18 de março de 2015 | N°
18105
PEDRO GONZAGA
O TREM(UMA TEORIA)
O trem chega. Você caminha pela
plataforma. Pessoas caminham pela plataforma. Uma havia chamado sua atenção,
mas ela se perderá ao entrar no outro segmento do trem. Dias, ou semanas, ou
meses, ou anos depois, vocês voltam a se cruzar na mesma estação.
Desta vez, dividirão o carro e
talvez seus olhares se encontrem, mas a viagem dela não terá o mesmo destino
que a sua, ela descerá antes que você possa perceba. Na próxima oportunidade,
você poderá descobrir-lhe o cheiro, o modo como sorri, ela terá sentado perto,
talvez você escute seu nome, enquanto a pessoa que entrou com ela lhe vota
palavras de amor, indiferença ou ódio.
Virá a vez em que ela estará
muito próxima, mas será você a criatura absorta em pensamentos gerados por
outra criatura, ali ou distante. À espada da sorte (ou do azar), vocês dois, um
dia sentarão lado a lado. E haverá um reconhecimento e quem sabe um acidente,
como dois corpos postos em rota de colisão. E vocês se farão companhia.
E a natureza desamparada dos
viajantes solitários será suspensa. E então haverá a leveza das conversas
novas. Quem sabe suas pernas discretamente se encostem, e depois as mãos. Para
além, a cabine em que vocês, isolados do mundo, flutuarão até o fim da viagem.
Nós, esses passageiros. A vida
feito inúmeras baldeações. Em nosso vagão há conhecidos, amigos, as pessoas que
amamos, enquanto nós também podemos estar em seus vagões, até que os caminhos
se bifurquem. No meio disso, os encontros amorosos, aleatórias intersecções
que, racionalizadas, teriam a feição absurda daquele conto do Cortázar em que
um homem segue transições programadas no metrô a fim de encontrar a mulher de
sua vida.
Não há transições programadas. Em
um momento, chegamos cedo ou tarde demais à plataforma. No outro,
experimentamos a simpatia de um olhar que se perderá ao desembarque. Depois,
somos aqueles prontos para tentar quando o outro está fechado, depois fechados
quando o outro está aberto às tentativas. Por fim, somos os que se encontram,
esses que por um momento descobriram a felicidade, semelhante a um
descarrilamento, esquecidos de quão curtos são sempre os destinos.
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