que depois da
queda de popularidade da senhora presidente, seu marqueteiro, também conhecido
como quadragésimo ministro, prometia recuperar a popularidade perdida em coisa
de quatro meses.
De
modo que até a xingação, aqui anunciada antes do discurso da Assembleia Geral e
por todos os meios de comunicação; ao ser confirmada, era público, não
surpreendeu a ninguém; não estranha por conseguinte que nenhuma autoridade
americana de média importância que fosse estava presente, o que era
compreensível dado que o teor da peça era de todos conhecido?
O
tom inadequado do discurso soa como tentativa de exibir suposta altivez, quando
se destinava a fins internos e meramente eleitorais. E assim veio a ser
entendida de maneira geral.
Nesta
altura, o que me parece de particular importância é saber se o Itamaraty
inspirou ou acompanhou o plano, ou se foi ele concebido pela senhora presidente
com ou sem a colaboração de seu assessor especial, ainda que, qualquer que seja
a resposta, o fato é de suma gravidade; contudo, o interesse nacional reclama que
esse ponto seja esclarecido. Se o Itamaraty tinha conhecimento mais diminuído
fica ele, fenômeno que tem sido apontado particularmente por diplomatas de alta
expressão.
Depois
da xingação veio a louvação. A senhora presidente prosseguiu fazendo o elogio
do seu próprio governo com a pretensão de incentivar investimentos
estrangeiros. Com todas as vênias, parece-me que o expediente chega às raias da
infantilidade, até porque os eventuais investidores além de cientes da situação
interna e externa do país, seguramente são leitores, entre outras publicações
de circulação internacional, de The Economist.
Em
síntese, o discurso proferido em Nova York se destinava à pretendida reeleição.
Convém lembrar que, não faz muito, a senhora presidente declarou sem rebuços
que na campanha ela seria uma “fera”...
*JURISTA,
MINISTRO APOSENTADO DO STF
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