quinta-feira, 26 de março de 2015


26 de março de 2015 | N° 18113
CARLOS GERBASE

QUADRILHAS DE AUTORIDADES

Numa das melhores cenas do documentário Tiros em Columbine, Michael Moore entrevista Dick Herlan, produtor do reality show Cops (“Policiais”). Esse programa mostra, basicamente, perseguições a criminosos negros e hispânicos, que são capturados, jogados no chão, algemados e conduzidos (muitas vezes sem camisa) para a prisão.

Moore, que está investigando as raízes da violência nos Estados Unidos, sugere a Herlan que faça um programa chamado Corporate Cops (“Policiais de Corporações”), que mostraria a polícia atuando contra as quadrilhas que organizam esquemas fraudulentos para desviar recursos públicos e lesar os cidadãos norte-americanos em milhões de dólares. Moore afirma que a audiência seria grande, e Herlan responde:

– Concordo com você e, se conseguir achar uma organização policial que julgasse quadrilhas de criminosos apropriadamente, que as perseguisse de forma apropriada... Quero dizer, o que faria com alguém que roubou uma bolsa com US$ 85, e o que faria com alguém que roubou US$ 85 milhões dos pobres? Essa eu queria filmar. Mas, quando a polícia pega o cara que roubou US$ 85 milhões, ele é tratado como se fosse uma autoridade, sendo ou não sendo.

Estamos assistindo aqui no Brasil a uma espécie de Corporate Cops nos jornais e na TV. E, embora seja bem saudável saber que grandes empresários e funcionários públicos de alto escalão – que aparentemente roubaram muito dinheiro dos pobres – estão passando um tempo na cadeia, eles continuam sendo tratados como autoridades. A situação fica ainda mais absurda em relação aos que aderiram à delação premiada, pois o acordo permite que o alcaguete de terno e gravata tenha uma série de vantagens, inclusive a de posar como “colaborador da justiça”.


Quem deveria ser tratado com mais rigor? Um sujeito que, desempregado, miserável e semianalfabeto, surrupiou R$ 85 de uma bolsa num ônibus lotado, ou um servidor público, com curso universitário completo e salário generoso, que roubou R$ 85 milhões? Os dois foram imorais e transgrediram a lei, mas quem deveria ser atirado ao chão com mais violência, ter as algemas mais apertadas e ficar em celas mais lotadas? Dick Herlan continua sem boas cenas para o reality que todos nós gostaríamos de ver.

Nenhum comentário: