sexta-feira, 30 de setembro de 2022


30 DE SETEMBRO DE 2022
CARPINEJAR

Pessoas traem mais do que partidos

Já sabe em quem votar? Veja se seu voto não é híbrido, esquizoide, confuso, em suas cinco opções. Em quantos partidos estará votando ao mesmo tempo? Dois, três, cinco?

Há algo de podre na política nacional: votar na pessoa, e não no partido. De repente, você estará votando, simultaneamente, num governador e num deputado estadual que fará oposição a ele e obstaculizará a aprovação dos projetos na Assembleia. Ou estará votando num presidente e num deputado federal que será contra os planos do Planalto.

O voto passa a ser incoerente, parcial, para o Executivo sem pensar no Legislativo e vice-versa, não levando em conta a cooperação entre os poderes. É possível eleger um representante para governar e um outro representante para vaiar o governante escolhido.

Na democracia norte-americana, se você é republicano, vota nos republicanos; se você é democrata, vota nos democratas, concordando ou não com o candidato eleito nas prévias. Na democracia brasileira, o que prevalece é o personalismo. A conduta pessoal do aspirante a um posto público é maior do que a sua ideologia e sua carreira técnica, desencadeando messianismo e populismo.

Espera-se um salvador da pátria devido à falta de valorização da agremiação partidária. Tanto que não há fidelidade. É natural que o candidato, ao não ser definido em convenção para o cargo almejado, mude de sigla. Isso quando não é eleito por uma plataforma (para alcançar o coeficiente de votos) e troca no decorrer do mandato. As vaidades pessoais se sobrepõem ao desejo da maioria dos correligionários.

Assim, diante do individualismo exacerbado, surgem partidos a cada nova deserção de um líder. Hoje temos 32 partidos no país, um leque absurdo para expressar opiniões tão parecidas.

Afora inimigos mortais que se tornam aliados, e aliados que se tornam inimigos mortais, num troca-troca de lado incompreensível para os registros eternos do Google. Há chapas majoritárias formadas por postulantes que já ofenderam a mãe um do outro. Palanques são levantados no banhado e sapos engolidos com frequência.

De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 10% da população votante é filiada a algum partido, 16 milhões dos nossos mais de 156 milhões de brasileiros aptos a votar. É um percentual muito baixo de engajamento. Toda eleição é uma amnésia, já que grande parte do eleitorado não tem um partido, um projeto político definido. Pessoas traem mais do que partidos. Não se esqueça dessa verdade ao apertar na urna a tecla de confirmar.

CARPINEJAR


30 DE SETEMBRO DE 2022
INFORME ESPECIAL

Oktoberfest com pegada sustentável

A temporada de festas de outubro, com inspiração alemã, chope e bandinhas, está de volta em formato 100% presencial. A retomada promete movimentar municípios gaúchos - e terá novidades.

Em Santa Cruz do Sul, a 37ª Oktoberfest começa na próxima quinta-feira e, dessa vez, quem quiser tomar chope não encontrará copo descartável. Poderá levar o utensílio de casa ou usar uma opção "retornável", com caução de R$ 5. Na saída, terá duas opções: devolver o item e recuperar o dinheiro ou levá-lo para casa de recordação.

O evento transcorre entre os dias 6 e 9, 11 e 16 e 20 e 23, com cerca de 130 expositores, 50 bandas, 400 horas de apresentação, 40 pontos de gastronomia e 180 chopeiras. Entre os destaques da programação, estão os tradicionais desfiles temáticos no centro da cidade (foto).

Em Santa Rosa, no Noroeste, a festividade terá início na próxima sexta-feira e seguirá até o dia 16 (veja mais em site.oktoberfestsantarosa.com.br). Em Igrejinha, no Vale do Paranhana, o evento ocorre de 14 a 23 de outubro (os detalhes estão em oktoberfest.org.br). Opções não faltam.

Outubro rosa para os pets

O mês que se inicia marca a campanha de conscientização sobre a importância da prevenção e do diagnóstico precoce do câncer de mama - e isso não vale só para humanos. Os animais também merecem cuidados.

Para quem tem um mascote e quer aprender como identificar possíveis nódulos em cães e gatos, o Onco Support - Centro Oncológico Veterinário vai promover um evento gratuito, amanhã, em Porto Alegre, com a presença de veterinários - entre eles Camila Dolejal, que aparece na foto ao lado com a cachorra Nina. É só chegar. Será na Rua Vítor Hugo, nº 137, das 11h às 17h. Mas atenção: em caso de chuva, fica para o próximo sábado.

JULIANA BUBLITZ

30 DE SETEMBRO DE 2022
OPINIÃO DA RBS

ALFABETIZAR BEM É FUNDAMENTAL

A recente divulgação dos resultados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) trouxe uma informação alarmante. Foram as crianças em fase de alfabetização que tiveram os maiores prejuízos na aprendizagem no ano passado. São as sequelas da pandemia aparecendo. A aferição mostrou que alunos de oito anos, idealmente já aptos a ler e escrever com naturalidade, tinham dificuldades de localizar informações claras em um texto de apenas duas linhas.

Como essa é uma etapa essencial para a trajetória escolar, é uma deficiência que tem de ser atacada logo. Neste contexto, acerta o governo gaúcho ao anunciar a criação de um programa voltado exatamente para a finalidade de alfabetizar os estudantes das redes do Estado e dos municípios até o encerramento do 2º ano do Ensino Fundamental. É uma frente que pede respostas urgentes e, portanto, o esperado é que o futuro governo, a ser definido nas eleições do próximo mês, mantenha o foco nesse tema.

Batizado de Alfabetiza Tchê, o programa começa com uma prova de avaliação dos estudantes, seguida da elaboração de materiais didáticos para ajudar os professores a solucionar os obstáculos ao letramento infantil. Estão previstos ainda apoio à formação dos docentes e monitoramento dos indicadores, avaliando o progresso do projeto. A premiação em dinheiro para as escolas com melhor desempenho deve servir como incentivo extra para que atinjam os objetivos. Também faz sentido ajudar financeiramente os colégios com os piores resultados, como forma de auxílio, em busca de melhorar a aprendizagem dos pequenos do 1º e 2º anos do Ensino Fundamental. Mas, mais do que o ato mecânico de ler e escrever, é preciso trabalhar também para combater o analfabetismo funcional, quando a pessoa tem dificuldade de compreender e dar sentido ao que está escrito.

O fato de o programa ter sido elaborado em parceria com a Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul e a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação depõe a favor da iniciativa. Mostra que há uma busca conjunta para reverter o quadro atual.

A Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs) também apresentou dados nessa semana que escancaram a dificuldade do setor em encontrar mão de obra qualificada para contratar. Dois terços das empresas relatam enfrentar esse gargalo. O sufoco é maior para recrutar em áreas como produção (técnicos e operadores), pesquisa e desenvolvimento, vendas e marketing. A qualificação de um trabalhador é um processo contínuo. Tudo se inicia, por óbvio, no começo da vida escolar, quando se aprende a ler e a escrever. Ter essas habilidades básicas permite, nos anos seguintes, melhores condições de acumular outros conhecimentos. Isso se refletirá na vida adulta, quando chegar ao mercado de trabalho.

Um dos entraves econômicos do país é a estagnação da produtividade do capital humano. Nesse jogo, capacitação é a palavra-chave. E a indústria é um dos setores que, com a incorporação constante de novas tecnologias, mais requerem pessoas com boa formação, treinadas para estas várias tarefas e com capacidade de se adaptar às transformações. Em regra, inclusive, remunera melhor ante outros segmentos da economia. Apostar em uma melhor alfabetização, portanto, também significa dar o lastro necessário para que crianças se transformem em cidadãos com maiores chances de construir uma trajetória profissional digna.


30 DE SETEMBRO DE 2022
EDUARDO BUENO

O sexo dos anjos

Foi em 29 de maio - 505 anos e um dia antes do meu aniversário. Sim, 29 de maio de 1453, um domingo de Pentecostes. A fabulosa Constantinopla (antes Bizâncio, hoje Istambul), então capital do Império Romano do Oriente, estava cercada há 53 dias pelo poderoso exército dos turcos otomanos, sob o comando do sultão Maomé II: 90 mil homens fortemente armados e bem treinados. 

Para defender sua cidade, o imperador Constantino XI contava, mal e mal, com 7 mil soldados e 35 mil civis. Ao raiar daquele dia histórico - que na escola nos disseram ser o fim da Idade Média e o início da Era Moderna -, as muralhas da cidadela tombaram e Maomé II cavalgou por uma avenida de sangue e morte até o coração da cidade que jamais voltaria a pertencer à Cristandade.

Reza a lenda que durante todo o período em que durou o cerco, dentro das muralhas de Constantinopla - tidas como inexpugnáveis - estava rolando um concílio no qual os clérigos discutiam ardorosamente sobre o sexo dos anjos, se é que eles tinham um.

Trata-se de uma falácia, é claro. Ou melhor, duma metáfora, a revelar que mesmo em face do avanço de um inimigo muito mais poderoso, duas alas do cristianismo ortodoxo se mantiveram radicalmente divididas. Tais facções estavam bem definidas: por um lado, os chamados "unionistas" (ou henotikoi); de outro, os "antiunionistas" (anthenotikoi). 

Os primeiros eram intelectuais de alto escalão, burocratas e clérigos que cercavam o imperador, favoráveis à aliança com os cristãos do Ocidente; os outros, monges, clérigos de baixo escalão e o "povo". Em Roma, o papado - corrupto e intolerante - já havia deixado claro que qualquer discussão sobre uma possível ajuda militar do Ocidente à Constantinopla só seria possível após uma "rendição" incondicional dos ortodoxos e sua submissão à fé católica. 

Assim, a suposta discussão sobre o "sexo dos anjos" na verdade era o racha entre as duas facções bizantinas: os radicais estavam decididos a arriscar tudo para garantir a integridade de sua fé, e aqueles que estavam dispostos a fazer concessões (oikonomia) para salvar seu império.

Estamos às vésperas da mais importante eleição do Brasil desde 1910, quando o civil Rui Barbosa (a pena) enfrentou o militar Hermes da Fonseca (a espada). Decidi falar sobre o sexo dos anjos para dizer que sou um "unionista", favorável ao voto útil e capaz de qualquer coisa para me livrar do inominável.

EDUARDO BUENO

quinta-feira, 29 de setembro de 2022


29 DE SETEMBRO DE 2022
CARPINEJAR

Queremos passe livre!

É uma zombaria não ter passe livre em Porto Alegre no dia da votação. Houve mudança das datas de gratuidade há um ano, por baixo dos panos, em conluio entre o Paço Municipal e a Câmara de Vereadores, ficando restritas ao feriado de Navegantes e ao Dia D da vacinação.

Não acredito em acaso, não confio em atos falhos. Existe uma intenção na alteração de lei. Porque, em todas as eleições no nosso período recente eleitoral, que acontecem a cada dois anos, contamos com a disponibilidade do serviço para facilitar o deslocamento da população das periferias até os colégios eleitorais.

Então, o voto é obrigatório e o trabalhador porto-alegrense ainda tem que custear ônibus para votar? Já não bastam a redução das linhas e o aumento do tempo de espera nas paradas durante o final de semana?

A raridade de um ônibus não é exagero de minha parte. De acordo com a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) e com a Secretaria de Mobilidade Urbana, a partir de levantamento de junho, a Capital tem 110 linhas a menos do que antes da pandemia: 158 foram desativadas nos últimos dois anos - incluindo a D43 Universitária, que atendia o Campus do Vale da UFRGS - contra 48 criadas.

Diferentemente de outros pleitos, é uma maneira de atacar a democracia, de influenciar a decisão, desfavorecendo os candidatos favoritos nas classes C e D. Só pode ser uma manobra política. Quisera pensar diferente, mas não encontro uma segunda motivação no horizonte próximo.

É um desestímulo para o comparecimento às urnas no primeiro turno, que unicamente permanecerão abertas das 8h às 17h de domingo. Em horário exíguo para quem mora longe. Não existe misericórdia para um minuto sequer de atraso - os portões serão fechados sem desculpa.

Passa-se a ideia de que não compensa votar, de que é mais barato permanecer em casa, pois as passagens de ida e volta custam R$ 9,60 - R$ 4,80 por viagem - e a multa por não votar é de cerca de R$ 3. Ou seja, o deslocamento custa três vezes mais do que a sanção pela ausência não justificada.

Que o prefeito Sebastião Melo, eleito com passe livre, possa rever sua posição e baixar um decreto. A lei permite que sejam autorizados até seis dias de passe livre por ano na cidade. Além dos dois obrigatórios, mais quatro opcionais. Um deles deveria ser garantido agora. Para não gerar dúvidas quanto a interesses espúrios.

CARPINEJAR

29 DE SETEMBRO DE 2022
OPINIÃO DA RBS

TRANSPARÊNCIA REFORÇADA

Transparência nunca é demais. Mesmo que já tenham sido rebatidas diversas vezes todas as suspeitas infundadas contra o sistema eleitoral brasileiro, é sempre válido reforçar a translucidez das urnas eletrônicas e da soma dos votos. Foi com este espírito que o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes, ciceroneou ontem um grupo de representantes de partidos, de entidades que usualmente fiscalizam os pleitos e de membros de missões internacionais de observação em uma visita à Seção de Totalização (Setot), o ambiente que já foi indevidamente chamado de sala secreta.

Participaram do encontro enviados de siglas como União Brasil, PTB, PDT, PT e PL. É positivo que o PL, partido do presidente da República, Jair Bolsonaro, tenha sido representado pelo próprio presidente da legenda, Valdemar da Costa Neto, que assim pôde tirar qualquer dúvida porventura existente. Na saída, o dirigente disse a repórteres que cobriam o evento que, de fato, não existe nada na sala que possa escapar ao escrutínio público. Também foram convidados a comparecer o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, e enviados da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), da Procuradoria-Geral Eleitoral, da Controladoria-Geral da União (CGU) e de comissões estrangeiras.

Causa estranhamento, no entanto, que ainda ontem o PL tenha divulgado documento colocando em dúvida a segurança dos sistema eleitoral, mas outra vez sem qualquer prova ou indício consistente. Apenas ilações irresponsáveis. Por emissários, o presidente do partido avisou que não corrobora com as afirmações da suposta auditoria.

A chamada sala de totalização, onde trabalham 20 servidores da área de TI do TSE, é um ambiente com computadores, claro e aberto, destinado a monitorar os sistemas e receber as informações de boletins das urnas para a soma dos votos. Os funcionários ali instalados não têm como modificar qualquer dado. É um local sempre franqueado às entidades fiscalizadoras nas eleições, o que ocorrerá outra vez a partir das 16h30min de domingo.

A visita de ontem, em qualquer eleição anterior, teria passado despercebida. Afinal, até agora, após 26 anos do uso das urnas eletrônicas, nunca existiu tamanha campanha para desacreditar o sistema brasileiro, que já comprovou ser seguro, transparente e auditável, capaz de expressar de forma precisa e ágil a legítima vontade do eleitor. Assim, é conveniente aproveitar toda oportunidade para demonstrar e explicar detalhadamente como ocorrem a votação e a totalização. Nos últimos meses, o TSE e os tribunais regionais eleitorais foram incansáveis em prestar esclarecimentos e, a seu tempo, receber e usar contribuições que fortalecessem ainda mais o sistema.

O país está a três dias do primeiro turno de uma eleição tensa. É de se esperar que os eleitores possam ir em paz às urnas no próximo domingo para exercer a cidadania e votar livremente. Esse novo gesto do TSE, dos partidos e de outras entidades fiscalizadoras, reforçando a credibilidade da Justiça Eleitoral, pode dar uma contribuição a mais para ajudar no apaziguamento dos ânimos. Será positivo se for preservado o entendimento institucional e a maturidade demonstrados no encontro de ontem e que novas tentativas de descrédito sejam firmemente repelidas. 

29 DE SETEMBRO DE 2022
 PRAZER DAS PALAVRAS

Quanto vale meu voto?

O que caracteriza um povo civilizado? É grande a variedade de critérios que podemos adotar. Para os primitivos navegantes do mundo grego, ao chegarem a uma ilha desconhecida, o indício decisivo era a presença de campos cultivados - critério bem diferente, aliás, do que foi o adotado por um viajante inglês que, no século passado, acabou se perdendo numa trilha remota das montanhas dos Bálcãs: "Depois de caminhar por onze horas sem encontrar o mínimo vestígio de seres humanos, foi com alegria e com imenso alívio que pude ver, numa árvore, o corpo de um enforcado balançando na ponta de uma corda, pois isso me trouxe a certeza absoluta de que tinha chegado de novo à civilização". Ora, para o autor desta coluna, prezado leitor, povo civilizado é o que acredita na importância de votar.

Para justificar minha escolha, trago um incidente de 2.500 anos atrás, que já foi tema de uma crônica incluída no meu livro Cem Lições para Viver Melhor. Peço escusas ao leitor pela deselegância de citar a mim mesmo, mas não conheço exemplo melhor que o daquele teimoso capitão que ficou imortalizado na batalha de Plateia, quando Esparta e Atenas derrotaram os persas comandados por Mardônio. Eis a história:

"Por vários dias, numa planície da Beócia, gregos e persas vinham se estudando à distância, aguardando o momento propício para atacar. Como a água estava escassa, o alto comando grego decidiu aproveitar a escuridão da noite e recuar seu exército para uma região mais rica em fontes e mananciais. Os atenienses receberam a ordem sem discutir, mas o mesmo não ocorreu entre os espartanos: Amonfareto, chefe de um batalhão, recusou-se a obedecer, dizendo que ele e seus homens estavam ali para enfrentar os bárbaros que ameaçavam sua pátria e não iriam partir sem lutar. Os chefes alegaram que isso já estava decidido, mas ele redarguiu, indignado: "Pois eu voto por ficar!" - e, abaixando-se, pegou uma pedra no chão e foi depô- la aos pés do comandante geral, exatamente como se votava nas assembleias de Esparta.

Como ninguém queria deixá-lo para trás, começaram a discutir, tentando convencê-lo a partir. Enquanto isso, os atenienses, que tinham começado a retirada, detiveram-se alguns quilômetros depois, ao perceber que seus aliados espartanos não se moviam do lugar. Quase ao amanhecer, mandaram um mensageiro até lá; ele voltou perplexo, informando que todos estavam empenhados numa discussão interminável.

Quando o dia raiou, os persas viram o campo grego praticamente deserto: avistaram apenas a retaguarda do exército espartano que, apesar dos protestos de Amonfareto, começava a se afastar lentamente por trás de uma colina. Mardônio ordenou que apenas a cavalaria partisse em seu encalço, mas os demais chefes persas, imaginando que os gregos tivessem se acovardado, abandonaram suas posições e avançaram desabaladamente, preparando-se, não para combater, mas para caçar fugitivos apavorados. O resto é história: os espartanos fizeram frente à primeira onda do ataque, os atenienses voltaram para socorrê-los e os exércitos desordenados de Mardônio sofreram uma derrota fatal.

O que o espartano queria? Apenas participar, com uma pedrinha que fosse, da marcha dos acontecimentos. Podia simplesmente acompanhar os outros, mas não quis renunciar ao direito de expressar sua opinião na assembleia - no que estava certo, pois seu voto terminou afetando o desenrolar da batalha. Essa saudável vontade de influir, de ter algum peso no curso da História, por ínfimo que seja, talvez seja a última ilusão que ainda me resta. Sei que muitos, por cansaço ou desencanto, já desistiram e parecem não mais se importar se o seu candidato mentiu, roubou ou traiu os princípios que jurava defender nas eleições passadas - mas eu me importo. Por pura teimosia.

CLÁUDIO MORENO

29 DE SETEMBRO DE 2022
POLÍTICA +

Conselheiros de candidatos

Nos intervalos do debate da RBS TV, chamou atenção uma diferença de Onyx Lorenzoni (PL) para os demais candidatos. Enquanto os outros trocavam ideias com assessores, quem aconselhava Onyx era sua esposa, Denise Lorenzoni.

A seu lado, o líder das pesquisas, Eduardo Leite (PSDB), conversava com o publicitário Fábio Bernardi, coordenador de marketing da campanha vitoriosa de 2018 e responsável pela concepção visual, pelos roteiros e pelas sacadas desta campanha. Bernardi também acompanhou Leite na campanha para a prévia do PSDB, em 2021.

Na época em que os concorrentes estavam montando suas equipes, Onyx disse que seria seu próprio marqueteiro. O assessor Daniel Ramos, que coordena os programas de TV, é orientado diretamente pelo candidato, mas Denise está sempre ao lado do marido, seja nas entrevistas, nos debates ou nas atividades de rua na Capital ou no Interior.

O candidato atribui a ela seu fervor religioso e a conversão à Igreja Evangélica Sara Nossa Terra. Antes, ele era luterano. O casal costuma fazer transmissões pelo Instagram lendo trechos da Bíblia.

A relação de Leite com Bernardi é profissional, mas os dois se tornaram amigos. Apaixonado por política, o publicitário ajudou a pavimentar o caminho para a candidatura a governador, depois de Leite ter perdido a prévia do PSDB e renunciado ao mandato.

ROSANE DE OLIVEIRA

29 DE SETEMBRO DE 2022
TULIO MILMAN

A nossa luta

Uma vez, durante uma conversa com o Moacyr Scliar, ele me disse: "Eu li Minha Luta". Esse é o título de um livro escrito por Adolf Hitler. É considerado a bíblia do nazismo, ideologia responsável por uma guerra que matou milhões de inocentes, entre eles ciganos, gays, judeus, comunistas, russos, alemães, pessoas com deficiência, americanos e brasileiros, que combateram bravamente a ameaça totalitária na Europa.

Scliar faz parte de uma seleta lista mundial de grandes escritores judeus. Sua obra transformou o Bom Fim, bairro onde morava a imensa maioria dos judeus de Porto Alegre, em uma referência literária universal.

Na época, achei estranha a convicção do Scliar ao defender a leitura do panfleto hitlerista. Hoje, entendo. Porque também li Minha Luta, assim que ele caiu em domínio público, em 2016, e voltou a ser editado no Brasil. Agora, tramita em Porto Alegre um projeto que prevê a proibição do comércio, da publicação, da distribuição, da difusão e da circulação do seu conteúdo integral ou parcial. Não tenho a menor dúvida sobre as boas intenções da proponente. 

Mas os efeitos dessa vedação seriam inócuos ou contraproducentes. Primeiro, porque, em tempos de internet, qualquer um tem acesso a qualquer conteúdo. Segundo, porque a proibição aguçaria a curiosidade. Vale ressaltar: meu avô, um judeu alemão, foi prisioneiro em um campo de concentração nazista. Foi dos últimos a conseguir sair de lá. Fugiu para o Brasil, onde foi acolhido como um cidadão pleno até o último dia da sua vida. 

É justamente por isso que defendo: Minha Luta deveria ser lido na escola e, com professores capacitados, virar tema de debate profundo sobre os limites da estupidez humana, compreendendo o momento em que foi escrito, suas implicações e as lições que devemos aprender com ele. Da mesma forma, não consigo compreender um anticomunista que não tenha lido O Capital. Ou um comunista que não conheça os teóricos do liberalismo. A preguiça intelectual logo se transforma em arrogância.

O ideal é que Minha Luta jamais tivesse sido escrito. Mas empurrá-lo para baixo do tapete não apaga a sua importância histórica e tudo o que devemos compreender hoje sobre discursos populistas - de esquerda e de direita - que encantam, seduzem e emburrecem povos e pessoas. Muitos alemães, netos e bisnetos dos nazistas de então, perguntam-se até hoje: "Como foi possível tamanha barbárie?". Se esquecermos a pergunta, perderemos a resposta.

TULIO MILMAN

quarta-feira, 28 de setembro de 2022


28 DE SETEMBRO DE 2022
CARPINEJAR

Como quebrar o braço em casa

Já fingi uma torção na mão direita para não fazer uma prova. E me dei mal: fui levado para um espaço reservado e tive que ditar as respostas. Enquanto a professora estava em sala de aula com a turma, a secretária da escola me aplicou o exame oralmente.

Já tentei simular febre me cobrindo com edredons e forçando suor, mas acabei desmascarado pelos pais. Já adulterei temperatura no termômetro, porém não houve como intervir na segunda medição. O medo ingênuo de reprovação numa prova de matemática era suficiente para me pôr a mentir. Então, só calculo o que estão sentindo os russos diante da convocação para uma guerra.

Não sofrem por bobagem, por um receio infantil de castigo ou recuperação, por uma questão de aprovação em uma matéria, mas por um instinto maior de sobrevivência.

A frase mais frequente do Google na Rússia tem sido "como quebrar o braço em casa". A caça na web por tutoriais insanos de autoflagelação disparou logo após o presidente Vladimir Putin anunciar, na quarta-feira passada (21), uma mobilização extra para reforçar as tropas na invasão da Ucrânia, convocando 300 mil reservistas com alguma experiência militar.

Imagine o seu jovem filho ou mesmo o seu pai aposentado, diante do computador, procurando entender, passo a passo, como se machucar para não correr o risco de morrer por uma bomba ou por uma saraivada de tiros no campo de batalha e retornar para a família somente dentro de um caixão. A indenização de cerca de R$ 260 mil por existência perdida não desperta a coragem de combatentes, ainda que mergulhados na mais completa penúria.

As atitudes extremas de optar pela dor menor e se ferir para não servir ilustram a coerção do Estado em períodos de exceção. Você se vê sem opção razoável para fugir do recrutamento: ou garantir a dispensa a partir de uma lesão, ou entrar no rebanho do suicídio coletivo.

Quando alguém se predispõe a quebrar o próprio braço, significa que não gostaria de sair do país. Não pode ser estigmatizado de covarde. É igualmente um patriota, pois prefere encontrar uma alternativa para a sua permanência a fugir pelas fronteiras da Geórgia ou da Mongólia.

A pesquisa excêntrica tornou-se um símbolo icônico da paz mundial, assim como a imagem do estudante chinês que desafiou tanques durante os protestos estudantis na Praça da Paz Celestial, em Pequim, em 1989. Agora, pelas vias digitais, palavras na lupa do buscador se põem na frente dos canhões e resumem até que ponto a humanidade chegou.

CARPINEJAR

28 DE SETEMBRO DE 2022
JEFERSON TENÓRIO

Os livros e a democracia

Os livros sempre estiveram comigo nos momentos difíceis da minha vida adulta. Certa vez, anos atrás, precisei fazer um procedimento médico em que era necessário receber uma anestesia geral. Não gosto de anestesia geral. A ideia de perder a consciência contra a vontade me incomoda. Não sei quanto a vocês, mas para mim soa como uma espécie de morte temporária. Nesta ocasião, levei um livro comigo, pois minutos antes do procedimento, lá estava eu lendo versos de Fernando Pessoa.

O livro também já me salvou de abordagens policiais truculentas. Como sabem, ser negro no Brasil significa que essas abordagens são frequentes. Em algumas, o fato de estar segurando um livro me livrava da revista. Na verdade, mais do que proteção, tinha orgulho de caminhar portando um livro. Para mim, era um elogio ser identificado como alguém que lê.

Eu me apaixonei pelos livros aos 23 anos. Uma paixão tardia. Antes, eles circulavam em minha casa como um objeto qualquer, não havia em mim a vontade de me aproximar deles. Até porque havia outras coisas mais urgentes para resolver. Lembro a primeira vez em que entrei na biblioteca de minha faculdade de Letras. Olhei para todas aquelas estantes e talvez ali tenha feito uma escolha grave e importante: a de que os livros passariam a ser minha companhia por toda a vida. A partir daquele momento, não estava só me tornando um leitor, mas também escolhendo um modo de viver.

Aos poucos, fui comprando livros e criando a minha própria biblioteca. Comprava tantos livros por semana que logo meu salário como estagiário começou a ser muito pouco para tudo que queria ler. Adquiri dívidas, porque deixei de pagar a faculdade em que estudava. Tive de trancar meu curso por não conseguir mais pagá-lo, mas meus livros estavam todos lá, na minha estante, olhando para mim. Um ano depois, prestei vestibular para uma universidade pública e passei. E novamente os livros estavam em minha companhia.

No próximo domingo, nosso país irá exercer a cidadania para escolher os nossos representantes através de um instrumento democrático importante: o voto. Infelizmente não estou no Brasil neste momento tão importante para nossa democracia, mas se estivesse, certamente levaria um livro para me acompanhar. Independentemente do resultado da eleição neste domingo, tenho certeza de que colocaremos a constituição em prática mais uma vez.

O livro, para mim, é muito simbólico, porque ele representa nossa civilidade, nosso compromisso com o conhecimento e respeito à diversidade de ideias. E você? Já escolheu que livro irá levar para votar?

JEFERSON TENÓRIO

28 DE SETEMBRO DE 2022
+ ECONOMIA

Mercado assiste à eleição impávido

A alta de 2,5% do dólar, na segunda-feira, teve mais componente externo do que relacionado à eleição, embora a aparente quebra da expectativa de que Henrique Meirelles fosse o "Posto Ipiranga" de Lula possa ter contribuído. É uma situação que destoa das habituais oscilações bruscas no mercado financeiro em campanhas eleitorais. Ontem, a moeda americana fechou quase estável, em R$ 5,377.

Boa parte dos analistas atribui a relativa calmaria à confiança de que nenhum dos candidatos fará "bobagem" na economia. Mas a coluna foi buscar mais detalhes desse novo comportamento do mercado com quem está mais perto desse pulso sempre oscilante.

Roberto Padovani, economista-chefe do Banco Votorantim:

"O mercado usou o tempo todo a avaliação de que, quem quer que seja o próximo presidente, não haveria descontinuidade de políticas, rupturas de regras, um pouco porque tem sido essa nossa experiência nas últimas oito eleições. Houve transições políticas sem rupturas. Minha preocupação era mais do ponto de vista de gestão fiscal, por conta da dívida, mas aí também prevaleceu a ideia de que não vai haver grandes modificações em relação ao governo atual. A leitura do mercado é de que nada muda na economia, independentemente da transição política. Talvez seja sinal de amadurecimento institucional do país, ou talvez alguma miopia dos analistas em relação aos riscos efetivos. Mas o fato é que o mercado não viu como precificar risco de ruptura e ficou guiado pelo risco externo."

André Perfeito, economista-chefe da corretora Necton:

"Nessa eleição, há dois candidatos muito conhecidos, um é presidente, outro é ex, todo mundo sabe como são. Só isso já tira dúvidas do ar. Outra questão é que os preços dos ativos já estão no lugar certo. Na verdade, estão baixos. A bolsa está em patamar baixo, o juro está alto. Isso faz com que haja mais espaço para cima do que para baixo. A combinação de candidatos conhecidos com preços já adequados evita que haja mais ruídos. Só que está no meio de uma situação em que há muita dúvida lá fora também, o que mexe com o humor."

Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating:

"Esperava-se que, mais perto das eleições, com pesquisas mais definidas, houvesse mexidas, em particular no câmbio. Mas fatores extra-política, como a guerra entre Rússia e Ucrânia, inflação e juro na Europa e nos Estados Unidos, acabaram se sobrepondo às questões internas. Talvez porque a política já esteja quase dada. O candidato de esquerda declara que não deve cumprir teto de gastos, que vai rever gastos e aumentar o papel do Estado, e o de direita diz que vai manter o liberalismo econômico, que é mais para inglês ver. Mas há menos ruído político no campo econômico do que eu esperava."

empresas e 5 mil empregos é o alvo do Parque Tecnológico Prado, em Gravataí, até 2030. Ontem, começou a operar o conselho estratégico com quádrupla hélice (público, privado, educação e terceiro setor).

MARTA SFREDO

28 DE SETEMBRO DE 2022
MÁRIO CORSO

Motoboy

Verissimo, em uma crônica, imaginou um mundo onde ninguém saía de casa, salvo os motoboys. Em certos momentos da pandemia, a ficção parecia profecia. Nós em casa e eles entregando comida e remédios.

Naqueles dias, tornei fixo um hábito ocasional. Passei a sempre dar gorjeta ao entregador. Se fazemos isso com garçons, por que não a quem traz comida em casa?

De fato não é a mesma relação, no restaurante você o conhece e ele sabe qual a sua bebida. O drama do motoboy é ser um garçom invisível. Você o vê uma vez e tchau. A impessoalidade esfria a solidariedade.

Surpreendem-se quando lhes alcanço o dinheiro, dizem que ninguém lhes dá nada. Existe a modalidade pelo aplicativo de valor extra, prefiro a presencial.

Os motoristas reclamam de suas imprudências no trânsito. Já tive moto. Qualquer um que teve, nota que o para-choque da moto é a testa do condutor. Eles sabem-se vulneráveis. Porém eles são o elo mais frágil da velocidade e da ganância deste mundo. Ganham pouco por entrega. Portanto, não se trata de pressa, e sim de necessidade.

A forma de renda por aplicativos dos motoboys situa-os numa nova classe social chamada precariado. O neologismo dispensa explicação. O discurso que lhes passam é ao modo Uber: ser dono do próprio negócio, não ter patrão, trabalhar quando quiser. A propósito, pergunte aos motoristas de Uber quantas horas trabalham. É fácil achar quem segura o volante mais de 12 horas. São trabalhadores sem rede de proteção social. Se adoecerem ou se acidentarem, azar deles. A bomba maior explodirá na aposentadoria pífia, ou nem isso, que terão.

Uma foto ensejou esta coluna. Era de entregadores de aplicativos paulistanos. Estavam buscando quentinhas num lugar que ajuda população de rua. Claro que não são todos os motoboys que estão nesta sinuca, mas a foto desanima como símbolo de um absurdo. Pense na cena, entregadores de comida, com caixas nas costas exibindo a marca que lembra comida, que passam o dia cheirando a comida alheia, mendigando a própria comida.

A gorjeta não resolve o problema, mas ajuda na agrura da sua gincana diária na selva do trânsito. Mais do que isso, é um momento de mostrar, de uma forma concreta, que nós sabemos que eles existem. Um gesto que reumaniza a relação, que os lembre que não são só uma peça de uma engrenagem sórdida.

MÁRIO CORSO

terça-feira, 27 de setembro de 2022


27 DE SETEMBRO DE 2022
CARPINEJAR

Paternidade dos maus exemplos

Um conhecido cabeleireiro de Belo Horizonte - aliás conhecido de todos, inclusive já frequentei o seu salão - surpreendeu ao aparecer no noticiário policial por briga em motel com prostitutas, as quais alegavam que ele se indispôs a acertar o pagamento combinado e que buscava manter relações sem proteção. A bizarrice maior é que estava acompanhado dos dois filhos adolescentes.

O que passa pela cabeça de um pai para levar seus dois filhos menores de idade a um motel? Bancar o malandro? Querer ser o esperto?

Ele não somente destruiu a sua carreira, mas também a reputação de sua família. Confundiu o papel paterno com o de cafetão, incentivando orgias.

Talvez seguisse um modelo um tanto anacrônico, machista e heteronormativo dos anos 50, quando os homens mais velhos de casa eram responsáveis pela iniciação dos mais novos nos bordeis. Naquela época, havia o costume de apadrinhar a perda da virgindade dos jovens. Estes chegavam a ser forçados a ter experiência o mais cedo possível, para provar a macheza e eliminar o receio de outra orientação sexual.

O cabeleireiro não evoluiu mentalmente com o transcorrer do século, logo ele, afamado por cuidar dos cabelos das clientes e transmitir a imagem de sensível e compreensivo com os anseios femininos.

Conseguiu oferecer uma série de péssimos exemplos em menos de uma hora de quarto: trair a sua namorada, agredir as parceiras sexuais, coisificar o corpo e não se importar com a prevenção. A tornozeleira eletrônica e a restrição a sair são o de menos perto da supressão da liberdade do próprio nome.

Fazia tempo que eu não via tamanha distorção familiar. Parece que a paternidade não largou a Pré-História. Há homens que acreditam piamente que devem ensinar aos filhos o pior da existência, transmitindo um legado mundano de abusos: brigar de socos com os colegas, mentir e enganar os seus amores, beber loucamente, dirigir em alta velocidade.

Pelo viés da limitação afetiva, pensam que estão preparando seus rebentos para a vida, inspirando-os a se defender de um mundo violento. Quando, pelo contrário, perpetuam a dominação pela força física, produzindo traumas irreparáveis com a ostentação de uma conduta misógina.

Dispensando o senso de responsabilidade, tentam firmar uma amizade de igual para igual. Como se fossem colegas da mesma faixa etária.

Os filhos sequer precisam entrar em gangue com tutores assim. Não é por acaso que a taxa no país de registro de filhos sem a figura do pai cresceu 0,8% em relação a 2019. De acordo com a Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil), 100.717 crianças foram apresentadas em cartórios por mães solo nos primeiros sete meses de 2022.

A raiz do mal não está na deserção do lar, mas antes no desrespeito à mulher. O pai abandona o filho para punir a sua companheira, para castigar o romance indesejado.

Não tem nada a ver com a repulsa aos bebês, e sim com o imenso medo que parte dos homens ainda tem da mulher.

CARPINEJAR

27 DE SETEMBRO DE 2022
OPINIÃO DA RBS

ALERTA CONTRA A POLIOMIELITE

Pais e responsáveis de crianças menores de cinco anos têm uma tarefa inadiável. Checar a carteira de vacinação dos pequenos, informar-se, consultar um pediatra em caso de dúvida e, se necessário, levá-los até sexta-feira a um dos mais de 40 mil pontos distribuídos em todo o país aptos para a imunização contra a poliomielite. Originalmente, a campanha que acontece todos os anos se encerraria no último dia 6, mas devido à baixíssima cobertura, muito aquém da meta, o Ministério da Saúde decidiu prorrogar a mobilização até o dia 30.

No início do mês, quando a pasta optou pela prorrogação, apenas 35% das crianças do público-alvo haviam sido vacinadas, dentro de um universo de 14,3 milhões. O objetivo seria atingir 95% deste contingente. Todo esse esforço se deve à necessidade de o Brasil impedir a reintrodução da pólio no país. O Brasil ganhou o certificado de erradicação da doença em 1994, após o último caso ser registrado em 1989, mas a paulatina redução nas taxas de vacinação nos últimos anos vem levando médicos e especialistas de áreas correlatas a elevar o nível de alerta para o risco de o vírus voltar a circular e a enfermidade ser outra vez verificada no território nacional.

A ameaça é real e, portanto, exige responsabilidade dos pais e atenção redobrada de autoridades e órgãos da área de saúde. Mesmo que existam explicações para o quadro, não é razoável que um país com um dos programas de imunização mais eficientes e reconhecidos do mundo assista, sem uma reação à altura, à volta de uma doença eliminada há cerca de três décadas.

A poliomielite é uma doença contagiosa aguda que pode infectar crianças e adultos. A contaminação se dá por via fecal e oral. Pode provocar sintomas leves, como uma virose, ou levar à paralisia dos membros inferiores. Por isso também é conhecida como paralisia infantil. A enfermidade ainda pode ser fatal quando são afetados músculos respiratórios ou da deglutição.

Especialistas envolvidos no tema avaliam que notícias falsas sobre vacinas, campanhas de comunicação insuficientes e ineficientes e o fato de a atual geração de pais não ter convivido com pessoas afetadas pela doença explicam a queda da cobertura vacinal. Todos esses pontos podem ser enfrentados com boa informação, campanhas educativas e estratégias adequadas que atinjam e sensibilizem o maior número possível de progenitores e responsáveis. É o que deve ser feito especialmente para as próximas campanhas anuais, com as crianças sendo levadas para cumprir todas as etapas do esquema vacinal.

A pólio ainda é uma doença endêmica no Afeganistão e no Paquistão, mas também voltou a aparecer em nações desenvolvidas, como Israel. Nova York, nos EUA, e Londres, no Reino Unido, detectaram o vírus no sistema de esgoto e entraram em alerta. O Brasil, infelizmente, já teve o retrocesso com o sarampo, que voltou a ser registrado no país, após ser erradicado. É preciso evitar o mesmo com a pólio.



27 DE SETEMBRO DE 2022
+ ECONOMIA

R$ 150 milhões em quatro horas

Grande empreendimento imobiliário lançado depois de décadas de impasse próximo ao ParkShopping em Canoas, o The Garden precisou de apenas quatro horas para vender 225 terrenos que somaram um valor de R$ 150 milhões.

Assinado por Melnick e Arcádia, com participação de Dallasanta, Salvadori Incorporações e Participações e LF Ltda, o bairro tem estrutura de lazer prevista no espaço e opções de serviços, centros comerciais, unidades de saúde e instituições de ensino.

A área total é de 980 mil m2, com mais 100 mil m2 de área verde. O bairro monitorado terá cerca de 690 mil m2, composto por diversos condomínios residenciais. O valor geral de vendas (VGV) total estimado é de R$ 1 bilhão.

- Apresentamos o empreendimento em convenção para quase 700 corretores, e já naquele momento sentimos que o resultado das vendas seria espetacular - afirma Alessandra Sehn, sócia da Arcádia.

Depois do lançamento das duas fases iniciais, ainda haverá uma terceira etapa. A previsão de entrega é de 30 meses.

dos recursos liberados no programa Juro Zero RS, do governo estadual, passaram pelo Sicredi. A institutição financeira cooperativa fez parceria com Badesul e BRDE para ser o maior repassador. Chegou a 12,8 mil solicitações e R$ 280,5 milhões em crédito para MEIs, microempresas e empresas de pequeno porte.

Dólar sobe por recessão e eleições

A seis dias do primeiro turno das eleições 2022, o dólar teve alta de 2,5% para R$ 5,38 ontem. Se até agora não havia estresse eleitoral no mercado, nem com eventual vitória de Luiz Inácio Lula da Silva em primeiro turno, o que impactou o câmbio?

Desta vez, boa parte da pressão altista veio do Exterior, com a redução de tributos no Reino Unido e indicadores abaixo do esperado na Alemanha, que aumentaram o temor de recessão na Europa. Claro, a reta final da campanha presidencial também afetou o humor. Além das questões externas, houve uma "coincidência": assim como o apoio do ex-ministro Henrique Meirelles havia animado o mercado em relação à perspectiva de vitória de Lula, sinais de que não será o "Posto Ipiranga" do petista contribuíram com o estresse.

No domingo, Lula reafirmou, depois de Meirelles ter declarado que acabar com o teto de gastos seria um erro:

- Acabou o teto quando eu for presidente.

Criador do teto, Meirelles, por sua vez, afirmou que seu foco agora está na atuação como conselheiro da Binance - provedora global de infraestrutura para criptomoeda - e que não tem "planos de ir para o setor público".

MARTA SFREDO

27 DE SETEMBRO DE 2022
NÍLSON SOUZA

Daqui a milênios

A imagem publicada no site Mistérios da Arqueologia e História é ao mesmo tempo impactante e divertida. Mostra um esqueleto humano recém-desenterrado com um celular na mão, a falange distal do polegar cravada na telinha e o braço flexionado de modo a manter o aparelho diante das cavidades orbitais do exumado.

- Assim os arqueólogos do futuro nos encontrarão! - brinca o bem-humorado redator.

Concordância geral entre os leitores, com comentários igualmente espirituosos, entre os quais o de um internauta que faz propaganda do seu celular: - Se for da marca do meu, ainda terá 90% de bateria - esnoba.

Creio que nesse futuro projetado pela brincadeira, os arqueólogos não precisarão mais escavar o planeta para encontrar nossos rastros, pois estamos deixando registros suficientes para satisfazer totalmente a curiosidade póstera. Mas nunca se sabe: a estupidez humana também é infinita. Numa dessas, os senhores da guerra executam mesmo suas bravatas nucleares e voltamos às cavernas.

Quem pode prever o que virá? Infelizmente, o escritor dinamarquês Hans Christian Andersen não está mais entre nós. Com o título que roubei de uma de suas histórias para esta crônica, ele escreveu quase meio século antes do voo de Santos Dumont: "Daqui a milênios, eles virão em asas de fumaça, pelo ar, atravessando o Atlântico. Os jovens habitantes dos Estados Unidos visitarão a velha Europa. Eles verão os monumentos e as cidades que estão desaparecendo".

O livro é uma obra-prima, e acho que ainda o será daqui a milênios. Não é à toa que seu autor, responsável por clássicos como O Patinho Feio, A Rainha da Neve e A Pequena Vendedora de Fósforos, entre outros, foi homenageado com o Dia Internacional do Livro Infantil, celebrado na data do seu nascimento, 2 de abril. Outro lindo conto da mesma obra - publicada pela antiga Editora Globo, com tradução de Pepita de Leão e ilustrações de Nelson Boeira Faedrich -, preciosidade da minha biblioteca, é Os Doze Passageiros. Descreve a chegada de um ano novo pela imagem de uma diligência com 12 tripulantes prontos para desembarcar. Ninguém, nem eles próprios, sabe o que trarão para nós - conclui.

Não sabemos, mas podemos imaginar e brincar. Se os herdeiros do futuro acharem mesmo nossos esqueletos com celulares na mão, tomara que as baterias tenham acabado para não verem o que circula nas redes sociais, especialmente nesses tempos bélicos de politicagem ensandecida.
NÍLSON SOUZA

segunda-feira, 26 de setembro de 2022


26 DE SETEMBRO DE 2022
EM CASA

As paixões intensas de "Chocolate com Pimenta"

Novela retorna às tardes da RBS TV a partir desta segunda-feira

Como Deborah Blando entoa na música de abertura da novela, as paixões são violentas em Chocolate com Pimenta. Originalmente exibida entre 2003 e 2004, a produção retorna hoje à televisão, com exibição de segunda a sexta na RBS TV, após o Jornal Hoje.

Inspirada na opereta A Viúva Alegre, do compositor húngaro Franz Lehár, a obra é uma das novelas favoritas do público nacional nos últimos anos, o que provavelmente explica a decisão de reprisar o folhetim mais uma vez, após ele ter sido destaque no Vale a Pena Ver de Novo duas vezes, em 2006 e 2012, e na programação do Canal Viva em 2021.

No centro da trama, ambientada em meados de 1920 em Ventura, uma bucólica cidade cuja maior atração é uma fábrica de chocolates, está Ana Francisca, a Aninha (Mariana Ximenes).

Vingança

No primeiro ato uma jovem ingênua e desajeitada, que chega à cidade para viver com os humildes tios em uma fazenda, ela se apaixona pelo garoto de ouro da cidade, Danilo (Murilo Benício). Ele sente o mesmo, mas não o suficiente para defendê-la das atrocidades da mimada Olga (Priscila Fantin), da mesma idade que o casal, também apaixonada pelo garoto e enciumada por Aninha.

Olga, porém, não é a única vilã da história, nem a principal, pois acaba sendo Jezebel (Elizabeth Savala) quem separa o casalzinho, levando, sem querer, Ana para os braços do seu irmão, Ludovico (Ary Fontoura), o dono da fábrica de chocolates. Amigo da protagonista, ele acaba salvando a jovem de um escândalo se casando com ela. Juntos, eles vão para Buenos Aires, onde os últimos resquícios da ingenuidade de Aninha ficam para trás e ela aprende a ser uma "dama". É desta forma que Ana retorna a Ventura, anos depois, no segundo ato do folhetim.

Agora viúva, ela decide se vingar daqueles que a destrataram na juventude, mas nada é assim tão simples, e novas e velhas paixões mudam seus planos no meio do caminho.

O aclamado cinema de Wong Kar-Wai no streaming

A história do mestre chinês das artes marciais Yip Man (1916- 1960), globalmente conhecido como o mentor de Bruce Lee, é narrada com muita ação no drama biográfico O Grande Mestre (2013), que estreou no último domingo no catálogo do Mubi.

O longa-metragem, que se passa às vésperas da invasão japonesa à China em 1936, mostra Yip (interpretado por Tony Leung) enfrentando outros grandes nomes das artes marciais da época, em meio ao tumulto da guerra e às voltas com o amor.

A produção entra para a coleção especial da plataforma de streaming Apaixonante: O Cinema de Wong Kar-Wai, que conta com outros sete títulos do aclamado cineasta chinês de Hong Kong.

Entre eles, está Amor à Flor da Pele (2000), que rendeu o prêmio de melhor ator no Festival de Cannes a Leung; a comédia dramática policial Chungking Express (1994), o longa de ação Ashes of Time Redux (1994) e os romances 2046: Os Segredos do Amor (2004) e Happy Together (1997), todos estrelados por Leung; além de outra comédia policial, Anjos Caídos (1995), e da coletânea de curtas sobre o amor Eros (2004), que conta ainda com produções de Michelangelo Antonioni e Steven Soderbergh.


26 DE SETEMBRO DE 2022
CAPA

Apetite pelo Guns N' Roses

Em sua quarta passagem pela Capital, banda norte-americana tocará sucessos da carreira hoje à noite na Arena do Grêmio

Os anos passam, canções são esquecidas e pessoas ficam pelo caminho. Tudo se transforma. Mas há amores que sobrevivem ao tempo. Que se renovam. Ou que são reacesos vez ou outra, como pode ser o caso do Guns N' Roses. Décadas se foram, e a introdução de Sweet Child O? Mine continua matadora. A farofada de November Rain permanece irresistível. Patience segue assobiável. A grama ainda é verde e as moças são bonitas em Paradise City.

Reaquecendo as paixões dos fãs, o Guns N' Roses se apresenta na Arena do Grêmio hoje, a partir das 21h (veja detalhes sobre ingressos na página 3). Os portões serão abertos às 17h, e a banda Tokyo Drive toca às 18h30min. Menores de 18 anos devem entrar acompanhados de pais ou responsáveis.

É a quarta vez do Guns na capital gaúcha: a primeira foi em 2010, no estacionamento da Fiergs, com aquelas fatídicas quatro horas de atraso; a segunda foi novamente na Fiergs, em 2014; e a terceira, em 2016, no Beira-Rio.

Desta vez, a banda desembarca no Estado com a turnê Guns N' Roses Are F' N' Back!, sendo um dos 13 shows que integram o itinerário do grupo pela América do Sul - oito deles no Brasil. Da formação original, há o vocalista Axl Rose, Slash na guitarra e Duff McKagan no baixo. Somam-se a eles o guitarrista Richard Fortus, o baterista Frank Ferrer e Dizzy Reed e Melissa Reese nos teclados.

Em sua quarta passagem, o Guns traz como novidade o EP Hard Skool, lançado em fevereiro deste ano. Além da faixa-título, a banda tem incluído Absurd no repertório, presente no álbum. Mas, no geral, o setlist foca trabalhos dos anos 1980 e 1990.

Pelo que se viu nas apresentações anteriores, o Guns abre os shows com uma dobradinha do primeiro disco, Appetite For Destruction (1987): It?s So Easy e Mr. Brownstone. Chinese Democracy, que batiza o último disco de estúdio da banda - lançado em 2008 -, tem sido a terceira música. Em seguida, vem Slither, do Velvet Revolver (banda formada por Slash, Duff e outros ex-integrantes enquanto estavam fora do Guns).

Com duração que varia entre 2h30min e pouco mais de 3h, o show traz Axl e companhia presenteando os fãs com clássicos. Além dos hits citados no primeiro parágrafo, o Guns apresenta pedradas como Welcome To The Jungle, Nightrain, Estranged, You Could Be Mine e Civil War.

Também há espaço para as versões, como Knockin? On Heaven?s Door, de Bob Dylan, e Live And Let Die, originalmente de Paul McCartney e seu grupo Wings. Ambas as canções integram a era Use Your Illusion (1991). Em Attitude, dos Misfits, Duff assume os vocais - essa aparece no disco de covers The Spaghetti Incident? (1993).

Tudo isso em um palco com uma extensão de 24 metros de boca de cena e mais de 12 metros de altura. Os trabalhos para a montagem da área do show na Arena começaram na última semana.

Voz

Aos 60 anos, Axl Rose tem passado por problemas na turnê. Antes de um show em Londres, no dia 1° de julho, o vocalista teve uma crise de ansiedade. Ele precisou dormir no estádio onde ocorreu a apresentação e foi acalmado pela equipe de produção. No segundo dia de show na capital inglesa, Axl baixou o tom de algumas músicas para cantar, além de ter reduzido a apresentação.

Em seguida, a banda precisou cancelar uma performance em Glasgow, na Escócia, por problemas na saúde vocal do cantor. Pouco antes, Axl viralizou na web após desafinar em um show em Stavanger, na Noruega, no dia 15 de junho.

Durante show no Rock in Rio, em 8 de setembro, ele teve dificuldades para cantar em determinados momentos da apresentação. Sua voz falhou em alguns trechos, ofegando com frequência entre os versos das canções. Segundo o vocalista, a situação ocorreu por conta de uma tosse que tentou manter sob controle. Em suas redes sociais, ele pediu desculpas após o show.

Contudo, as últimas apresentações do Guns pelo país têm recebido avaliações positivas do público e da imprensa. Se a voz já não é mais a mesma, Axl tem compensado em esforço. Há o público para auxiliá- lo, cantando junto e reaquecendo nostalgias. Também há uma banda sólida por trás, com Slash ainda esmerilhando a guitarra. De qualquer maneira, é a história ainda viva do rock no palco.

 WILLIAM MANSQUE