30
de março de 2015 | N° 18117
CÍNTIA MOSCOVICH
MORAL
DE CUECAS
Parece
inacreditável, mas, passadas quase três semanas do tal “beijo gay” protagonizado
por Teresa e Estela, personagens de Fernanda Montenegro e de Nathalia Timberg
no primeiro capítulo da novela Babilônia, ainda há os que não se conformam com
o feito. Com uma duraçãozinha de nada, a cena resultou em gente escandalizada e
indignada, que anda liderando boicotes contra a novela.
É o
caso da Frente Parlamentar Mista Permanente em Defesa da Família Brasileira, órgão
da Câmara Federal e que é presidido pelo senador Magno Malta (PR-ES). Malta
acusa a novela de fazer “apologia do mal” e de “pretender destruir famílias” – como
se um beijo entre duas octogenárias fosse desmantelar a moral e os bons
costumes.
Claro
que Malta, a bancada evangélica e toda a grande parcela da população de moral
mais conservadora tem toda a liberdade de não gostar dessa cena ou de qualquer
outra. É deles o direito sagrado de desligar a televisão, mudar de canal, até de
comandar boicotes. O que se torna exagerado é essa quase obsessão em tutelar os
telespectadores, como se o público fosse constituído por um bando de débeis
mentais que não sabem ao que deve assistir (aliás, Malta encarna – mais – uma
espécie de moral de cuecas, envolvido que esteve no Escândalo das Sanguessugas,
aquele da compra de ambulâncias).
Com
a pegada cada vez mais realista, às vezes hiper-realista, das telenovelas, o
aproveitamento de temas corriqueiros na vida brasileira (favelas,
criminalidade, corrupção, tráfico de drogas) tornou-se mandatório. Que surja,
então, um casal de lésbicas em nada deveria surpreender – porque há, e sempre
houve, grande quantidade de casais assim conformados.
Uma última
consideração. Para compor a trama, os autores Gilberto Braga, Ricardo Linhares
e João Ximenes Braga “precisam” de Teresa e Estela e da difícil vida pregressa
de ambas numa sociedade – justamente – preconceituosa. Logo saberemos, por
exemplo, que o filho de Teresa saiu do Brasil com vergonha da mãe lésbica.
Em
resumo: a homossexualidade é elemento narrativo necessário e que não pode ser
banido em nome de uma moral que não se sustenta em sua própria base.
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