quarta-feira, 11 de março de 2015


11 de março de 2015 | N° 18098
EDUCAÇÃO O VOVÔ DA TURMA

Bixo aos 85 anos

AGRÔNOMO APOSENTADO, Luiz Alberto Ibarra resolveu realizar um antigo desejo: ingressou na faculdade de Direito, em Porto Alegre

Dias antes do início do ano letivo, Luiz Alberto Ibarra estava receoso com o retorno à rotina acadêmica, experiência vivida uma única vez, mais de seis décadas antes.

– Eu nessa idade... – ponderava. – Será que a gurizada vai me aceitar?

A mulher, Suely, tentava amenizar a ansiedade:

– Vai! Tu tá com a cabeça boa.

Depois de uma trajetória dedicada às tradições gaúchas e às atividades como agrônomo e jornalista, seu Luiz, 85 anos completados em fevereiro, decidiu que não poderia mais ignorar uma pendência antiga. Encorajado pelo exemplo de um amigo da mesma faixa etária, matriculou-se no curso de Direito na Faculdade de Desenvolvimento do Rio Grande do Sul (Fadergs), em Porto Alegre. Sonhava com a carreira desde a década de 1940, quando fez amizade com um grupo de estudantes de Agronomia e enveredou por esse caminho. Trabalhou na Emater e no extinto Diário de Notícias. Com a aposentadoria, em 2000, viu- se inquieto nos dias, de súbito, ociosos, e o desejo dos tempos de moço voltou a ser considerado.

“Não caibo em mim de tanto orgulho e emoção!”, escreveu a neta Rafaela no Facebook em 3 de março, junto de uma foto do avô preparado para o primeiro dia como acadêmico, com a pasta pendurada no ombro. “Aos que serão colegas, façam bom proveito de um dos caras mais inteligentes do mundo! Aos professores, que permitam novas descobertas e conhecimentos, mas garanto que eles que ganharão mais”, completou Rafaela, que presenteou o idoso com um gravador para registrar as explanações em aula.

Seu Luiz se sentiu “um estranho no ninho” quando chegou para o primeiro período de Direito Penal I, no prédio da Rua Uruguai, campus Centro da Fadergs.

– Era o vovô da turma. Aquela mocidade, aquela juventude toda. Eu era uma ilha cercada de jovens por todos os lados – conta ele, aos risos.

Aproximou-se dos colegas mais velhos, entre os quais descobriu um jornalista, com quem teve bastante assunto. Arriscou-se também diante de um menino que chegou com um skate debaixo do braço:

– Vai me emprestar para descer as escadas?

Sentado na segunda fileira, tomando notas, seu Luiz deu início ontem à segunda semana como universitário. Na sala de aula com cerca de 30 alunos, quatro deles ainda não completaram 18 anos, como Henrique da Luz, que comentou:

– Me formar em Direito é um sonho. É o sonho dele também. Acho legal.

Em 1h15min de aula, o aposentado fez três intervenções, expondo dúvidas e completando as frases que a professora Natalia Pinzon deixava no ar ao incitar a participação da classe. Relatou a notícia de um crime ouvida no rádio pela manhã, despertando o debate do grupo.

A formatura está 10 semestres distante. Seu Luiz pretende aguardar um pouco para que possa refletir sobre o que fazer com a nova profissão. Se concluir o curso no período previsto, se tornará bacharel aos 90 anos.

– Estou aqui para aproveitar o tempo e modificar a ideia de que o idoso só fica em casa.


larissa.roso@zerohora.com.br

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