terça-feira, 31 de maio de 2011



31 de maio de 2011 | N° 16716
CLÁUDIO MORENO


Tudo parece tão fácil!

Se você quer atrair a atenção de seu semelhante, procure desenvolver a “sprezzatura” (os dois ZZ soam como em “pizza”), termo criado no Renascimento italiano para designar a arte de fazer os outros pensarem que é muito fácil para você o que é difícil para eles. Ironicamente, alcançar esta falsa espontaneidade, premeditada em seus mínimos detalhes, dá um trabalho danado, mas se você conseguir passar a impressão de que faz tudo sem esforço, sempre vai despertar a cobiçada admiração de seu próximo.

Um rei desta arte foi Lúculo, político e aristocrata romano, famoso por sua fortuna. Uma tarde, no Fórum, foi surpreendido por dois amigos, também senadores, que perguntaram se ele lhes faria um favor muito especial. “O que quiserem”, respondeu, sorridente, com sua elegância de sempre. “Pois queremos jantar na tua casa hoje à noite – mas tudo sem cerimônia, é claro; vamos comer aquilo que comes quando não tens convidados”.

Como imaginavam, Lúculo pareceu perturbado: balbuciou uma desculpa, ensaiou, não muito convicto, uma ou outra objeção, e terminou sugerindo que eles escolhessem qualquer outra noite da semana, quando teria o maior prazer em recebê-los. Os dois, no entanto, felizes em pegá-lo desprevenido, mostraram-se irredutíveis: afinal, o que era um simples jantar para quem oferecera o que quisessem?

Apanhado na palavra, Lúculo finalmente concordou, mas pediu que o deixassem ao menos avisar por um escravo que ele hoje jantaria no “Apolo” – um dos tantos salões de sua mansão. Os amigos concordaram, sem saber que tinham caído na esparrela: os nomes correspondiam a diferentes tipos de jantar que Lúculo havia combinado previamente com seu intendente, que agora sabia qual era o menu, qual a coberta de mesa e quanto deveria gastar em enfeites, em música e em outras atrações.

Quando o grupo chegou, três horas depois, aguardava-os um banquete de luxo e requinte indescritíveis. Os dois convidados mal conseguiam encontrar palavras de elogio, tão atônitos que ficaram diante daquela opulência – enquanto Lúculo, para aumentar ainda mais o secreto prazer que sentia, desmanchava-se em desculpas, alegando, com ar de embaraço, que teria preparado uma recepção mais digna se soubesse que teria visitas...

A mulher que se maquia com tamanha sutileza que parece natural (“Acordei assim...”) e o alfaiate londrino que consegue fazer um terno caríssimo sem aparência de novo praticam a “sprezzatura”. Para quem escreve, então, ela é a virtude suprema.

Quer produzir um texto que pareça simples ao leitor? Então aprenda a comer, nos bastidores, o pão que o diabo amassou: costure e recosture os parágrafos, refaça as frases mil vezes, quebre a cabeça em busca da palavra exata e da ordem precisa – e sem queixas, porque tudo o que é fácil de ler é difícil de escrever. E vice-versa.


31 de maio de 2011 | N° 16716
FABRÍCIO CARPINEJAR


Salinha

O cheiro é meu alfabeto.

Esqueço nomes, não apago cheiros. Esqueço rostos, não abandono cheiros.

O cheiro é minha memória.

Não há como repetir certas fragrâncias: a da merendeira, por exemplo. Precisaria alternar maçãs e bananas, reeditar a porção certa de queijo, de manteiga e de mortadela dos sanduíches preparados pela mãe, refazer a umidade precisa do guardanapo que envolvia o pão e derramar o Nescau na hora de desenroscar a pequena térmica, durante cinco anos seguidos, para alcançar algo parecido.

O cheiro me explica, o cheiro é que me puxa. Revisei os principais cheiros de minha vida – o do cabelo de minha mulher após o banho, o do estojo de lápis de cor, o do balcão do armazém do Seu Zé, o do lençol novo de hotel, o de estofado de carro zero, o do forro das gavetas – depois de visitar a Escola Estadual Leopoldo Tietbohl, em Porto Alegre.

Entrei na biblioteca para uma palestra, e respirei fundo o ambiente das prateleiras de metal, das cartolinas e do universo retangular das mesas e cadeiras creme.

Levei um soco do vento, um solavanco.

Foi uma nebulização mais do que um acesso nostálgico.

Eu tenho uma biblioteca imensa, tenho amigos com bibliotecas imensas, pais com bibliotecas imensas, mas nenhuma delas tem um cheiro semelhante ao da biblioteca da escola.

As residências exalam um olor de visita, de horário marcado. Uma lufada impessoal de escritório, lustra-móveis, ar-condicionado. Apesar das estantes forradas e do convívio familiar, não é o cheiro da salinha de livros do colégio.

Não identifico o que existe de diferente. Mas vejo, sinto, confirmo a diferença.

Será que a passagem de milhares de alunos muda a textura das paredes? Que cheiro é aquele? Uma mistura de ventilador, de mimeógrafo, de papel secando, de bala azedinha... Um cheiro inexplicável, doce e salgado ao mesmo tempo, como alguém que mastiga bolacha de sal e bebe refrigerante.

Todas as bibliotecas de todas as escolas do mundo têm o mesmo cheiro. Pode ser a pressa das vozes ou as mãos suadas dos alunos nas páginas ou a combinação entre avental e uniforme ou a caneta bic falhada na ficha catalográfica ao final dos volumes ou a manta da bibliotecária ou seus suspiros por um amor platônico.

Ou pode ser que não entreguei algum livro emprestado e agora pago multa com as palavras.


31 de maio de 2011 | N° 16716
LIBERATO VIEIRA DA CUNHA


Doce de pronunciar

Quando eu estudava no Curso Clássico, então um ritual de passagem para o vestibular e para a universidade, era um requisito básico conhecer a língua portuguesa. Isso significava dominar tanto a ortografia, como as normas de concordância verbal e nominal, sem falar, é claro, na gramática.

Pois não é que agora o MEC abençoa a publicação – e paga – de um livro, adotado por meio milhão de alunos do ensino fundamental, que ensina que a norma culta é apenas mais uma entre as maneiras de expressar-se? Traduzindo: quando eu digo os automóvel, ao invés de os automóveis, estou apenas usando uma variação popular do idioma, perfeitamente aceitável.

Trata-se de um erro crasso. Em uma época na qual a competição profissional exige exatidão e conhecimento, uma frase tipo Eu amo os livro é o caminho mais curto rumo ao insucesso num concurso ou numa prova de admissão.

Falei antes no Curso Clássico. Era o percurso obrigatório para quem desejava uma vaga numa Faculdade de Direito, Letras ou Filosofia. Isso não absolvia os estudantes do Curso Científico de se aplicarem na língua portuguesa, mesmo se seu destino fosse uma Escola de Engenharia ou de Medicina.

Nos mergulhavam até em Camões. As aulas de análise sintática – base do Latim – nos ocupavam por horas inteiras. E quem não entendesse nem Camões nem o Latim não passava de ano.

Tudo isso tinha um propósito. Era o de nos familiarizar com a norma culta, sem a qual ninguém ia a lugar nenhum. Literalmente, mesmo que você fosse um aluno de Física Quântica, era necessário que soubesse escrever 30 linhas de uma redação em que o sujeito chamasse e o predicado respondesse no tom exato, com pontos, vírgulas e complementos no lugar certo.

Sei que hoje tudo é diferente. Por alguns anos até, a redação acabou sendo banida do vestibular e o Francês, o Latim e a Filosofia expulsos dos currículos. As coisas felizmente vêm mudando para melhor.

Mas nada autoriza o MEC a aprovar, financiar e distribuir obras que agridem o idioma.

Pois a língua portuguesa é, segundo Rodrigues Lobo, branda para deleitar, grave para engrandecer, eficaz para mover, doce para pronunciar.

segunda-feira, 30 de maio de 2011



30 de maio de 2011 | N° 16715
EDITORIAIS ZH


PUNIÇÕES BRANDAS

Às vésperas dos julgamentos de Jaqueline Roriz (PMN-DF), denunciada por indícios de corrupção, e de Jair Bolsonaro (PP-RJ), acusado de racismo, a Câmara dos Deputados adotou uma inovação que deve, no mínimo, manter todos em alerta. Por decisão das lideranças, aprovada simbolicamente em plenário, a partir de agora os parlamentares que cometerem alguma irregularidade poderão sofrer somente uma pena branda de suspensão do mandato, e não mais de cassação.

Apesar do argumento de que é preciso usar a gradação, de acordo com a gravidade de cada caso de falta de decoro, corre-se o risco de ver a banalização da suspensão como punição.

Com essa possibilidade, a Câmara, que muitas vezes faz prevalecer o espírito de corpo para preservar seus integrantes, poderia recorrer à explicação de que, suspendendo temporariamente um mandato, teria cumprido seu dever corregedor e penalizado o denunciado.

Seria uma desculpa reprovável, por induzir que qualquer punição pode ser suficiente para a reparação das irregularidades cometidas, mesmo as consideradas graves. A denúncia contra a deputada Jaqueline Roriz contém a repetição de um delito já clássico entre políticos. Jaqueline foi flagrada recebendo propina de Durval Barbosa, delator do chamado mensalão do DEM em Brasília.

Uma mobilização de deputados de várias bancadas procura blindar a acusada, sob o argumento de que o fato, filmado pelo próprio corruptor, ocorreu em 2006, quando ela ainda não era deputada. Por esse raciocínio, os lamentáveis antecedentes de Jaqueline não seriam suficientes para uma condenação.

O caso de Bolsonaro é considerado menos grave, na concepção de parte dos colegas, porque o deputado já teria esclarecido que não pretendeu ofender os negros, num depoimento feito à TV, quando também atacou – e reiterou em outras ocasiões – os homossexuais.

Os casos são distintos e estão sob exame do Conselho de Ética, que tem a atribuição de relatar se os legisladores atentaram contra o decoro parlamentar. O que espanta, mas não surpreende, já que o Congresso perdeu a capacidade de produzir surpresas quando se trata da ética na política, é que a decisão de permitir penas mais brandas ocorre em meio aos julgamentos.

Pelas normas vigentes antes da inovação, o conselho poderia relatar e submeter ao plenário duas opções: a cassação ou simplesmente a suspensão das prerrogativas parlamentares por um mês. A partir de agora, além da cassação, a outra alternativa, como punição concreta, é a suspensão do mandato por seis meses. Outra pena, ainda mais branda, continua sendo a simples censura verbal ou escrita.

A alternativa da suspensão do mandato por meio ano passa a ser a grande tentação. Assim se evitariam as cassações. Como seria acintoso demais apenas repreender ou suspender por um mês a deputada Jaqueline Roriz, essa poderá ser a saída, o que acrescentaria ao acervo de Brasília mais um exemplo da incúria do parlamento.

A sociedade está atenta e, mesmo que nada possa fazer para interferir nas decisões dos corregedores do Legislativo, saberá como julgar suas atitudes, se forem confirmadas as suspeitas de que o abrandamento das penas atenta contra a ética que o próprio conselho supostamente deveria proteger.


30 de maio de 2011 | N° 16715
KLEDIR RAMIL


Superstição!

Eu não sou supersticioso, mas por via das dúvidas não passo debaixo de escada. A desculpa de sempre é que estou sendo prudente, para evitar que caia uma lata de tinta na cabeça. Outro dia, um gato preto cruzou na minha frente. Saí correndo feito louco, dei meia-volta no gato e descruzei o nó. Vai saber. Não dá pra dar sorte ao azar.

Essas bobagens são crendices populares que não atingem um sujeito racional como eu, com curso superior completo e capacidade de reflexão. Mas, como diz o ditado, “no creo en brujas, pero que las hay, las hay”.

Tem muito jogador de futebol que só entra em campo com o pé direito e fazendo o sinal da cruz. Criei o hábito de começar meu dia assim, saindo da cama como se estivesse pisando no gramado. Virou um costume. Um dia, só pra testar, levantei com o pé esquerdo e o Internacional perdeu um jogo decisivo. Talvez tenha sido só uma coincidência, mas me senti culpado.

Meu irmão me deu um trevo de quatro folhas. Dizem que dá sorte. Apesar de não entender porque uma aberração da natureza poderia dar sorte, guardei o presente no meio do livro da Martha Medeiros que estou lendo. Minha vida não teve maiores alterações, mas notei que o livro pulou para as primeiras posições na lista dos mais vendidos.

Aproveitei e coloquei a plantinha, com toda sua força sobrenatural, dentro da minha carteira de dinheiro. Tenho esperança que a mágica funcione e, no futuro, eu possa até mesmo entrar para o mercado financeiro. Minha mão já começou a coçar.

Entusiasmado com uma possível maré de boa sorte, comprei uma ferradura e um chaveiro de pé de coelho. São amuletos que trazem saúde, paz e felicidade, além de dinheiro, que não é tão importante quanto uma vida saudável, mas é quem paga a fatura do seguro saúde. E, com certeza, vai melhorar o meu ranking de investimentos no mercado financeiro.

Mesmo que você não leve a sério tudo isso, não custa nada tomar cuidado. Aí vão algumas dicas. Não abrir guarda-chuva dentro de casa, nem deixar sapato virado de boca pra baixo. Espelho quebrado, sete anos de azar. Sexta feira 13, é melhor nem sair na rua. Tem certos dias em que os astros estão de mau humor. Não me pergunte porque.

Eu, sinceramente, não acredito em nada disso. Apenas respeito e, por via das dúvidas, bato na madeira três vezes pra garantir a proteção. Não dá pra brincar com essas coisas.


30 de maio de 2011 | N° 16715
PAULO SANT’ANA


Socorro, um time por favor!

Renato Portaluppi: jamais se viu em nosso meio um treinador, em silêncio absoluto, gritar tanto por socorro para a direção de um clube. E os dirigentes teimaram em não dar para Renato os mínimos reforços necessários. Ontem, no Paraná, chegou a dar pena: o Atlético passou os 45 minutos finais do jogo encurralando o Grêmio, que não tinha recursos para o contra-ataque.

Foi de dar dó. Mas onde está o presidente Odone que não percebe ser cruel esse abandono a que foi relegado o treinador? Onde está o presidente Odone que não percebe que não pertence ao terreno lógico das coisas permitir que o Grêmio só ganhe quando houver uma epopeia como a de ontem?

Chega a ser humilhante o quadro horrendo da falta de atacantes no Grêmio. Como pôde o clube inscrever-se para este Brasileirão sem atacantes? Ninguém na frente, absolutamente ninguém. Ainda uma enganação se permite na defesa, talvez na meia-cancha, como essa enganação a que a direção gremista submeteu a sua torcida este ano.

Mas no ataque cai a máscara da omissão gremista em 2011. Resultado desse gigantesco e irritante erro: só se pode ganhar uma partida quando o goleiro Victor tiver uma atuação lendária, inesquecível como a de ontem.

É duro ser gremista e ter-se no passado acostumado a usufruir de grandes glórias e topar agora com este time remendado, em que há um grande Rochemback, em que há um ótimo Lúcio, mas não há quase mais nada.

E o time é atirado aos leões dentro de campo, com a única esperança do estoicismo, da epopeia. Ou não é epopeia sair vencedor ontem sem ter feito gol? Ganhamos com um gol contra porque não temos jogador nenhum que saiba ou possa fazer gol a favor.

O Grêmio deu ontem um gigantesco passo para fugir do rebaixamento. Não sei se irá fugir. A lógica é que com este time inexpressivo, apesar do talento inequívoco do treinador, seja rebaixado, sinto dizer isso, este é o quadro pragmático das possibilidades gremistas diante desta pobreza franciscana dos valores individuais do time.

Todo o time rebaixado não acreditava que podia ser rebaixado, como a direção gremista não acredita nisso hoje.

Nós, gremistas, somos uns desventurados. Nossa vida perdeu todo e qualquer colorido, não há poesia em viver assim torcendo por um time inexpressivo.

Restou-nos ver o Barcelona. Restou-nos torcer pelo Neymar. Restou-nos admirar qualquer grande futebol que não passe pelo Olímpico.

É demais o sofrimento gremista. Isso dói tanto que parece uma cólica renal.

Alguém vai ter de fazer alguma coisa para nos arrancar deste inferno.

Ontem, o sofrimento foi muito maior que a vitória com as calças na mão.

Socorro! Socorro! Socorro!


30 de maio de 2011 | N° 16715
L. F. VERISSIMO


Estragos e soluções

Não se sabe qual é a, digamos, inclinação política do pênis. Ele é anatomicamente de centro, como todos os políticos na Itália, que se identificam como de “centrosinistra” ou de “centrodestra”, nunca de sinistra ou de destra. O pênis é centrão assumido, mas de que tendência ninguém sabe. Ele ora pende para um lado, ora para outro.

Além de ser obviamente um falocrata, que se pudesse falar definiria sua posição como “sou mais eu”, sua ideologia é desconhecida. Raramente é a do seu portador, em relação ao qual mantém uma evidente independência de pensamento e ação. Há esquerdistas com pênis fascistas, conservadores com pênis sempre atrás de novas experiências sociais, liberais com pênis decididamente intervencionistas.

O pênis é, por assim dizer, um livre atirador. Pênis não tem dono. Ou, dito de outra maneira, não costuma levar em consideração a conveniência dos seus donos. E como a comunicação entre o homem e o seu pênis é precária, o pênis não ouve apelos à razão e não adianta pedir para ele ter uma consciência histórica, o resultado é o estrago que vem causando a carreiras e reputações através dos tempos. Sem querer nem saber.

Veja-se o caso recente do Strauss-Kahn e do seu pênis predador. Deve ter havido uma tentativa de diálogo entre Strauss-Kahn e seu pênis antes do ataque à camareira. Não é impossível que o ex-provável candidato a presidente do seu país tenha até invocado o futuro da Europa e do mundo para tentar deter o pênis.

“Arretez pour la France!” O pênis não teria dado ouvidos. Espera um pouquinho, esqueça esta frase. O pênis não teria ligado. E fora adiante, sem nenhum prurido patriótico. E SK está politicamente liquidado. Mais uma vítima do próprio pênis.

O que fazer para que coisas assim não se repitam? A primeira solução é radical: a castração como condição para o serviço público masculino e carreiras políticas. Para o pênis aprender. A segunda solução seria a gradual substituição de homens por mulheres no poder, em todo o mundo. Uma solução que já está em curso. Os homens manteriam seu pênis, mas sem a possibilidade de causar mais estragos. E pronto.

domingo, 29 de maio de 2011


FERREIRA GULLAR

Verdade e preconceito

Pensava que escritor não deveria escrever errado; li só gramáticas por dois anos ao suspeitar que seria poeta

TENHO COMENTADO aqui o fato de que, para alguns linguistas, nunca há erro no uso do idioma: tanto faz dizer "problema" como "pobrema" que está certo. Confesso que, na minha modesta condição de escritor e jornalista, surpreendo-me, eu que, ao suspeitar que poderia me tornar poeta, passei dois anos só lendo gramáticas. E sabem por quê? Porque acreditava que escritor não pode escrever errado.

E agora descubro que ninguém escreve errado nunca, pois todo modo de escrever e falar é correto! Perdi meu tempo? Mas alguma coisa em mim se nega a concordar com os linguistas: se em todo campo do conhecimento e da ação humana se cometem erros, por que só no uso da língua não? É difícil de engolir.

Essa questão veio de novo à baila com a notícia de um livro, adotado pelo Ministério da Educação e distribuído às escolas, em que a autora ensina que dizer "os livro" está correto. Estabeleceu-se uma discussão pública do assunto, ficando claro que, fora os linguistas, ninguém aceita que falar errado esteja certo.

Mas não é tão simples assim. Falar não é o mesmo que escrever e, por isso, falando, muita vez cometemos erros que, ao escrever, não cometemos. E às vezes usamos expressões deliberadamente "erradas" ou para fazer graça ou por ironia. Mas, em tudo isso, está implícito que há um modo correto de dizer as coisas, pois a língua tem normas.

O leitor já deve ter ouvido falar em "entropia", uma lei da física que constata a tendência dos sistemas físicos para a desordem. E essa tendência parece presente em todos os sistemas, inclusive nos idiomas, que são também sistemas.

Devemos observar que as línguas, como organismos vivos que são, mudam, transformam-se, como se pode verificar comparando textos escritos em épocas diferentes. Há ainda as variações do falar regional, que guarda inevitáveis peculiaridades e constituem riqueza do idioma.

Mas isso não é a mesma coisa que entropia. Já violar as normas gramaticais é, sim, caminhar para a desordem. Se isso é natural e inevitável, é também natural o esforço para manter a ordem linguística, que não foi inventada pelos gramáticos, mas apenas formulada e sistematizada por eles: nasceu naturalmente porque, sem ela, seria impossível as pessoas se entenderem.

Na minha condição de "especialista em ideias gerais" (Otto Lara Resende), verifico que, atualmente, não só na linguística, tende-se a admitir que tudo está certo e, se alguém discorda dessa generosa abertura, passa a ser tido como superado e preconceituoso.

Agora mesmo, durante essa discussão em torno do tal livro, os defensores da tese linguística afirmaram que quem dela discordava era por preconceito.

Um dos secretários do ministro da Educação declarou que aquele ministério não se julgava "dono da verdade" e que, por isso mesmo, não poderia impedir que o livro fosse comprado e distribuído às escolas.
Uma declaração surpreendente, já que ninguém estava pedindo ao ministro que afirmasse ou negasse a existência de Deus, e sim, tão somente, que decidisse sobre uma questão pertinente à sua função ministerial.

Não é ele o ministro da Educação? Não é ele responsável pelo rumo que se imprima à educação pública no país? Se isso não é de sua competência, é de quem?

De fato, o que estava por trás daquela afirmação do secretário não era bem isso, e sim que a crítica ao livro em discussão não tinha nenhum fundamento: era mero preconceito. Ou seja, simples pretensão de quem se julga dono da verdade que, como se sabe, não existe...

Esse relativismo, bastante conveniente quando se quer fugir à responsabilidade, tornou-se a maneira mais fácil de escapar à discussão dos problemas.

Certamente, não se trata de afirmar que as normas e princípios que regem o idioma ou a vida social estejam acima de qualquer crítica, mas, pelo contrário, devem ser questionados e discutidos. Considerar que todo e qualquer reparo a este ou aquele princípio é mero preconceito, isso sim, é pretender que há verdades intocáveis.

Não li o tal livro, não quero julgá-lo a priori. Creio, porém, que quem fala errado vai à escola para aprender a falar certo, mas, se para o professor o errado está certo, não há o que aprender.

JOSÉ SIMÃO

Ueba! Datena levou uma voadora!

E o presidente do Corinthians garante que as obras do estádio começam na próxima semana. Santa!

BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Deu a louca nos supermercados! Olha a placa da gôndola de azeites e torradinhas do Pão de Açúcar: "Uma entradinha caprichada faz você feliz?". FAZ! Rarará! Então não é Pão de Açúcar! É Pau de Açúcar! E essa oferta no Extra: "Mesa de ferro fudido".

E ainda parcelam em cinco vezes. E essa: "Todos os produtos dessa mesa contém glúteos". Pão com bunda! E a manchete do Sensacionalista: "Corintianos desolados com a perda de Dentinho: "Era o último que a gente tinha'".

Corintiano agora só vai de sopa e truta. E o presidente do Corinthians garante que as obras do estádio começam na próxima semana. SANTA! E diz que o estádio vai se chamar Fielzão. Mas como ninguém acredita, muda pra Ateuzão!

E essa do G1: "Mulher flagra marido transando com uma pata". E fica com cara de pata! A pata é ela! E essa da Folha: "Sexo oral dá câncer na boca". E uma amiga minha: "Por que não me avisaram ontem?". Rarará! Sexo oral dá cãibra na boca! No máximo, pode dar LER. Lesão por esforço repetitivo.

E o babado da TV: comandante Hamilton vai pra Record. E deixa o Datena a pé! Sem helicóptero! Isso é a pior coisa da separação: quando um dos dois vai embora e leva o carro! O comandante Hamilton deu uma voadora no Datena! Rarará! E o bom do comandante Hamilton é que ele entrega pizza em dia de enchente!

E o Datena vai chamar o Marrone. No lugar do comandante Hamilton. Datena chama o Marrone pra pilotar o "Águia"!

Bullying no Palofi! Diz que a Dilma perguntou pro Palofi: ""Você sabe multiplicar por 20?". "Sei, mas demora quatro anos".

E uma amiga me disse que o marido tá igual o Palofi: em quatro anos, a barriga aumentou 20 vezes. E as quatro operações matemáticas: somar, diminuir, dividir e Palocci! E a manchete do Twiteiro: "Palocci explica o fenômeno do crescimento: "Meu patrimônio sofre de hipotireoidismo'". Efeito Ronaldo! Rarará!

E avisa pros tucanos e demolidos que CPI não serve pra nada. A não ser pra aparecer em telejornal. CPI é Coma a Pizza Inteira. CPI é a Comissão de Perguntas Imbecis! Rarará! Nóis sofre mas nóis goza!

Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

simao@uol.com.br

DANUZA LEÃO

Um amigo leve

Não espere considerações sobre a complexidade dos sentimentos, mas ninguém será melhor companhia

É SEMPRE ASSIM: com tanto para fazer e sem tempo para nada, a gente acaba negligenciando um monte de coisas, entre elas nossos afetos.

E como os sentimentos não sobrevivem sem uma certa atenção, um dia se começa a achar que o coração não consegue -e nunca mais vai conseguir- gostar, ou ao menos sofrer por alguém.

Mas o tempo passa, aquele amigo que a gente via o tempo todo viaja e um belo dia você sente saudades dele. Preste atenção: esse fato é mais merecedor de uma comemoração do que qualquer data querida. Ter saudades de um amigo, há quanto tempo isso não acontecia? Ah, que coisa boa.

Uma simples saudade faz com que você se sinta viva, mesmo que sejam saudades apenas de um amigo -como se um amigo pudesse ser chamado de "apenas". Mas tantas vezes você amou apaixonadamente, e quando ele fez uma viagem sentiu um alívio, até para descansar de tanta paixão e poder se encher de cremes, sem ele por perto para reclamar? E tem melhor do que de vez em quando ter aquela cama enorme só para você, e até dormir com a televisão ligada?

Ter um amigo é coisa muito boa, e sendo um que não te patrulha, não te inveja, não te analisa nem discute a relação, é bom demais -e raro. Um amigo tão bom que te aceita do jeito que você é, que não faz perguntas indiscretas, que te entende e está por ali sem ser, jamais, invasivo. Você sabe de certas particularidades dele, ele das suas, mas delas não falam, só quando é necessário. E com pouca intimidade.

O excesso de intimidade pode ser fatal, mesmo entre mãe e filho, marido e mulher. A intimidade física não é nada, perto da dos pensamentos e sentimentos.

Pode ser pior do que ouvir a pergunta "em que você está pensando?". Pode sim: é quando alguém tenta analisar a razão pela qual você disse ou fez determinada coisa num determinado dia, pretendendo, assim, conhecer você melhor do que você mesma se conhece.
Um distanciamento saudável é indispensável às boas relações humanas.

Qual a primeira qualidade que deve ter um amigo? Bem, além das clássicas, como lealdade, fidelidade, discrição sobre as intimidades que ouviu nas horas do aperto, disponibilidade para escutar as histórias, bom humor, e mais o quê? Leveza. Ter um amigo leve é uma benção dos céus.

Não espere dele considerações sobre a vida e a complexidade dos sentimentos humanos, mas ninguém será melhor companhia para jantar, viajar, conviver, do que um amigo leve. Já pensou, passar três dias seguidos com um amigo profundo?

Se estiverem tomando banho de mar, ele pode se lembrar do tempo em que era criança, falar da relação que tinha com a mãe e o pai, e daí para cair no divã é um pulo; eles gostam de falar como são tolos os banqueiros e políticos, que só pensam em dinheiro e poder e não compreendem que a vida real etc. etc., quanta profundidade.

Com essa mania, quando estão numa rede em frente à praia, comendo um camarãozinho frito e tomando uma cerveja estupidamente gelada, se esquecem de que nessa hora o bom é não pensar em nada.

É isso que faz um amigo leve; ele não diz nada, apenas usufrui a vida, e quem tiver a sorte de estar perto dele vai ter momentos de grande felicidade - ou pelo menos quase isso.
Com um amigo assim, até a vida fica mais leve.

danuza.leao@uol.com.br

ELIANE CANTANHÊDE

Nota vermelha

BRASÍLIA - A melhor declaração da semana passada foi a do presidente americano, Barack Obama, para quem a China, a Índia e o Brasil são emergentes até bem bacanas, mas estão muito longe de fazer frente à hegemonia dos Estados Unidos e do Reino Unido. Alguém há de questionar?

Os Brics (excluídas a Rússia, que não se vê como "emergente", e a África do Sul, que acaba de chegar) de fato vêm fazendo bonito na economia, e as projeções indicam que o furacão China deve ultrapassar os EUA até 2020. Mas hegemonias não se fazem apenas com PIB.

O que a China tem na economia não tem na política e está muito longe de ser uma democracia. Já a Índia é craque em tecnologia, especialmente em informática, mas abriga milhões de miseráveis famintos.

E o Brasil caminha com a rapidez de uma lebre para ser a quarta maior economia do mundo e com a morosidade de um cágado para se tornar um país moderno.

Nada poderia ilustrar melhor o estágio brasileiro do que a própria semana em que Obama fez a comparação dos Brics com os EUA: o principal ministro atolado em mais um escândalo; os órgãos do governo se esquivando de apurar; a presidente da República tutelada pelo antecessor; o vice-presidente aos gritos com o chefe da Casa Civil; o Código Florestal em chamas; as idas e vindas do kit anti-homofobia para as escolas.

Na área urbana, um assassino confesso, mas poderoso, foi preso depois de 11 anos de recursos e só deve ficar dois na cadeia. No campo, o assassinato de três líderes rurais: José Cláudio Ribeiro da Silva e sua mulher, Maria do Espírito Santo da Silva, no Pará, e Adelino Ramos, em Rondônia.

Ou seja: há crises e falhas graves no Executivo, no Legislativo e no Judiciário. Não é assim que o Brasil vai conseguir um lugar ao sol e um assento no Conselho Permanente da ONU para ensinar ao mundo o que é paz, justiça e dignidade. Primeiro, precisa fazer a lição de casa.

elianec@uol.com.br

CLÓVIS ROSSI

Esse Palocci é um gênio

SÃO PAULO - Uma noite de abril de 2003 jantei com o então ministro da Fazenda, Antonio Palocci, em Washington. Foi aliás a convite dele.

Mas aproveitei para tentar mostrar ao leitor como era a vida de um ex-trotskista, daqueles de gritar "abaixo o FMI", como ele próprio me contou, convertido, então como agora, à ortodoxia do Fundo.

Perguntei se Palocci entendia de economia. Respondeu que sabia apenas o macro. Aprendera, como prefeito de Ribeirão Preto, que "é preciso pagar as contas".

Vê-se agora que Palocci é um aluno excepcional: mesmo sem entender muito de economia, deu consultorias, que lhe permitem pagar todas as contas e ainda sobrar renda, que "chamam a atenção", como diz um raro petista não contaminado pelo total cinismo, caso do governador Jaques Wagner.

Chama mais a atenção porque, apenas três anos antes de dar início à exuberante carreira de consultor, Palocci recebia consultoria, em vez de prestá-la.

Está lá, no texto publicado em 2003, uma lista parcial de economistas nacionais e estrangeiros que o ministro dizia consultar: de Delfim Netto a Maria da Conceição Tavares, de Joseph Stiglitz a Jeffrey Sachs, todos grifes de porte no ramo, embora de etiquetas diferentes, até opostas.

Tudo somado, acho que só cabem duas linhas de investigação para apurar a evolução patrimonial que tanto chamou a atenção de Jaques Wagner (e das torcidas do Corinthians e do Flamengo em peso):

1 - A neurociência ou qualquer outra ciência prova que o cérebro de Palocci é uma esponja extraordinária, capaz de absorver conhecimentos em quantidade, qualidade e velocidade inéditas no planeta.

2 - É tráfico de influência mesmo, tentado pelas empresas contratantes ou efetivamente levado a cabo.

Jaques Wagner, colega que foi de Palocci no Ministério Lula, não parece acreditar na hipótese 1.

crossi@uol.com.br

sábado, 28 de maio de 2011



29 de maio de 2011 | N° 16714
REVOLTA EUROPEIA


Redes sociais espalham protestos

Como na Tunísia e no Egito, europeus sofrem com desemprego e utilizam as redes sociais para impulsionar manifestações

As manifestações iniciadas na Espanha, em 15 de maio, pela movimento intitulado Democracia Real Já, começam a se espalhar pela Europa, impulsionadas pelas redes sociais. Mensagens difundidas por Facebook e Twitter convocam para este domingo manifestações por todas as capitais europeias, em solidariedade aos espanhóis e contra medidas tomadas pelos governos para atender aos interesses de bancos, desfavorecendo a população.

Na Espanha, os protestos são contra as medidas de austeridade adotadas para diminuir o déficit do governo, que influem nos benefícios da população, como as aposentadorias, que tiveram a idade mínima aumentada de 65 para 67 anos e contra as atuais taxas de desemprego – entre os jovens, passam de 40%.

– O protesto surge a partir de uma situação precária, não só na Espanha, como em todo o mundo, causada pelos governantes e os bancos privados – explicam Libertad Gallardo e Blanca Villoria, que participam da organização dos protestos em Leipzig, na Alemanha, ressaltando que não falam em nome do movimento.

Via internet, participantes lançam pedidos como “quem tem um megafone” e “quem pode imprimir 2,5 mil panfletos”. A agilidade é tanta que, na última sexta-feira, momentos após o início da ação policial que expulsou os manifestantes acampados na Praça Catalunha, em Barcelona, comunidades do Democracia Real Já de outros países no Facebook já combinavam protestos para reclamar da violência empregada pelos policiais – oficialmente, são 121 feridos.

Dave Monfort, 36 anos, criou, logo após participar de manifestação em apoio à “revolução espanhola”, a comunidade da Democracia Real Já na Bélgica no Facebook. Como nas revoltas no mundo árabe, o movimento espanhol também é movido pelos problemas econômicos, espalhados via redes sociais e liderados por jovens. Alguns manifestantes esperam, como foi a Tunísia no mundo árabe, que a Espanha desencadeará uma revolução pacífica na Europa.

– Criei a comunidade porque acredito num efeito dominó. As revoltas árabes inspiram a revolução espanhola, que levará a uma revolução europeia, que pode desencadear uma revolução global – defende o desenvolvedor de web belga também participa das assembleias gerais do grupo.

laura.schenkel@zerohora.com.br


29 de maio de 2011 | N° 16714
ARTIGOS - Sérgio da Costa Franco*


Melhoramos muito

No exercício de uma pesquisa histórica, percorremos coleções de jornais locais da década de 1920 e, de uma análise desses periódicos, chegamos à grata convicção de que, não só em termos de linguagem, de conteúdos e de tecnologia da comunicação, melhoramos muito.

Descabe qualquer tipo de saudosismo em relação à imprensa do passado. Jornal partidário, como era o caso de A Federação, era um monumento de sectarismo, mais preocupado em glorificar o presidente Borges de Medeiros e em fazer a defesa de seu governo do que em informar o público.

No aniversário do governo ou do próprio presidente, ou da morte do Patriarca Júlio de Castilhos, os clichês com a imagem dos chefes ocupavam metade da primeira página.

E todo o noticiário desses dias era sequência de elogios, ao governo e ao partido, com rasgada adjetivação. Ao revés, o tratamento dispensado aos adversários era em geral ofensivo e desrespeitoso. Cremos que, em matéria de culto à personalidade, A Federação superou o próprio Pravda dos tempos de Stalin...

Também no tocante ao respeito à pessoa humana, o jornalismo fez progressos imensuráveis. A crônica policial de 1929 não vacilava em exibir fotos de suspeitos de crime, revelados apenas pela investigação policial, sem condenação judicial, com a legenda inapelável: “gatuno”. Esta era palavra da moda na designação de ladrões, com seus derivados “gatunagem” e “gatunice”. De “larápio”, também gostavam muito os nossos colegas daquele tempo.

Os infratores mais qualificados recebiam o título de “punguista” ou “batedor de carteira”, personagem muito em moda naquele tempo, nos bondes repletos, que ainda não eram exclusivos da população pobre e conduziam também endinheirados, de carteira cheia, numa época que precedeu o cartão de crédito e o próprio uso do cheque.

Não raro, a foto exibia também os policiais que haviam detido o punguista, numa evidente homenagem aos defensores da ordem. Estelionatários, passadores do “conto do pacote” ou do “bilhete”, também compareciam às páginas de polícia, com todas as honras, nome, apelido e imagem sem disfarces.

Não se pense que os infratores juvenis ou mesmo infantis gozassem de alguma complacência por parte dos repórteres e redatores daquele tempo. Vimos num jornal de 1929 a imagem de um garoto de 12 anos, sobraçando as galinhas que havia furtado, uma em cada braço. A legenda, com nome e tudo, identificava o garoto para o resto da vida.

As mulheres também não desfrutavam de qualquer indenidade. Doméstica que furtara qualquer coisa em casa de sua patroa saiu de corpo inteiro, com o título inclemente: “A larápia Maria de Lurdes”.

É de acreditar que tais sanções extrajudiciais aplicadas pela imprensa tivessem algum efeito de prevenção contra o crime. Mas o mais provável é que obrigassem o “gatuno” ou a “larápia” a mudarem-se de cidade e irem oficiar em outras paróquias. Corrigir, não corrigiam, dada a notória tendência autodestrutiva dos delinquentes.

Tais publicações talvez ainda se tornassem título de glória no baixo mundo: “Sou importante... Meu retrato saiu no jornal!”.
*Historiador


29 de maio de 2011 | N° 16714
PAULO SANT’ANA


Metade amputada de mim

Eu ando há seis dias perplexo com o que aconteceu com o Alemão Caio, que em Torres matou o companheiro de sua ex-mulher.

O Alemão Caio, houve um tempo em que era proprietário da Pizzaria Fratello Sole, na Rua Quintino Bocaiúva, esquina da Marquês do Pombal, aonde eu ia jantar todas as noites e virei de seu cliente em seu amigo.

Pois ele agora cometeu o desatino. Matou o namorado de sua ex-mulher e ainda tentou matá-la, não o conseguindo porque chegou a polícia.

Quem me lê há muito tempo sabe que sou fixado nesse assunto de ciúme sentido por homem desprezado.

Uns anos atrás, uma mulher perseguida por seu ex-marido veio aconselhar-se comigo. Ele vinha se mostrando muito agressivo e ela temia que fosse assassinada por ele.

Eu só pude lhe dizer o seguinte: “Sabes o que está sentindo teu ex-marido? Pois, então, fica sabendo: a dor que ele está sentindo é pior que a da cólica renal, pior que a dor do parto, é a mais temível de todas as dores”.

Perder uma mulher, para um ciumento, não é nada. O insuportável para um ciumento é perder sua mulher para outro homem.

Chico Buarque descreveu essa dor:

Oh, pedaço de mim, oh, metade arrancada de mim,

Leva o vulto teu, que a saudade é o revés de um parto.

A saudade é arrumar o quarto do filho que já morreu.

Oh, pedaço de mim, oh, metade amputada de mim,

Leva o que há de ti, que a saudade dói latejada

É assim como uma fisgada no membro que já perdi.

Tristes e desgraçados são os homens que sofrem essa dor.

Essa falta, essa dor, leva alguns homens à loucura de assassinarem suas ex-mulheres ou namoradas, um crime imperdoável.

Se suas ex-mulheres se separassem deles e fossem viver para sempre sozinhas, eles suportariam galhardamente.

Eles só não suportam quando suas ex-mulheres arranjam outros homens: então eles ficam possuídos de um ciúme que se transforma ali em ódio e matam pelo que consideram esbulho possessório.

Interessante que isso não acontece com mulheres. Raramente uma mulher mata um ex-marido por ciúme. Mas homem matando mulher por ciúme acontece todas as semanas.

É da natureza psíquica do homem considerar-se “dono” da mulher. E considerar que a mulher é um objeto, uma propriedade intransferível.

E, se alerto que esses crimes passionais são graves e merecem as mais graves penas, só chamo a atenção novamente, porque sou homem, que eles nascem da pior dor que possa ser infligida a um homem.


29 de maio de 2011 | N° 16714
VERISSIMO


Pés em Roma

Os pés da Virgem de Caravaggio estavam errados, os dedões apontavam para onde não deviam

Por um breve momento, quase que entrei para a história da arte com uma descoberta alucinante. Estávamos diante da Madonna di Loreto, também conhecida como Madonna dos Peregrinos, de Caravaggio, na igreja de SantAgostino, em Roma. A Virgem com o menino no colo sendo adorada por um casal de peregrinos.

A Virgem de pé, os peregrinos ajoelhados à sua frente. Caravaggio usava gente do povo nos seus quadros religiosos e, embora não se veja seus rostos, sente-se a devoção simples do casal mal-vestido na sua atitude reverencial diante da visão.

Dizem que essa pintura de Caravaggio foi importante na iconização individual da Virgem à parte do seu papel no drama de Cristo, uma novidade na arte cristã. A própria Virgem do quadro é de uma simplicidade tocante. Não fosse o halo sobre sua cabeça e ela seria apenas uma jovem mulher descalça que passa com o filho no colo.

Mas havia alguma coisa errada no quadro. Os pés, descobri. Os pés da Virgem estavam errados. Os dedões da Virgem apontavam para onde não deviam. Como não existia, que eu soubesse, nenhuma referência a essa distração do pintor nos estudos sobre a sua obra, deduzi que eu era o primeiro a ver aquilo. Quatrocentos anos depois, eu flagrara um erro do Caravaggio!

Seria possível? Durante 400 anos ninguém notara que o dedão do pé direito da Madonna di Loreto era um equivoco anatômico? Se eu era realmente o primeiro a notar o fato, poderia começar a pensar na notoriedade que a descoberta me traria. Talvez publicasse algo a respeito, uma releitura da obra de Caravaggio, que – sendo sabidamente um mestre em anatomia – teria errado os pés da Virgem deliberadamente, para deixar uma mensagem.

Ou então se enganara mesmo. Acontece com qualquer gênio. Um dia ruim, uma ressaca (Caravaggio bebia muito) e quem se importa de que lado é o dedão? De qualquer forma, toda a história da arte pós-renascentista teria que ser revista. Eu daria palestras.

Eu... Mas interrompi meu próprio delírio. Espera um pouquinho. O dedão do pé direito da Virgem está trocado, apontando para fora quando deveria estar apontando para dentro, porque não é o pé direito da Virgem. É o pé esquerdo.

A Virgem era uma mulher que passava, portanto colocava uma perna na frente da outra. Cruzava as pernas. O pé que aparece sob sua túnica do lado direito é o pé esquerdo. Tudo explicado, pensei, decepcionado. Recolhi meu delírio e minha pretensão de corrigir 400 anos de má observação em alguns minutos, e ainda por cima com um olhar apressado de turista. Caravaggio estava certo. Se, claro, a sua Virgem está mesmo com as pernas cruzadas.

Na verdade, os pés que dominam o quadro não são os da Virgem, são os do peregrino, em primeiro plano. As solas sujas dos pés de um homem do povo ajoelhado. Foi a sujeira destes pés que a Igreja achou desrespeitosa e por isso não pagou o quadro que tinha encomendado a Caravaggio.

A maior parte dos quadros de Caravaggio foi comissionada pela Igreja, mas as solas sujas não foram aceitas. Não sei quanto tempo demorou para a objeção ser suspensa e o quadro acabar numa capela lateral da Igreja de Sant’Agostino, mas as solas sujas finalmente estão lá.

Caravaggio talvez não quisesse dizer nada com as pernas cruzadas ou não cruzadas da Virgem, mas, no caso das solas dos peregrinos, a Igreja custou mas entendeu a mensagem.


28 de maio de 2011 | N° 16713
NILSON SOUZA


O avô do pirata

Cada vez que vejo Jack Sparrow, me lembro do Capitão Blood. Há um oceano de distância entre um e outro, mas no meu imaginário eles são parentes próximos. Juntando as pontas, Sparrow – todo mundo sabe – é o afetado comandante do Pérola Negra, o navio fantasma da série Piratas do Caribe, agora em três dimensões.

Peter Blood – talvez nem todos os leitores saibam – é uma espécie de avô de Sparrow. Personagem imaginado pelo escritor Rafael Sabatini, Blood é um médico irlandês desterrado para a Jamaica como escravo, que acaba se transformando em pirata e formando com a sua tripulação de ex-cativos uma imbatível armada flutuante.

O livro é tão empolgante, que nem precisavam ter feito o filme. Sabatini, exímio contador de histórias, especializou-se em romances de aventura de capa e espada. Comecei a ler aquele livro e não pude parar mais.

Em seguida, descolei um segundo volume, A Volta do Capitão Blood. Devorei-o com a mesma avidez e depois fui para O Gavião do Mar, que segue no mesmo embalo – navegadores audazes, bucaneiros sem pátria, mas defensores de causas defensáveis, sempre com toques de coragem, humanidade e humor.

Quando o escritor morreu, em 1950, aos 75 anos, sua mulher mandou gravar na lápide do seu túmulo a primeira frase de um de seus romances mais célebres, Scaramouche: “Nasceu com o dom do riso e a crença de que o mundo estava louco”...

Me diverti muito com as loucuras do Capitão Blood e com suas manobras espirituosas para iludir vilões de todos os calibres. A literatura é um poderoso estímulo à imaginação. Um texto bem escrito tem o poder de cativar, de emocionar, de levar o leitor para o centro da história.

Por mim, nem precisavam ter feito o filme. Mas fizeram. E foi um sucesso mundial, com Errol Flynn interpretando o herói e se consagrando como galã. Mas Johnny Depp também é show no papel de Jack Sparrow. Dizem que ele se inspirou no roqueiro Keith Richards, dos Rolling Stones, para encarnar aquele pirata cheio de trejeitos. Se é verdade, ficou melhor do que o modelo.

E os roteiristas ainda meteram na sua boca frases engraçadas e inteligentes. Como essa, pronunciada no episódio do Baú da Morte: “Nos desonestos pode-se sempre confiar na desonestidade. Honestamente, os honestos é que deveriam ser vigiados, pois nunca se sabe quando farão alguma coisa realmente estúpida”.

Genial. O Capitão Blood ficaria orgulhoso do seu neto.

Lindo sábado para você. Gostoso fim de semana.


28 de maio de 2011 | N° 16713
PAULO SANT’ANA


O trambolho no meio-fio

Vejam se não é fantástico este episódio que está se desenrolando na Rua Liberdade, número 170, Bairro Rio Branco, em Porto Alegre.

Há meses, foi abandonado naquele local, evidentemente que no leito da rua, um carro de marca Mondeo.

Durante três meses, o carro ficou abandonado na rua, o dono do carro ou ladrões o abandonaram na rua.

Até aí, tudo bem. Não sei se durante esses 90 dias houve moradores da rua que telefonaram para a prefeitura para pedir a remoção do carro.

O que sei é que agora a Rua Liberdade está sofrendo reformas no seu asfaltamento.

E, para tanto, a EPTC ou a Secretaria de Obras removeu o carro para junto da calçada defronte, ficando o veículo diante de um prédio de apartamentos.

Só que, depois de reasfaltada a rua, restou no leito dela, do outro lado da origem, o carro Mondeo, como um monumento ao descuido do poder público com a ordem urbana nos logradouros.

Pasmem os leitores com o último acontecimento em torno do carro da Rua Liberdade: o condomínio defronte ao qual está estacionado o carro Mondeo agora foi intimado pelas autoridades a retirar dali, com urgência, o carro abandonado.

O raciocínio das autoridades é de que, não havendo donos para o leito da rua, o “dono” presumido será aquele proprietário de imóvel mais próximo da incidência do abandono do carro, no caso o condomínio adjacente.

Ou seja, a fina flor do burocratismo alimentado no terreno fértil da coisa pública lançou a sua sentença: o condomínio, ou seja, o prédio mais próximo do carro abandonado, será responsável pela retirada dele do leito da rua.

É um absurdo tão grande, uma idiotice tão estrepitosa como seria cobrarem de qualquer cidadão os cuidados veterinários a um cão pestilento que recém invadiu o quintal da sua residência.

Notem a estupidez a que se dedica a burocracia: certamente, quando removeram o carro de lugar na rua para asfaltá-la, ali já deveriam a autoridade ou seus agentes saber quem era o proprietário do veículo, para solicitar dele a remoção.

Não o fizeram. E, manu militari, atiraram o carro para a frente do condomínio.

Asfaltaram a rua e agora querem-na livre do trambolho indesejável. A máquina pública, no entanto, se exime de qualquer tarefa na remoção do carro, deseja que ela seja custeada pela iniciativa privada, que nada tem a ver com esse curioso impasse.

Isso se chama, em qualquer lugar civilizado, uma arbitrariedade.

Para a qual devem ter contribuído dezenas de beócios, pessoas que não raciocinam, pois se um deles só tivesse raciocinado, esse carro há muito tempo já teria sido recolhido a um depósito público.


28 de maio de 2011 | N° 16713
ANTONIO AUGUSTO FAGUNDES


Charamuscas & Picholeios

1. Grandes comemorações estão assinalando no Alegrete o centenário de nascimento de Waldemar Borges, que foi prefeito do município de 1956 a 1959. E que Prefeito! Gauchão simples, fazendeiro, ficou famoso por bordar o mapa alegretense com estradas.

E pela honestidade (aliás, não há até hoje caso de político alegretense desonesto). Mas Waldemar Borges ainda fazia mais: como ele pegou a prefeitura praticamente falida e sem crédito, para comprar qualquer coisa para o serviço público ele empenhava o seu nome pessoal, porque sabia que sua palavra valia mais que um documento escrito. Perdeu muito dinheiro assim: “Não tem dinheiro para fazer aquela ponte no Caverá, Prefeito!”. “Eu tenho. Faz que eu pago”.

E pagava mesmo. E assim gastou uma estância... Grande amigo da minha família (o Aldo meu irmão, foi secretário municipal na gestão Borges). Waldemar Borges morreu em junho de 1999, aos 88 anos. Foi um grande prefeito, mas o que ele era mesmo era um grande gaúcho.

2. O Clube Pitôco, que é quase uma confraria de aficionados ao mais tradicional jogo de cartas do Estado, elegeu e empossou a nova diretoria nesta semana: o presidente é Vitor Borges de Melo; o vice, J.M. Vargas; o primeiro secretário, Eduardo Martins; o segundo, André Goelzer; o primeiro tesoureiro, Juarez Alves; o segundo, J. Fontoura; o diretor social, Juliano Murad. Tudo gente nova, uma verdadeira renovação, diretoria executiva da qual muito se espera.

Os veteranos ficaram para o conselho deliberativo: Bráz Amarillo, João Rodrigues (o Charrua, grande declamador), Leonel Távora (presidente que deixa o cargo), Luiz Nilson, vulgo Peruca, Miguel Fernandes, o único serrano que joga truco, Nei Machado, uma lenda viva do truco, e Vicente Cardoso. Eu, que sou patrono do Clube de Truco Pitôco e que não entro em eleições, dou os mais sinceros parabéns aos novos dirigentes.

3. Recebi um livro sensacional, 1933 A Invasão de Santo Tomé, mais uma obra do escritor e pesquisador Iberê Athayde Teixeira. Por duas vezes gente de São Borja cruzou o rio Uruguai e invadiu a cidade argentina de Santo Tomé, na província de Corrientes no ano de 1933, o que custou ao governo brasileiro uma pesada indenização.

O caudilho que liderou a façanha foi Benjamin Vargas, o famoso Bejo Vargas, sobrinho de Getulio Vargas. Bejo era uma figura incrível: moço, valente, um líder inato.

Seu braço executivo era o Tenente Gregório Fortunato, que mais tarde ficaria famoso na História do Brasil como comandante da guarda pessoal do presidente Getúlio. Iberê tem um jeito gauchesco quase coloquial de escrever, absolutamente delicioso, e o episodio que ele narra era meio tabu na historiografia oficial. Parabéns, amigo Iberê.


28 de maio de 2011 | N° 16713
CLÁUDIA LAITANO


A lebre e a tartaruga

Não é muito bonito, mas é humano: as tragédias mais trágicas são as que nos dizem respeito. O terremoto do Japão parece mais nítido quando consigo distinguir um rosto em meio à multidão, e se esse rosto é parecido com o meu, ou o da minha família, aí, sim, a dor da vítima se torna concreta – e a empatia se estabelece mais intensamente.

(Digo que não é bonito porque um dos mais caros ideais humanistas é exatamente o da fraternidade, essa nobreza de atos e sentimentos que faz com que a gente reconheça e se solidarize com qualquer tipo de sofrimento humano e não apenas com aqueles que se aproximam perigosamente dos nossos calcanhares.)

Pois entre tantos crimes violentos que realizam a fantástica proeza de transubstanciar o sangue das vítimas em pilhas de papel velho nos arquivos emperrados da Justiça brasileira, nenhum me toca mais pessoalmente do que o assassinato da jornalista Sandra Gomide, em 2000.

E aqui peço desculpas a todas as mulheres, e não são poucas, com histórias parecidas que não eram jornalistas, como eu, nem editoras de um jornal, como eu, nem mais ou menos da minha idade e classe social. Gostaria de sentir o barateamento da vida delas como sinto o dessa jornalista que eu não conheci pessoalmente, mas com a qual me identifico como se tivéssemos sido amigas de infância.

Li em algum lugar que existem cálculos que demonstram quanto vale uma vida em diferentes países, levando-se em conta uma série de variáveis, da chance que essa pessoa tem de chegar a uma determinada idade à projeção do patrimônio que ela seria capaz de acumular ao longo do tempo.

Se o valor da vida de uma mulher da minha idade, da minha profissão e, principalmente, da minha nacionalidade pode ser medido pelo “índice Sandra Gomide de impunidade”, estou – estamos – valendo muito pouco, quase nada. Não é uma constatação muito agradável.

Onze anos depois de matar a ex-namorada Sandra Gomide e cinco depois de ter sido condenado, o jornalista Pimenta Neves foi preso esta semana. Sua defesa usou pelo menos 24 recursos para mantê-lo fora da prisão, apelando até mesmo para a Lei de Imprensa – o que não deixa de ser macabramente irônico, levando-se em conta que a vítima também era jornalista.

Muitos juristas, inclusive o presidente do STF, Cezar Peluso, acreditam que a demora em cumprir a condenação de Pimenta Neves é a maior prova de que a Constituição precisa ser alterada urgentemente.

Não concordo com o ditado que diz que a justiça tarda, mas não falha. Tardar e falhar são a mesma coisa – e neste caso resultam em um enorme constrangimento nacional.

Quis o acaso que a prisão tardia de Pimenta Neves acontecesse na mesma época da prisão instantânea do poderoso ex-diretor do FMI por uma denúncia de agressão sexual. O contraste entre a lebre e a tartaruga é tão evidente, e tão vergonhoso, que qualquer comentário soa redundante.

sexta-feira, 27 de maio de 2011


Jaime Cimenti

Pena de morte para Ronald McDonald?

Antigamente quem dava palpite sobre tudo o que era possível e imaginável e era especialista em generalidades eram os cronistas de jornal. Hoje todo mundo dá pitaco geral o tempo inteiro, direto, no bar, em casa, na internet, em todo canto.

Olha só, centenas de médicos norte-americanos condenaram à morte o famoso palhaço fictício Ronald McDonald que, comenta-se, mora num quarteirão com queijo. Pois é, os doutores acham que o palhaço quase tão famoso quanto o Papai Noel vende comida com muito sal, muita gordura, açúcar e um monte de calorias, que a obesidade infantil está complicada e tal, que é preciso melhorar a qualidade de vida etc.

Que culpa tem o Ronald se os gordinhos comem demais?

O McDonalds mandou dizer que não concorda com os doctors e que o Ronald, que por sinal é parecido com o saudoso e imortal mímico francês Marcel Marceau, vai continuar vendendo os lanches mais conhecidos do planeta.

A empresa tem preocupações com a saúde, com o câncer infantil, com a ecologia e vem fazendo modificações em embalagens e cardápios. De repente, uma saída para o impasse seria proporcionar uma dieta para o Ronald, mandando-o para algum spa na França. Ele realmente é meio gordinho, tem um baita bundão e, principalmente, está com centimetragem exagerada na área abdominal. Não sei se ele perderia a graça com menos peso.

O Jô Soares, depois do adelgaçamento, até não perdeu, não acham? Aliás, quem acha gordura engraçado pode curtir as vitrines dos balcões dos açougues e dar sonoras gargalhadas. Resta saber se, para caso de ser aplicada a pena de morte a Ronald, seriam condenados também Birdie, Papaburger e Shaky. Como seria a execução?

Eles receberiam uma injeção letal de quatro quilos de açúcar, teriam que levar na veia vinte litros de milk-shake cada um ou teriam que comer duas cadeiras elétricas gigantes inteiras feitas de chocolate cobertas com chantilly, marshmellow e M&Ms? Seria bem melhor se os amigos de Ronald fossem juntos para o spa?

Ou será que Ronald e os amigos têm direito a serem roliços como baleias, ursos, focas e um monte de gente que anda por aí? Prefiro nem pensar na tristeza de assistir Birdie, Papaburger e Shaky no eventual velório do Ronald. Será que ia ter mais choro que no velório da Lady Di e do Papa João Paulo II? Saúde! Campai! Longa vida, Ronald! Te cuida! Take care of yourself! Ah, que tal uma peruca para o palhaço Carequinha?

Uma linda sexta-feira para você. Gostoso fim de semana

Jaime Cimenti

Retrospectiva da primeira década do século XXI

Dez anos que encolheram o mundo, do jornalista e escritor Daniel Piza, colunista de O Estado de S. Paulo e autor de Machado de Assis - um gênio brasileiro; Contemporâneo de mim - dez anos da coluna Sinopse; Aforismos sem juízo e Amazônia de Euclides é muito mais do que uma simples retrospectiva dos primeiros anos de nosso século XXI.

Na coletânea de artigos, dividida em cinco grandes partes: política e economia; cultura e comportamento; ciência e tecnologia; meio ambiente, metrópoles e esportes, Piza nos ajuda a entender o atentado de 11 de Setembro de 2001 em Nova Iorque e seus múltiplos desdobramentos como, por exemplo, a guerra contra o terrorismo desencadeada pelos Estados Unidos.

Piza analisa quais foram os avanços do governo Lula e por que nosso País é visto como um dos mais promissores do planeta. O autor fala do genoma humano e de novas compreensões sobre o ser humano, de novas tecnologias da informação e, principalmente, mostra como as distâncias tornaram-se praticamente inexistentes e como o mundo encolheu, ou, como ficou plano, como escreveu Thomas Friedman.

Quem quiser pensar, refletir e analisar sobre o que ocorreu de importante nestes últimos dez anos tem o livro de Piza como ótimo instrumento para tanto. Não é fácil, por vezes, entender as novas configurações políticas e econômicas e o novo panorama completo do cenário mundial, com todas as mudanças nas artes, no comportamento, na ciência e na tecnologia. O mundo nunca mudou tanto em tão pouco tempo.

Quem não está no mundo apenas a passeio e quer entender como andam e como andarão as coisas está convidado a dar uma parada na correria diária e curtir os textos enxutos, informados e diretos de um dos jornalistas mais antenados e lidos do Brasil. Barack Obama, citado na introdução, resume o espírito do livro de Piza.

Ele disse: um homem pisou na lua, um muro caiu em Berlim, um mundo foi conectado pela nossa ciência e pela nossa imaginação. Não vivemos apenas numa “aldeia global”, como escreveu Marshall McLuhan, vivemos em convívio, influência e comunicação inéditos, com ganhos e perdas, em especial pelas complexidades que andam por aí.

Tudo lembra uma frase de um personagem de Erico Verissimo, o peão analfabeto, mas sábio, Liroca, em O Tempo e o Vento, que repetia: “eta mundo velho sem porteira!” Nas páginas finais de cada parte da obra, quadros com cronologia dos principais acontecimentos do período, relacionados com os temas. Leya, 224 páginas, www.leya.com.br.


27 de maio de 2011 | N° 16712
PAULO SANT’ANA


O espaguete à carbonara

Tenho a vaidade de conhecer a natureza feminina, tanto quanto a conhece com profundidade o poeta Chico Buarque de Hollanda.

Por isso é que tenho a certeza de que estou sendo alvo de assédio sexual por parte de uma colega de ZH.

Vão lá já por uns oito meses que ela me convida para comer em sua casa um espaguete à carbonara.

Volta e meia nos encontramos e ela repete o convite. Inicialmente era para um talharim al pesto.

Ponderei que não gosto nem de talharim nem de molho pesto. Eu só iria se fosse espaguete à carbonara.

Passou uma semana e a minha colega veio toda faceira me anunciar que tinha arranjado uma receita do espaguete à carbonara e que eu podia marcar a noite em que iria saborear, na casa dela, a iguaria.

Fiquei de manejar as minhas datas vagas, e alguns dias depois ela me cobrou novamente de ir à casa dela para o jantar.

Ontem foi uma data decisiva. A minha colega me cobrou com veemência que eu marcasse a data para ir devorar o seu espaguete à carbonara.

Fumei um cigarro para respirar e pronunciar a minha decisão. Eu ando numa fase da vida em que, quando quero respirar, puxo um cigarro para fumar. É a mesma coisa que a gente beber vinho só porque tem de dirigir dali a pouco.

“E daí?”, perguntou ela com um grito.

Eu expliquei que tinha prometido a nosso colega Moisés Mendes que, no dia em que viesse a comer espaguete à carbonara, o levaria junto, ele também adora esse prato.

Pensei que com isso, já que calculo que minha colega tem apenas como pretexto o espaguete, o que ela quer mesmo é ter um romance comigo e pretende por isso me ter sozinho com ela em sua casa, eu iria sair de fininho do convite.

Para minha surpresa, minha colega não só aceitou a companhia do Moisés, de quem ela é amiga (e aí foi o meu erro), como também disse que já tinha comprado o vinho para regar o jantar: Cheval Blanc, tinto francês, uma delícia.

Mas minha colega, que, diga-se de passagem, é uma pessoa apetitosa tanto física quanto intelectualmente, me disse por fim, depois de tudo combinado para o jantar, o seguinte: “Só tem uma condição. Vamos jantar eu, tu e o Moisés em minha casa. Mas, duas horas antes de tu ires embora, o Moisés vai se retirar. Para deixar bem pactuado: o Moisés sairá da minha casa duas horas antes de ti”.

Bingo! Eu tinha acertado na mosca, agora não restava mais nenhuma dúvida: minha colega estava cometendo assédio sobre mim.

Marquei a data para a semana que vem, mas estou queimando neurônios para saber qual a desculpa que vou arranjar para não ir.

Já decidi que não vou. E ando tão mergulhado na abstinência sexual, que não vou a esse jantar mas já estou amargando desde já o remorso de não comer aquele espaguete à carbonara.


27 de maio de 2011 | N° 16712
LUIZ ANTÔNIO ARAUJO - Interino


Um imenso Portugal

O governador Tarso Genro causou furor ao afirmar, em Zero Hora, que o Rio Grande do Sul corre o risco de se tornar “um imenso Portugal” caso não seja aprovado pela Assembleia o pacote de aumento de arrecadação. Referia-se o governador ao fato de que em nenhum lugar o colapso da economia mundial iniciado em 2007 teve consequências mais dramáticas do que em países mediterrâneos como Portugal e Grécia.

Primas pobres da grande família da União Europeia, essas pequenas nações carregam o fardo da industrialização precária e tardia, do atraso na modernização da agricultura e dos baixos índices de desenvolvimento humano em comparação aos vizinhos do Norte.

Desemprego em massa, confisco de direitos sociais e instabilidade política têm sido as faces mais visíveis do drama mediterrâneo. Em qualquer metrópole da Europa Ocidental, pode-se assistir ao drama da imigração em versões portuguesa ou grega. A chegada da crise à Irlanda (outro megaexportador de mão de obra imigrante) fez surgir o termo Pigs, sigla de Portugal, Irlanda e Grécia, em alusão aos Brics.

Não me interessa aqui discutir o prognóstico econômico-financeiro do governador, mas sublinhar a trajetória curiosa da expressão “imenso Portugal”. A ideia de que a colonização portuguesa assumiu a forma de um império ultramarino é relativamente recente na historiografia. Deve-se especialmente a um historiador britânico, Charles Boxer (1904 - 2000), ainda pouco traduzido no Brasil.

Militar de carreira, Boxer assinalou que Portugal e suas colônias constituíram uma rede social interdependente nos séculos 17 e 18. Talvez a noção de unidade subjacente à ideia de império tenha parecido natural a um homem acostumado a servir sob a bandeira britânica.

Boxer pôs a nu o esforço descomunal de um país diminuto e em conflito constante com os vizinhos para estreitar os laços com as colônias, inclusive criando a certa altura um Conselho Ultramarino como órgão administrativo. Para o padre Vieira, o Brasil era “a terra que está além e da outra banda da Etiópia” citada pelo profeta Isaías. Portugal seria o espelho no qual as possessões atlânticas, especialmente a maior delas, deveriam se mirar ao projetar seu futuro.

Com a descolonização, a imagem no espelho se inverteu. Portugal passou a representar a herança maldita, a metrópole à qual eram atribuídos o atraso econômico, o patrimonialismo e o preconceito. A exceção foi o sociólogo Gilberto Freyre, que chegou a louvar no final da vida, sob os auspícios da ditadura salazarista, “o mundo que o português criou”.

“Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal / Ainda vai tornar-se um imenso Portugal”, cantava o colonizador na peça Calabar, de Chico Buarque e Ruy Guerra. Ao fundo, um coro ecoava: “Ainda vai tornar-se um imenso canavial”.

Talvez o governador tenha sido a primeira personalidade brasileira a empregar a expressão “imenso Portugal” em um novo sentido: não mais a potência marítima nem a metrópole voraz e decadente, mas o país pobre, falido e em apuros.

Pela primeira vez, o Brasil pode olhar Portugal com a superioridade da criatura que superou o criador, não para expressar rancor, como o androide Roy de Blade Runner diante do magnata Tyrell, e sim orgulho e alívio por não ter compartilhado o mesmo destino. Resta torcer para que os portugueses encontrem uma saída para seu infortúnio.

quinta-feira, 26 de maio de 2011



26 de maio de 2011 | N° 16711
FIM DA POLÊMICA


Kit anti-homofobia é suspenso

Decisão da presidente Dilma foi tomada após parlamentares da bancada religiosa ameaçarem obstruir pauta no Congresso

Depois de se reunir com deputados da chamada bancada religiosa, a presidente Dilma Rousseff determinou ontem a suspensão da produção e distribuição do kit anti-homofobia em planejamento no Ministério da Educação. Todo material do governo que se refira a “costumes” terá de passar por uma consulta aos setores interessados da sociedade antes de serem publicados ou divulgados.

Segundo o ministro Gilberto Carvalho (Secretaria Geral), Dilma considerou o material do MEC “inadequado” e o vídeo “impróprio para seu objetivo”.

Amanifestação ocorreu na esteira de uma reunião de Carvalho com a bancada evangélica da Câmara. O grupo de parlamentares chegou a ameaçar o governo com obstrução da pauta no Congresso, colaborar com assinaturas para convocar o ministro Antonio Palocci (Casa Civil) a se explicar sobre sua evolução patrimonial e propor uma CPI para investigar o MEC. Na terça-feira, no plenário, o deputado Anthony Garotinho (PR-RJ) chegou a pedir a demissão do ministro da Educação, Fernando Haddad.

Os ministros da Educação e da Saúde, Alexandre Padilha, serão chamados ao Planalto para conversar sobre o caso.

Os parlamentares evangélicos já haviam transmitido a indignação da presidente sobre o material que trata de homofobia. Os deputados Garotinho, Ronaldo Fonseca (PR-DF) e o líder do PR na Câmara, Lincoln Portela (MG), consideraram que o material se tratava de “uma apologia ao homossexualismo”.

Disseram que “trazia cenas e desenhos de sexo anal e oral”, com “uma didática muito agressiva” e se mostraram “preocupados com a maneira virulenta com que esse material está sendo apresentado”.

Apesar da pressa do Planalto em receber os parlamentares e atender ao pedido de suspensão das publicações e dos vídeos, Gilberto Carvalho disse que “não houve recuo” do governo em relação à política de discussão sobre homofobia e que “não tem toma lá, dá cá”.

Para o ministro, os parlamentares das bancadas religiosas anunciaram que não iriam mais promover a convocação do ministro Palocci porque acharam que essa era a atitude mais conveniente, e não por terem sido atendidos pelo governo.

Os parlamentares, na saída do Planalto, no entanto, avisaram que não iriam mais ajudar a convocar Palocci, pelo atendimento do pleito sobre o corte na divulgação do material sobre homofobia.


26 de maio de 2011 | N° 16711
LETICIA WIERZCHOWSKI


No tempo do afiador de facas

Cruzava por uma rua com o meu filho mais velho quando ouvimos um barulhinho característico – raro hoje em dia –, mas que evocou a minha infância. Foi assim meio sem pensar que eu disse: “Olha o afiador de facas!”. Meu filho olhou-me com espanto: afinal, quis saber ele, eu estava falando do quê?

Hoje em dia, quase ninguém mais espera o afiador de facas. Creio que a maioria das pessoas simplesmente compra uma faca nova quando a sua perde o fio, ou então as facas de hoje possuem um “fio eterno”. Seja lá como for, é raro a gente ouvir a musiquinha do afiador, como a gente ouvia antes, quando eu era menina – aquelas notas entravam pela janela, e lá se ia a minha mãe pela porta.

Ante o espanto do meu menino, fiz uma pequena e saudosa digressão sobre a minha infância. Naquele tempo, havia o afiador de facas, havia o moço que vendia casquinhas (outro barulhinho típico, mas, dessa vez, eram as crianças que ficavam eufóricas), havia o vendedor de puxa-puxas.

Havia, de fato, a rua, e a nossa interação diária e pacífica com a rua onde a gente morava. Todo mundo brincava na calçada depois da aula, e a gente ganhava nossas próprias moedas para comprar casquinhas e puxa-puxas. Meu filho ouviu a história com um sorriso, um lampejo de curiosidade perpassou seus olhos bonitos, e voltamos, ambos, à vida real.

Ele quer ganhar um negociozinho eletrônico no seu aniversário, e reatamos, ainda na rua, nossas tratativas a respeito. Dentro de mim, no entanto, confesso que ficou uma tristeza... Não que meu menino tenha demonstrado inveja da minha infância pendurada no portão, mastigando puxa-puxas.

Mas, afinal, quem pode sentir saudades daquilo que não conhece? Jogar os filhos criados nas metrópoles brasileiras na calçada, com uma bola e algumas horas de liberdade, pode soar-lhes tão estranho como abrir, no meio da floresta, a gaiola de um bichinho criado em cativeiro.

Hoje, eles têm a internet, têm o iPad, têm computadores nas salas de aula, têm os videogames, os DVDs, os celulares. Eles têm o mundo num toque de dedos. Trancados em casa, com suas portarias 24 horas, com as cercas elétricas e o diabo a quatro, eles podem ir a qualquer lugar, e usam e abusam da virtualidade. Mas nós… Nós tínhamos a rua, a calçada, as praças. Nós tínhamos o aqui e o agora.

Olhei meu filho uma vez mais, seus olhinhos brilhavam na expectativa do presente. Seu aniversário está chegando, e ele é um garoto inteligente e estudioso. Pratica esportes no clube, mas nunca jogou bola na rua. Enfim, talvez tudo esteja certo – e as puxa-puxas eram mesmo o paraíso da cárie dental... Afinal de contas, nós humanos sempre fomos assim: metade nostalgia do passado, metade ânsia de futuro.


26 de maio de 2011 | N° 16711
PAULO SANT’ANA


A sina policial

Eu às vezes fico pensando no meu azar: não sei por que o Estado em que nasci é o que paga menos aos seus funcionários públicos e o clube pelo qual torço é justamente aquele que maiores dificuldades financeiras tem para formar um time à altura de sua tradição.

Neste caso do projeto que o governador Tarso Genro está enviando à Assembleia Legislativa, referente à previdência dos funcionários públicos gaúchos, recebi de várias entidades representativas de brigadianos muitas mensagens contrárias.

Mas o mérito do projeto esta coluna já discutiu. O que me importa agora é que os brigadianos declaram que não existe no Brasil nenhuma Polícia Militar que pague menos a seus servidores médios que a Brigada Militar.

Então, vejam que, entre 27 Estados brasileiros, os PMs que percebem os menores vencimentos são os gaúchos.

Porque, durante quase um século, os vencimentos dos brigadianos e, por conseguinte, dos policiais civis foram sempre miseráveis.

Eu sei disso porque meu pai foi oficial da Brigada Militar no século passado e o que percebia como salário era infamante: não dava para alimentar e vestir os seus filhos.

Foi sempre assim, gerações e gerações de policiais militares foram se sucedendo e nenhum governo pagou salários dignos aos brigadianos.

E agora me chega a notícia, pelas mãos dos próprios brigadianos, de que eles são os PMs pior pagos no Brasil.

Que sina! Que cruz!

Não dá para crer que Estados pobres como Alagoas, Paraíba e Piauí paguem melhor seus policiais que o Rio Grande do Sul.

Que desvario isso!

O tenente-coronel José Riccardi Guimarães, presidente da Associação dos Oficiais da BM, tem dito em seus discursos que os PMs gaúchos estão sempre com fome ou sono: os que não fazem bico estão com fome, os que fazem bico estão com sono e os que não fazem bico e não estão com fome não são bem encarados porque devem estar obtendo recursos de maneira ilícita.

Ninguém preconiza que os policiais gaúchos possam algum dia vir a ser ricos ou se equiparar às classes melhor remuneradas dos servidores estaduais.

Mas é brutal que, ao entrar para a Brigada Militar ou para a Polícia Civil, os policiais façam um voto de miséria.

Basta ser policial no RS para enfrentar as piores condições de vida impostas pelo salário indigno e a sobrevivência aviltante.

E, com essa inflação galopante que reajusta todos os dias os preços nos gêneros alimentícios e de sobrevivência básica, é urgente que o governo estadual se programe para conceder aumento de vencimentos aos policiais gaúchos.

Ou se prepare para a mais dramática crise salarial que já (sempre) viveram os nossos policiais.


26 de maio de 2011 | N° 16711
L. F. VERISSIMO


A quem interessa

Seguindo a velha regra que já ajudou a identificar tantos culpados, na ficção e na vida – pergunte sempre a quem mais interessa o crime –, seria possível imaginar o próprio Sarkozy disfarçado de camareira entrando naquele quarto para tentar o Strauss-Kahn. Que, como se sabe, assedia sexualmente qualquer coisa com duas pernas.

A ninguém aproveitou mais a desmoralização do provável candidato socialista a sua sucessão do que a Sarkozy. Mas as teorias conspiratórias sobre uma possível armadilha para o grande Kahn, que já eram improváveis, não resistiram às provas coletadas e não parece haver mais dúvidas (pelo menos no momento em que escrevo) de que a camareira foi forçada a fazer o que não queria, como tantos países emergentes constrangidos pelo FMI. E que o Sarkozy não estava por perto.

As multidões que protestam nas ruas da Espanha contra os políticos em geral e as medidas de austeridade do governo em particular (nos moldes das impostas pelo FMI a economias subdesenvolvidas e que o Strauss-Kahn criticava quando era do outro lado), como as manifestações recentes na Inglaterra e na França, são uma reação à proposta indecorosa de que a maioria sacrifique-se para resolver uma crise da qual não é culpada.

No caso do estouro das finanças que há dois anos reverbera pelo mundo, está claro quem são os culpados e a quem aproveita o crime.

O capital financeiro não precisa sacrificar nada e ainda é subsidiado, e cria dificuldades para resolver as crises com dívidas incontroláveis que assolam a Espanha e outros países – com as quais os bancos também lucram.

Uma curiosidade liga as manifestações na Europa com as revoltas nos países árabes. Nos dois casos, pelo que se ouve, são as redes sociais que estão convocando e organizando os movimentos populares.

Quando se esperava que o resultado da interligação do mundo por uma malha eletrônica fosse um enclausuramento geral – todo mundo preso à sua telinha –, houve o contrário. A internet botou todo o mundo na rua!

quarta-feira, 25 de maio de 2011



25 de maio de 2011 | N° 16710
ARTIGOS - Marco Maia*


Parceria em tecnologia

O incremento das relações bilaterais entre o Brasil e a Coreia do Sul oferece ao Brasil e ao Rio Grande do Sul, em particular, a oportunidade de estabelecermos novos modelos de parcerias nos quais o intercâmbio de conhecimento tecnológico esteja no centro desses acordos.

Em recente viagem à Coreia, onde pela primeira vez o Brasil participou da reunião do G-20 Parlamentar – encontro dos Legislativos de 20 países que, juntos, somam mais de 85% do PIB mundial –, constatamos a disposição dos coreanos em firmar acordos com o Brasil nas mais diversas áreas, incluindo a transferência de tecnologias.

Este interesse fica evidente no entusiasmo com que se referem ao atual nível de desenvolvimento econômico brasileiro (aliás, sua admiração e curiosidade pelos fatores de sucesso do governo do ex-presidente Lula está presente em qualquer conversa que trate sobre o Brasil).

Os coreanos veem em nosso país um parceiro capaz de compartilhar um mercado consumidor com poder de compra e que detém riquezas naturais capazes de sustentar um crescimento econômico de longo prazo, o que gera segurança para a instalação de suas indústrias em solo brasileiro.

Neste momento, em que o governador Tarso Genro prepara-se para liderar uma missão que levará empresários gaúchos àquele país, atentarmos para acordos que incorporem conhecimento tecnológico à nossa indústria é essencial e pode significar o alvorecer de uma nova fase para a economia do nosso Estado.

Os coreanos estão dispostos a investir e a compartilhar sua experiência em setores vitais para o desenvolvimento de nossa infraestrutura, como o metalmecânico (a capacidade produtiva de sua indústria automobilística e naval é impressionante, assim como a de suas fábricas de trens de alta velocidade e metrôs) e o eletrônico (seu domínio das tecnologias da informação, por exemplo, os colocam entre os líderes mundiais nesse mercado).

Para absorvermos parte da experiência e do conhecimento coreano é fundamental uma mudança da postura passiva de meros anfitriões de indústrias que nos oferecem produtos acabados ou de exportadores de commodities para uma atitude ativa, em que a absorção de tecnologia seja condição primária.

Isso representará um salto de qualidade para nossa indústria, agregando valor a nossos produtos, impulsionando novos ganhos e gerando melhores condições de trabalho e de vida para os gaúchos.

*Deputado federal (PT-RS), presidente da Câmara dos Deputados

Lindo dia para você. aproveite. Hj não há crônicas da Martha no ZH


25 de maio de 2011 | N° 16710
ARTIGOS - Eduardo K. M. Carrion*


Ativismo judiciário

Arecente decisão do STF sobre união homoafetiva reavivou entre nós o debate em torno do papel do Poder Judiciário no que se refere ao processo de interpretação/aplicação da lei. Falou-se mesmo em “Constituição ‘conforme’ o STF”. Nos últimos anos, o STF e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sobretudo, têm sido alvo de críticas reiteradas em decorrência de julgamentos sobre matérias controvertidas.

Em questão a própria supremacia da Constituição e o status do Judiciário como instrumento dessa supremacia. O debate já é antigo em outros quadrantes. Nos Estados Unidos, por exemplo, desde o século 19, opõem-se “constitucionalistas”, que priorizam o princípio da constitucionalidade, e “democratas”, que realçam o princípio da representação. A atualidade dele entre nós decorre em grande parte dos novos referenciais da Constituição de 1988.

A confluência entre supremacia constitucional afirmada e procedimentos de controle da constitucionalidade das leis aperfeiçoados muda em grande parte o papel do Poder Judiciário, impondo, por vezes, um ativismo judiciário inusitado até então.

Se falássemos em modelos ou “tipos ideais” de magistrado, como Dworkin pretendeu fazê-lo, o STF estaria hoje mais próximo de um Juiz-Hércules ou de um Juiz-Hermes do que de um Juiz-Júpiter.

Simplificadamente, Juiz-Júpiter, juiz estritamente legalista, confinando-se a uma atitude mais passiva, predominante no Estado liberal; Juiz-Hércules e Juiz-Hermes, mais próprios do Estado social, que, embora atuantes nos limites da lei, assumem uma função mais ativa no exercício da jurisdição, inclusive de regulação social ou de mediação social, com nuanças próprias entre eles. Não se trata de modelos exclusivos, podendo haver perfeitamente a convivência entre eles, dependendo do momento e da matéria jurídica.

Remanesce de qualquer forma o risco do “governo dos juízes”, que deve ser igualmente evitado. Mas a velha lição de O Federalista, obra clássica da literatura política, permanece atual: “Todavia, esta conclusão não deve significar uma superioridade do Judiciário sobre o Legislativo.

Somente supõe que o poder do povo é superior a ambos; e que, sempre que a vontade do Legislativo, traduzida em suas leis, se opuser à do povo, declarada na Constituição, os juízes devem obedecer a esta, não àquela, pautando suas decisões pela lei básica, não pelas leis ordinárias”.

*Professor titular de Direito Constitucional da UFRGS e da FMP


25 de maio de 2011 | N° 16710
DIANA CORSO


Mães de pequenas misses

Semana passada, nos Estados Unidos, uma mãe perdeu a guarda da filha por ter declarado num programa de televisão que fazia aplicações de botox na sua pequena de 8 anos, visando a suprimir rugas (sic). Como se vê, a paranoia do envelhecimento exige ações cada vez mais precoces! O objetivo da senhora era tornar a menina competitiva em concursos de beleza infantis.

Esse tipo de mulher protagoniza um popular programa de tevê a cabo Pequenas Misses (Discovery Home & Health), um reality show que acompanha a trajetória obstinada de mães para transformar crianças em versões da Barbie, com maquiagem pesada, penteados improváveis, manicure e até depilação.

As entrevistadas quase sempre são mães obesas, que apresentam visíveis sinais de abandono pessoal. Elas organizam sua vida em torno dos tais certames, nos quais suas bonecas de corda as representam, pequenos avatares, marionetes a serviço da frustração materna.

É fácil indignar-se e ficar contente com a merecida punição de uma delas, pois é explícita no programa a monstruosidade dessas destruidoras de infância. Partilho desses sentimentos. Porém, em sua coluna da Folha de S. Paulo, corajosamente, Rosely Sayão se pergunta: “Será que os pais do programa são muito diferentes daqueles que enchem a agenda dos filhos com aulas de todos os tipos?

Dos que procuram definir o futuro dos filhos do modo como eles arquitetam?”. É diferente, conclui, mas sabemos que é evocativo.

A seu modo, essas senhoras cujo próprio corpo abandonou a cena são abusadoras. Possuem com suas fantasias o corpo das filhas como um pedófilo que goza em preencher com seus desejos sexuais o vazio da criança que ainda desconhece os dela. Em ambos casos temos o adulto reinando absoluto, e a infância transformada em objeto passivo.

Mas por que esse circo de horrores tem audiência garantida? Horroriza e fascina essa cena de submissão infantil porque de algum modo nos identificamos com seus protagonistas. Na verdade sabemos que é inevitável na criação de um filho que os pais acabem projetando sobre ele seus desejos e frustrações. Não há nada anormal nisso, ele precisa confrontar-se com essas forças, mas apenas enquanto os parâmetros que usará para construir seus próprios ideais.

Assistimos aliviados, pois nos salvamos dessa! Frente a essas mães totalitárias a nossa é um exemplo de democracia! Mas também nos hipnotiza, pois quem não desejou tornar-se a encarnação das fantasias da mamãe? Assim teríamos a garantia do seu amor? A mãe da pequena miss representa nossos piores pesadelos e inadmissíveis desejos.


25 de maio de 2011 | N° 16710
PAULO SANT’ANA


Impunidade

Uma turma do Supremo Tribunal Federal mandou ontem que fosse imediatamente recolhido à prisão o jornalista Pimenta Neves, que matou no ano 2000 a sua namorada, a também jornalista Sandra Gomide.

Ele executou pelas costas a sua namorada. Foi um assassinato covarde e premeditado, além de que teve motivo fútil.

Só em 2006, seis anos depois, foi condenado a 15 anos de prisão.

Por estranha causa, ele nunca esteve preso depois de condenado.

Isso só pode ter sido omissão dos juízes que julgaram seus recursos.

Não tem explicação uma coisa dessas. Aqui, ao nosso redor, há casos de réus de homicídio que vão para trás das grades durante anos, em prisão somente preventiva, sem condenação.

Com Pimenta Neves se dá o contrário. Está há cinco anos condenado e nunca ficou só um dia na prisão.

Nunca vi tanta injustiça a depor contra a Justiça.

E, por ter mais de 70 anos, em breve seu crime prescreverá e ele vai acabar não cumprindo mais de um ou dois anos de prisão.

Um escândalo jurídico nacional.

Há muito tempo não me acontecia, mas muito já me aconteceu no passado.

Ocorre que ontem duas pessoas se comunicaram comigo, suplicando que eu lhes arrumasse um emprego.

Perguntei a uma delas: o que te levou a me procurar?

Ela respondeu que eu sou uma pessoa muito bem relacionada, que alguém das minhas relações podia empregá-la.

Para esse tipo de coisa sou completamente atrapalhado. Não sei como fazer. Não sei nem como pedir a alguém que arrume emprego para outra pessoa.

Mas fico penalizado com a situação dessa mulher.

Ela está há tempo sem emprego, mas foi durante mais de 20 anos secretária de médicos. Ou seja, ela é pessoa que tem experiência, tem currículo.

Mas, quando perdeu o último emprego, não encontrou mais nenhuma ocupação.

Deve ter idade em torno de 47 anos, conhecia-a justamente nos consultórios médicos.

E, porque a conheci é com ela tive cordiais relações, é que me apiedo.

Ela me escreveu que, desesperada, andou até planfleteando junto a um prédio do INSS, propaganda para um advogado, quando ganhava R$ 20 por dia.

Eu não sei o que fazer, mas ela acabou jogando sobre mim uma cruz: esta notícia de que ela está desesperada atrás de uma colocação.

O que eu acho digno nesse tipo de pessoa é que ela não está pedindo dinheiro, não está rogando outra ajuda que não seja um emprego.

Ou seja, quer trabalhar. Será demais e indevido querer trabalhar para seu sustento?

E todas as portas se fecham para ela. Como se sentirá uma pessoa neste caso? Amassada, é a resposta. Quase louca de impotência, vendo a miséria bater todos os dias à sua casa.

Imagino quais tenham sido as reações dela, a partir de que até para mim recorreu, lembrando-se de que era minha conhecida.

Mas eu me culpo por não ter solução para ela.

E será que alguém tem? Ela diz que aceita qualquer serviço.

terça-feira, 24 de maio de 2011



Deus na Janela

Havia dois irmãos que visitavam seus avós no sítio, nas férias. Felipe, o menino, ganhou um estilingue para brincar no mato. Praticava sempre, mas nunca conseguia acertar o alvo. Certa tarde viu o pato de estimação da vovó... Em um impulso atirou e acabou acertando o pato na cabeça e o matou. Ele ficou chocado e triste!

Entrou em pânico e escondeu o pato morto no meio da madeira! Beatriz, a sua irmã viu tudo mas não disse nada aos avós.

Após o almoço no dia seguinte, a avó disse: "Beatriz, vamos lavar a louça" Mas ela disse: " Vovó, o Filipe me disse que queria ajudar na cozinha". E olhando para ele sussurrou: "Lembra do pato?" Então o Felipe lavou os pratos.

Mais tarde o vovô perguntou se as crianças queriam pescar e a vovó disse: "Desculpe, mas eu preciso que a Beatriz me ajude a fazer o jantar." Beatriz apenas sorriu e disse, "Está bem, mas o Filipe me disse que queria ajudar hoje", e sussurrou novamente para ele, "Lembra do pato?"

Então a Beatriz foi pescar e Filipe ficou para ajudar. Após vários dias o Filipe sempre ficava fazendo o trabalho da Beatriz até que ele, finalmente não agüentando mais, confessou para a avó que tinha matado o pato.

A vovó o abraçou e disse: "Querido, eu sei... eu estava na janela e vi tudo, mas porque eu te amo, eu te perdoei. Eu só estava me perguntando quanto tempo você iria deixar a Beatriz
fazer você de escravo!"

Qualquer que seja o seu passado, ou o que você tenha feito... (mentir, enganar, seus maus hábitos, ódio, raiva, amargura, etc ).... seja o que for... você precisa saber que Deus estava na janela e viu tudo como aconteceu. Ele conhece toda a sua vida ... Ele quer que você saiba que Ele te ama e que você já está perdoado.

Ele está apenas querendo saber quanto tempo você vai deixar o diabo fazer de você um escravo. Deus só está esperando você pedir perdão, Ele não só perdoa, mas Ele se esquece.

É pela graça e misericórdia de Deus que somos salvos. Vá em frente e faça a diferença na vida de alguém hoje. Lembre-se sempre: Deus está na janela e sabe de tudo! "A vontade de Deus nunca irá levá-lo aonde a Graça de Deus não irá protegê-lo."


Não estamos sozinhos!

Uma garotinha foi para o quarto e pegou um vidro de geléia que estava escondido no armário e derramou todas as moedas no chão. Contou uma por uma, com muito cuidado, três vezes. O total precisava estar exatamente correto. Não havia chance para erros.

Colocando as moedas de volta no vidro e tampando-o bem, saiu pela porta dos fundos em direção à farmácia Rexall, cuja placa acima da porta tinha o rosto de um índio.

Esperou com paciência o farmacêutico lhe dirigir a palavra, mas ele estava ocupado demais. A garotinha ficou arrastando os pés para chamar atenção, mas nada. Pigarreou, fazendo o som mais enojante possível, mas não adiantou nada. Por fim tirou uma moeda de 25 centavos do frasco e bateu com ela no vidro do balcão. E funcionou!

- O que você quer? - perguntou o farmacêutico irritado. - Estou conversando com o meu irmão de Chicago que não vejo há anos -, explicou ele sem esperar uma resposta. - Bem, eu queria falar com o senhor sobre o meu irmão -, respondeu Tess no mesmo tom irritado. - Ele está muito, muito doente mesmo, e eu quero comprar um milagre.

- Desculpe, não entendi. - disse o farmacêutico.- O nome dele é Andrew. Tem um caroço muito ruim crescendo dentro da cabeça dele e o meu pai diz que ele precisa de um milagre. Então eu queria saber quanto custa um milagre.

- Garotinha, aqui nós não vendemos milagres. Sinto muito, mas não posso ajudá-la. - explicou o farmacêutico num tom mais compreensivo. - Eu tenho dinheiro. Se não for suficiente vou buscar o resto. O senhor só precisa me dizer quanto custa.

O irmão do farmacêutico, um senhor bem aparentado, abaixou-se um pouco para perguntar à menininha de que tipo de milagre o irmão dela precisava. - Não sei. Só sei que ele está muito doente e a minha mãe disse que ele precisa de uma operação, mas o meu pai não tem condições de pagar, então eu queria usar o meu dinheiro.

- Quanto você tem? - perguntou o senhor da cidade grande. - Um dólar e onze cêntimos -, respondeu a garotinha bem baixinho. - E não tenho mais nada. Mas posso arranjar mais se for preciso.

- Mas que coincidência! - disse o homem sorrindo. - Um dólar e onze cêntimos! O preço exato de um milagre para irmãozinhos! Pegando o dinheiro com uma das mãos e segurando com a outra a mão da menininha, ele disse:- Mostre-me onde você mora, porque quero ver o seu irmão e conhecer os seus pais. Vamos ver se tenho o tipo de milagre que você precisa..

Aquele senhor elegante era o Dr. Carlton Armstrong, um neurocirurgião. A cirurgia foi feita sem ônus para a família, e depois de pouco tempo Andrew teve alta e voltou para casa.
Os pais estavam conversando alegremente sobre todos os acontecimentos que os levaram àquele ponto, quando a mãe disse em voz baixa:

- Aquela operação foi um milagre. Quanto será que custaria?A garotinha sorriu, pois sabia exatamente o preço: um dólar e onze cêntimos! - Mais a fé de uma criancinha. Em nossas vidas, nunca sabemos quantos milagres precisaremos. Um milagre não é o adiamento de uma lei natural, mas a operação de uma lei superior.