16
de março de 2013 | N° 17373
NILSON
SOUZA
Sinais de
fumaça
Embora
alguns cardeais naveguem com desenvoltura nas redes sociais, o Vaticano usou o
mais pretérito dos recursos de comunicação para informar ao mundo o andamento
do processo de escolha do novo papa: fumaça preta para dizer “nada feito”,
fumaça branca para anunciar a esperada notícia. Ou inesperada, pois acabou
dando o pouco cotado representante da Argentina.
A
internet das fogueiras, pelo que andei lendo, foi inventada por soldados
chineses, que se posicionavam ao longo da Grande Muralha e queimavam um
preparado asqueroso (esterco de lobo, salitre e enxofre) para produzir a
mensagem esfumarada de alerta sobre eventuais ataques inimigos.
Mas
foram os índios americanos dos filmes do velho oeste que popularizaram o código
morse vaporoso. Eles abanavam tapetes ou cobertores sobre fogueiras e avisavam
o restante da tribo, com bolinhas de fumaça de vários tamanhos, de que a
cavalaria estava chegando pela retaguarda.
Muito
engenhoso, com a desvantagem de que qualquer pessoa alfabetizada na linguagem
fumegante podia ler também. Além disso, o sistema dependia de repetidoras para
atingir grandes distâncias, o que certamente aumentava o risco de
mal-entendidos. Mais ou menos como naquela brincadeira infantil do telefone sem
fio: o que se diz no ouvido do colega no início da fila quase sempre chega com
ruídos no final – e não poucas vezes a mensagem é completamente deturpada.
Reflito
sobre essas precárias formas de comunicação à distância e me dou conta de que
não evoluímos tanto assim. Mesmo com a parafernália de equipamentos de que
dispomos hoje para a comunicação instantânea, os mal-entendidos continuam.
E
não estou me referindo apenas à novilíngua que a gurizada utiliza nas suas mensagens
digitais, com absoluta preferência pelas consoantes (BLZ GLR, KKKK!!!).
Refiro-me à dificuldade de muitos patrícios para interpretar corretamente um
texto escrito, mesmo quando o autor acerta na ortografia e na gramática. O
emissor tenta dizer uma coisa e o receptor entende outra, ou não compreende
nada. O analfabetismo funcional, infelizmente, é uma realidade brasileira.
Mas
a incompreensão não tem fronteiras físicas nem históricas. Cada cabeça, uma
sentença – diz o antigo aforismo. Basta pedir a duas pessoas para descrever o
mesmo fato ou a mesma paisagem para que se tenha dois relatos completamente
distintos. Vemos o mundo e nos expressamos de acordo com nossa bagagem
cultural, com nossos conceitos e preconceitos. Vivemos numa Torre de Babel, da
qual só se pode entrar e sair pela escada da tolerância.
E de
repente a fumaça branca nos traz um argentino humilde e simpático. Que coisa!
Que lição!
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