CLÓVIS
ROSSI - COLUNISTA DA FOLHA
Dilma só disse na África o que
sempre pensou e até já disse
O
que a presidente Dilma Rousseff disse na África do Sul sobre inflação e
crescimento é rigorosamente o que ela pensa -e faz tempo, pelo menos desde que
assumiu, há dois anos e três meses.
Não
há, portanto, nenhuma razão nem para polêmica, nem para surpresa, nem para
"manipulação", a não ser que a presidente tenha usado essa última
palavra para se referir à especulação nos mercados. O lado cassino dos
mercados, aliás, é suficientemente forte, para dispensar frases da presidente
-felizes ou infelizes- nas apostas.
A
primeira mais firme manifestação de Dilma em favor do crescimento se deu,
curiosamente, às margens de outra cúpula dos Brics, a de abril de 2011 na
China.
O
governo mal completara cem dias, mas já estava em dúvida o empenho do Banco
Central em trazer a inflação para o centro da meta, 4,5% então como agora.
No
Fórum de Boao, considerado "Davos" da Ásia, Dilma reafirmou que são
fundamentais "o controle da inflação e a estabilidade fiscal", para
depois deixar claro que ambos não são um fim em si mesmo nem valor absoluto.
"Tem
quer ter como objetivo criar condições para o crescimento e a inclusão
social", disse. Nesse ponto, a presidente afirmou, com outras palavras, o
que repetiria em Durban, ao criticar "políticas restritivas tanto nos
países emergentes para conter a inflação como nos países avançados para
promover a consolidação fiscal".
A
presidente fez questão de se dizer favorável "ao controle da inflação e à
estabilidade fiscal", desde que o objetivo seja crescimento com inclusão
social, que é "questão-chave para todos nós".
Também
na China Dilma deu por sepultados "os consensos que se criaram na história
recente. Sob a égide do mercado ou do Estado, mostraram-se frágeis como
castelos de cartas".
Não
receitou, no entanto, um novo consenso, até porque afirmou não buscar
"modelos únicos nem tampouco unanimidades". A única receita é fácil
de dizer, difícil de descobrir: "O mundo do século 21 requer
criatividade".
Vê-se
agora que nem Dilma nem o mundo tiveram criatividade suficiente para pôr de pé
outro modelo, se está superada, como ela crê, a política de "matar o
doente [com juros altos] em vez de curar a doença [a inflação]".
Na
vida real, a queda dos juros, praticada por seu governo, foi incapaz até agora
de acelerar o crescimento. Pior: a "doença" da inflação parece mais
viva e forte.
Mas
é injusto dizer que a presidente é leniente com a inflação. Nenhum governante o
é, desde que se tornaram famosos dois gráficos que Getúlio Bittencourt, então
assessor de imprensa do presidente José Sarney, exibia a todos: a popularidade
do presidente apontava para baixo sempre que a inflação embicava para cima e
vice-versa.
Como
não há político que não adore a popularidade, todos querem a inflação
domesticada. Dilma também quer, desde que o crescimento não seja afetado no
percurso. Como perpetrar a mágica é a matéria em que o governo está ficando em
segunda época.
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