quarta-feira, 25 de março de 2015


25 de março de 2015 | N° 18112
DAVID COIMBRA

Medo na madrugada

Era uma noite amena, de ar fino, de céu de azul profundo, e eu me sentia inquieto dentro do meu apartamento. Tinha trabalho a fazer, mas algo na rua me chamava. A vida estava acontecendo em algum lugar longe de mim. Corria nas minhas veias e pulsava-me no peito uma ânsia de sair de casa, simplesmente sair de casa. Disse, então, um palavrão para mim mesmo, peguei a carteira e saí.

Às vezes, a gente tem de seguir os instintos, sussurrei, estufando o peito e sorvendo o ar fresco da noite.

Sorri e pensei: nesta noite, a sorte é que vai me guiar. A sorte!

A sorte... Se soubesse o que a noite me reservava, teria ficado feliz na solidão do meu apartamento.

Mas não sabia, e fui em frente. Para o desconhecido.

Morava perto de uma região de bares. A luz amarela de um deles chamou-me a atenção, como se eu fosse um inseto atraído pela lâmpada acesa. E, de certa forma, era isso mesmo que era.

Nunca antes havia entrado naquele bar. Entrei e, já a caminho do balcão, a vi. Jamais a esquecerei. Era morenajambo, longilínea e sinuosa. Nossos olhares se cruzaram enquanto eu pedia um chope. O garçom fez aterrissar o copo na minha frente. Senti o primeiro gole rolar gelado garganta abaixo. Então, um sujeito alto e forte, que estava apoiado no balcão, girou o corpo, olhou-me nos olhos e o que disse a seguir me fez estremecer.

Infelizmente, vou ter que encerrar a história por aqui. Não havia mais espaço, e precisei fazer um corte no texto. Não me critique: na edição, tomei por base o modelo administrativo atual do Estado do Rio Grande do Sul: quando é preciso cortar, corta-se. Pronto.

Já sei. Alguém vai dizer que eu poderia ter abreviado algumas descrições para dar o final da história, porque o final é fundamental para o leitor e blá-blá-blá, assim como alguém vai dizer que em saúde, segurança e educação não se corta, porque são fundamentais para o cidadão, e que a economia no orçamento do Estado poderia ter sido mais radical em outras áreas menos importantes, sim, sim, já sei que haverá quem diga isso a mim e ao governador Sartori.

Mas dirão isso porque não sabem como é difícil cortar um texto pelo meio, sem que perca o sentido, ou como é difícil eliminar despesas em setores que, se não são vitais, causam grande desgaste político ao serem reduzidos ou eliminados.


Muito mais fácil e rápido fazer como eu e Sartori fazemos: remova dois parágrafos e um terço da verba da segurança pública. Se pessoas vão ser sequestradas debaixo de semáforos ou se o leitor ficará furioso porque o texto não tem final, por favor!, que falta de compreensão. Isso é intriga da oposição. Maldita oposição.

Nenhum comentário: