24
de março de 2015 | N° 18111
FABRÍCIO
CARPINEJAR
Esperando ser lembrado
Na
minha infância, o Betinho era o menino mais visitado do bairro Petrópolis.
Os
amigos disputavam o convite para passar a tarde em sua residência com piscina. A
única casa com piscina que conhecíamos.
Betinho
girava a maçaneta, e os guris se mandavam para os fundos do seu pátio.
Nem
cumprimentavam, soltavam gritos de euforia para se banhar enquanto o sol
reinava no horizonte.
Betinho
era o menino mais triste da escola. Isolado, de bochechas cansadas. Ninguém
falava realmente com ele. Ninguém perguntava nada: sobre o que sentia, o que
sonhava, o que gostava, o que queria ser quando crescesse. Ninguém mergulhava
em seus olhos azuis, que terminavam cobertos pela lona das pálpebras.
Sua
mãe fazia vista grossa com a casa concorrida, suspirava de alívio pela
popularidade de seu filho e sua legião de amigos. Servia lanchinho com sanduíche
e ki-suco para a roda risonha pulando no trampolim.
Mas
Betinho se escondia no quarto enquanto todos se divertiam lá fora. Não trocava
uma palavra. Não colocava bermuda. Desaparecia nas sombras da residência.
Seu
rosto murchava longe da água. Ele tinha consciência de que os colegas não o
procuravam para estar com ele, mas para frequentar sua piscina.
Quando
eles iam embora, nem perguntavam pelo seu nome, não se despediam, não
agradeciam. Molhavam o corredor sem piedade e batiam a porta.
Betinho
é que questionava onde eles estavam para a mãe, que sempre dizia:
– Ué,
já foram! Há muito tempo.
Há romances
em que somos o Betinho.
Você
ama e a outra pessoa passa reto pelo seu amor interessada naquilo que você tem,
não naquilo que você é.
É o
que pode proporcionar, são suas facilidades, é onde você mora, é o seu sucesso,
é a sua pose, é o contexto de sua vida, não a sua vida.
Você
se vê mais solitário do que antes, inventando ouvidos, delirando com surpresas
que não vêm, esperando ser lembrado dentro de sua própria casa.
Conversar
com as paredes seria mais honesto.
Você
nunca recebe atenção exclusiva, é menor do que sua televisão, é menos
importante do que seu quarto e seu chuveiro, é secundado pelas cervejas geladas
de seu freezer, é inferior ao seu carro.
Você
não abre a boca, você não confessa suas memórias, você poderia sair ou morrer e
não seria notado.
Você
é capaz de oferecer dezenas de cafés na cama e jamais receber um. Não existe a
contrapartida, só seu coração partido.
Quanto
mais dá, mais pensa que é pouco. Já a outra pessoa, quanto menos dá, mais pensa
que está economizando e realizando um bom negócio.
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