26
de março de 2013 | N° 17383
LUÍS
AUGUSTO FISCHER
Perseverar em ser
Em
começos de 1957, na revista La Biblioteca, de Buenos Aires, Jorge Luis Borges
publicou pela primeira um texto que faria um sucesso mundial nos anos seguintes:
Borges e Eu, se chamava. Em livro, saiu em 1960, no clássico El Hacedor, quer
dizer, “O fazedor”, que parece um título trivial mas que Borges sabia pertencer
ao subterrâneo da arte desde os gregos: “poeta”, em grego, quer dizer
exatamente “o fazedor”, “aquele que faz”.
Aquele
Borges que fez obra capaz de assustar o mundo todo escreveu, nesse conto com
cara de depoimento e ar de poema, um relato de como um sujeito chamado Borges
era diferente de outro sujeito chamado Borges, sendo os dois a mesma pessoa.
A
horas tantas, lemos a seguinte passagem: “Espinosa entendeu que todas as coisas
querem perseverar em seu ser; a pedra eternamente quer ser pedra e o tigre, um
tigre”. Depois dela, o narrador do texto continua lamentando ser quem é e
precisar conviver com o outro, o vaidoso Borges.
Em 1967,
a 27 de dezembro, no auge de sua carreira como acontecera a Borges em 1957,
Nelson Rodrigues estampa uma crônica excelente, como não raro ocorreu entre
esse ano e 1969 ou 1970. Em livro, ela apareceu no ano seguinte, sob o título
clássico de O Óbvio Ululante.
Não
tenho qualquer base documental para afirmar, mas afirmo que ao escrever o texto
Nelson não conhecia o texto de Borges acima citado, o que não o impediu de
estabelecer a seguinte tese: “O ser humano é o único que se falsifica. Um tigre
há de ser tigre eternamente”. E estende a afirmação a leão, sapo e marreco, que
perseveram em seu ser, sem erro.
Um cético
elegante, portenho de fino humor, brincando com a ambivalência, sob o signo do
duplo, tão caro a tantos outros escritores; outro um pernambucano-carioca
desabrido, afiado na ironia, sempre à procura de um absoluto que existia no
amor, no clássico de futebol, na dor. E os dois contrastando as dualidades ao
tigre, que desde muito tempo se associa a Dionísio, ou Baco. Bá.
Falando
em ser e ajudar a ser: a Associação De Peito Aberto (www.depeitoaberto.org) está
promovendo uma exposição de arte solidária, para arrecadar fundos para as crianças
que atende, vítimas de doenças respiratórias severas. Vale conhecer as fotos de
Fernando Kluwe Dias e as pinturas de Cecília Machado Bueno, no Espaço Leve :
Veridiano
Farias, 122, Petrópolis.
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