quarta-feira, 27 de março de 2013



27 de março de 2013 | N° 17384
ARTIGOS - Pio Giovani Dresch*

A quem serve?

Há alguns meses, ao participar de programa de debates no rádio, ouvi de um político que não cansa de enaltecer as próprias virtudes a afirmação de que a maioria dos deputados é corrupta. Quando o instei a esclarecer se isso também valia para os deputados do Rio Grande do Sul, não vacilou em responder afirmativamente.

Lembrei do episódio nos últimos dias, ao ler as notícias referentes a afirmações do presidente do Supremo Tribunal Federal, também do CNJ, que genericamente atribuiu a magistrados conluios com advogados em ações judiciais.

Embora não acredite que o propósito dessa afirmação seja o mesmo do que parecia mover o mencionado político, para o qual o ato de apontar o pecado do vizinho parece constituir a medida de sua própria santidade, não deixa de me preocupar o fato de que a autoridade máxima do Judiciário, na esteira do que já fez a antiga corregedora nacional de Justiça, lance sobre a magistratura nacional semelhante generalização.

Afastando o propósito autolouvador, que bem poderia ser atribuído a quem tem aspirações políticas, tento entender o que move alguns próceres do Judiciário a fazer alegações tão levianas.

Ideologicamente, duas hipóteses poderiam ser consideradas: uma ideia privatista, que necessita da desvalorização de tudo o que é público, para assim obter a privatização do Estado; ou então um populismo autoritário, que concentra em algumas figuras messiânicas todas as virtudes do poder, e em contrapartida escancara os defeitos – reais ou imaginários – das instituições democráticas e de seus agentes.

Descarto a primeira hipótese: a escandalosa quebra dos mercados financeiros, ocorrida há alguns anos, afastou a hegemonia de uma ideia de sociedade em que o Estado era reduzido a mera instância formal, sem incidência de fato sobre os arranjos da economia e da sociedade.

Resta-me a segunda, e não posso deixar de me preocupar: a genérica atribuição de qualidades negativas a agentes públicos – nesse ponto, “há conluios entre juízes e advogados” não difere de “a maioria dos deputados é corrupta” – pode revelar um descrédito nas instituições e serve de trampolim para projetos pessoais que desprezam as regras democráticas e enaltecem os portadores individuais das virtudes redentoras – vide o precedente histórico do caçador de marajás –, que apenas formalmente mantêm íntegras as instituições.

Espero que não seja o que está a ocorrer, mas não seria demais pedir à presidente da República que na próxima indicação de ministro a um dos tribunais de Brasília acrescente a profissão de fé democrática às exigências constitucionais de notável saber jurídico e reputação ilibada.

*PRESIDENTE DA AJURIS

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