25
de março de 2015 | N° 18112
FÁBIO
PRIKLADNICKI
O GRE-NAL E A INDIFERENÇA
Depois
de uma infância dedicada a álbuns de figurinha de jogadores e uma juventude com
presença marcada no estádio, acho que estou largando o futebol. Não tenho
certeza, pode ser temporário. Não tem nada a ver com a fase do meu time: admito
que não sei muito bem em que fase ele está.
Mas
certo dia acordei de sonhos intranquilos metamorfoseado em uma criatura
indiferente à dupla Gre-Nal. Não me entenda mal: levamos muito tempo para
elevar o futebol a um assunto merecedor de consideração intelectual; longe de
mim defender o contrário. Mas receio que a vida de torcedor, para mim, esteja
definhando. Torçamos pelo contrário.
Nessa
transformação, testemunho um fenômeno cuja existência, admito, ainda não havia
levado em consideração. Sempre que digo a outro gaúcho que não tenho mais
acompanhado a dupla Gre-Nal, presencio uma reação que é um misto de decepção e
desprezo. Há algo que, obviamente, une gremistas e colorados: mesmo em posições
opostas, eles poderiam passar a tarde inteira juntos, em uma mesa de bar, tentando
convencer o outro de que seu time é melhor.
Mas
o que conversar com uma pessoa insensível ao tópico? Descobri que a maior
ofensa ao gaúcho não é questionar sua masculinidade, como sugere o estereótipo:
é ser indiferente à dupla Gre-Nal. Viver no Rio Grande do Sul e não estar em um
dos dois lados é como sentar em uma mesa de pôquer e se recusar a jogar.
Conheço
algumas pessoas que nunca se interessaram por futebol e são sempre instadas a
escolher um lado. Seus interlocutores tentam a todo custo extrair a informação:
“Mas você era gremista ou colorado quando criança?”, “Mas o seu pai torcia para
qual time?”. E assim por diante. Como estar à parte de um assunto pelo qual
alguns chegam, literalmente, a se esbofetear?
Você
pode até desprezar índios, quilombolas e gays e, surpreendentemente, ser um
deputado muito votado. Mas ser indiferente ao Gre-Nal, ah, aí já é uma ofensa
indefensável. Nós, que não fazemos parte dos 99% de torcedores, somos uma
categoria invisível, à espera de um sociólogo generoso para ouvir nossas
queixas.
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