DANUZA LEÃO
Triste
país
Tem
horas que nem sei o que dizer. Será que esse país não vai ter jeito nunca?
Lembro
bem; era um domingo de sol em outubro ou novembro de 1955, e acordei com o rádio
noticiando que o hotel Vogue estava pegando fogo.
O
Vogue era na Princesa Isabel, no Rio, e no andar térreo funcionava a boate mais
famosa da cidade.
Era
lá que se encontravam os políticos (a capital da República ainda era aqui), as
beldades e o high society em geral. Não havia jantar, coquetel, festa, que não
terminasse no Vogue, onde as crooners eram Linda Batista e Araci de Almeida,
olha que luxo; às vezes aparecia Dolores Duran para dar uma canja.
Só saiamos
de lá com o sol raiando, e vivíamos intensamente os anos dourados, onde se nem
todos eram felizes, todos pareciam ser. Foi a melhor boate que o Rio já teve.
No
dia do incêndio a cidade inteira foi para a porta do hotel. Ou pelo menos todos
os amigos dos que lá moravam. A agonia foi lenta, durou horas. As escadas do
hotel eram forradas de madeira, o que ajudou o fogo a rapidamente chegar ao último
andar (eram 12).
Como
num incêndio não se pode usar o elevador, e pelas escadas em chamas ninguém
podia descer, ficaram todos em seus quartos esperando por um milagre, o que não
aconteceu. Chegaram os bombeiros, mas suas escadas iam só até o 4º andar; um boêmio
muito conhecido na época, o Dantinhas, teve sangue frio para conseguir se
salvar.
Ele
pegou os lençóis, amarrou um no outro, molhou, para que os nós não se
desfizessem, se vestiu inteiro -conta a lenda que não se esqueceu nem de botar
a pérola na gravata- e desceu pelos lençóis até encontrar, mais abaixo, a
escada dos bombeiros.
Foi
o único que se salvou (e quando chegou na rua não falou com ninguém; foi para
um bar ali perto, onde tomou uma garrafa de uísque inteira).
Os
recém casados Glorinha e Waldemar Schiller foram encontrados abraçados, mortos,
dentro da banheira, e duas pessoas se jogaram da janela, entre elas um cantor
americano que fazia o show do Vogue naquele momento. Foi uma tragédia que
abalou o Rio de Janeiro; quem viu nunca esqueceu.
Promessas
foram feitas pelo chefe do Corpo de Bombeiros, pelas autoridades; aquilo havia
sido uma lição, nunca mais nada de parecido aconteceria. Pois esta semana, 57
anos depois, a história se repetiu.
Um
prédio no Leblon pegou fogo -e a tragédia só não foi maior porque o prédio
tinha apenas quatro andares. Mas um casal não resistiu às chamas, se atirou e
morreu- ela com 33 anos, ele com 57; eles pareciam muito felizes.
A
assessoria do Corpo de Bombeiros declarou que no Rio existem apenas três
unidades que têm plataformas e escadas; escadas tão curtas que nem chegam ao
quarto andar. E o hidrante não tinha água, claro.
Dizer
o quê? Que o Brasil continua o mesmo de 57 anos atrás, que ninguém faz nada
para melhorar os serviço mais elementares, que os bueiros explodem, as escadas
dos bombeiros são pequenas, mas que, segundo nossos dirigentes, o Brasil -o
Rio, sobretudo- está bombando?
O
governador declarou que o socorro foi de padrão internacional, que tal? Claro,
ele deve estar comparando com Paris, onde passa a maior parte do tempo; já o
nosso prefeito só pensa em carnaval, em samba, em alegria. Eu preferia ter um
prefeito e um governador mais sérios, que cuidassem mais da nossa cidade e de
seus habitantes.
Aliás,
não me consta que o prefeito esteja estudando uma solução para os blocos, que
este ano passaram de todos os limites; ele acha que é legal uma cidade animada.
Tem
horas que nem sei o que dizer. Será que esse país não vai ter jeito nunca? As
escadas dos bombeiros eram e continuam sendo pequenas? Então, feche-se o Corpo
de Bombeiros, por sua inutilidade.
E
aproveitando o embalo, fecha-se Brasília.
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