ELIANE CANTANHÊDE
A
volta dos que não foram
BRASÍLIA - O Brasil, que se vangloria, com boas razões, dos
avanços dos últimos 20, 30 anos, corre o risco de ter, simultaneamente, um
preso na Papuda com mandato de deputado, um presidente do Senado que foi
enxotado por denúncias e voltou ao cargo, três condenados pelo Supremo mantendo
o mandato e um governador que foi destituído, preso e, agora, é de novo
candidato.
O tal Natan Donadon foi parar na cadeia por ordem do Supremo
e manteve o mandato pelo voto dos colegas da Câmara. O presidente do Senado que
saiu e voltou é Renan Calheiros. Os condenados pelo Supremo com mandato, um ou
outro com assento na Comissão de Constituição e Justiça, todo mundo sabe quem são.
E quem é o governador do qual tratamos aqui? É o ex-governador
José Roberto Arruda, do Distrito Federal, flagrado com a boca na botija no
chamado "mensalão do DEM".
Arruda --que, no início, tinha tudo para dar certo-- já era
reincidente a essas alturas. Tinha se enlameado no Senado, teve a segunda
chance e afundou de vez no governo do DF.
Mas será que afundou de vez mesmo? Ele foi afastado do cargo
e preso na mesma Papuda que agora hospeda Donadon, mas acaba de ter as contas
do seu governo em 2008 aprovadas pela Câmara Distrital, enquanto a Justiça
empurra com a barriga, como faz em geral com poderosos.
Por isso, Arruda já emerge, põe o nariz de fora e fareja a
possibilidade de se filiar ao PR para concorrer a qualquer cargo em 2014. Pode?
Sei lá. Ele e o presidente do partido no DF acham que sim, alegando que, se
todo o mundo pode, por que ele não?
Por falar em "todo o mundo", a revista "Congresso
em Foco" acaba de concluir um levantamento mostrando que, de cada dez
parlamentares, quatro estão enrolados no Supremo Tribunal Federal --que é o
foro privilegiado (bota privilegiado nisso!) dos que têm mandato. São 224
deputados e senadores respondendo a 542 inquéritos e ações penais.
É desanimador...O mais afoito dos dois (aquele acusado de
acelerar) sugere descolarem a parte que engrouvinhou e colar de novo. O mais
cauteloso (o acusado de atrasar) discorda. O afoito, contudo, não quer nem
saber e puxa o papel: as bolhas e estrias somem, assim como uma faixa de 1,20 m
x 10 cm de tinta e massa corrida, arrancada pelo adesivo.
O afoito tenta colar de novo, mas o volume das cascas de
tinta e massa corrida fica evidente --parece um tapete estendido sobre a areia
da praia. Vocês olham a parede. Só 30 cm do primeiro rolo foi aplicado. Ainda
faltam 35,7 m. Vocês se olham. Estão juntos há seis anos. Pensavam em ter
filhos, em fazer pão em casa aos domingos, tomar banhos de banheira, visitar a
Pinacoteca e quem sabe até, um dia, forrar aquele quarto com um belo papel de
parede.
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