27
de março de 2013 | N° 17384
MARTHA
MEDEIROS
Apegos
Dizem
alguns filósofos e também os budistas: o apego é a causa de todas as nossas
dores emocionais. Concordo, mas faço ressalvas. O apego também provoca inúmeras
alegrias e satisfações. Não faz sentido evitar filhos, paixões e amizades a fim
de se proteger de tristezas, preocupações e frustrações. Passar uma vida
inteira desapegada das pessoas seria entregar-se ao vazio existencial – e nunca
ouvi dizer que isso gerasse bem-estar. Desapegar-se em troca de paz é uma falácia,
só demonstra covardia de viver.
Não
haveria um caminho do meio? Xeretando ainda mais os livros de filosofia,
encontrei algo do romeno Cioran que me pareceu chegar bem perto de uma saída
para o impasse. Diz ele que a única forma de viver sem drama é suportar os
defeitos dos demais sem pretender que sejam corrigidos.
Eis
aí uma fórmula bem razoável para não se estressar. Apegue-se, tudo bem, mas com
100% de tolerância. Em tese, é perfeito.
Em
menos de poucos segundos, consigo listar tudo o que me incomoda nas pessoas que
mais amo. Conseguiria listar também o que me faz amá-las, é claro, mas o ser
humano veio com um chip do contra: os defeitos dos outros sempre parecem mais
significativos do que suas qualidades. Depois de um longo tempo de convívio,
aquilo que nos exaspera torna-se mais relevante do que aquilo que nos extasia.
Pois
a recomendação é: exaspere-se, mas saiba que não vai adiantar. Nada do que você
disser, nenhuma cobrança, nenhum discurso, nenhuma novena, nada fará com que os
defeitos do seu pai, da sua mãe, do seu marido, da sua mulher ou dos seus
filhos desapareçam num passe de mágica. Assim como os seus também jamais
evaporarão, por mais que os outros rezem e supliquem pra você deixar de ser tão
........... (preencha os pontinhos). Você é capaz de reconhecer seu defeito
mais insuportável?
Só mesmo
passando uma longa temporada num mosteiro do Tibete para desenvolver a
capacidade de aceitar tudo o que nos tira do sério. Seu filho indiferente, seu
marido pão-duro, sua mãe mal-humorada, sua amiga carente, seu chefe durão, seu
zelador folgado, sua irmã fofoqueira, seu colega chatonildo – imagine que paraíso
se pudéssemos relevar essas e tantas outras diferenças, comungando com os
defeitos alheios sem nunca mais esperar que os outros mudem. Deixar de esperar é
uma libertação.
Pois
não espere mesmo, pois ninguém vai mudar nem um bocadinho. Nem você, nem
aqueles que você tanto ama, por mais que você pense que é fácil alguém deixar
de ser ranzinza, orgulhoso ou o que for. Aceite todos como são e, aleluia: drama,
nunca mais. Se conseguir, tem um troféu esperando por você, além de prêmio em
dinheiro e uma foto autografada do Buda.
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