03 de outubro de 2012 |
N° 17211
ARTIGOS - Marisa Faermann
Eizirik*
Amor, uma nova ética?
Enamoramento, paixão, desejo,
erotismo, são sinônimos de amor que utilizamos. Destaco, dentre esses, o
erotismo. Como se pode compreendê-lo, em nossos “modernos” tempos? Que sinais
temos de seu percurso, tão semovente e mutável ao longo da história, do pudor e
dos véus, dos subentendidos e dos toques, dos mistérios dos olhares, das
seduções e fetiches de todas as épocas?
Estaremos observando a morte do
erotismo, em face do grande “mercado” do amor?
Mas que fenômeno é esse, o amor,
em que se vende sadomasoquismo travestido em conto de fadas? A virgindade, com
todos os requintes de um reality show? Teremos abandonado o conceito platônico
de amor como falta, desejo de completude no encontro com a outra “metade”
perdida, fundamento de toda forma romântica do amor? Ou, utilizamos novas
estratégias e, até mesmo, tecnologias, para seguir buscando “o encontro”,
alguém com quem dividir nossos sonhos e anseios incansáveis?
Será que não seguimos desejando
encontrar o príncipe ou princesa (os diferentes tons de Cinza [Greys]) que
podem estar nos esperando na curva de algum caminho? Estaremos em luta contra o
idealismo romântico e o ceticismo estoico?
Teremos medo da intimidade, da
solidão, da morte? Queremos respostas para um fenômeno tão complexo como o
amor, que se desdobra em nuances (bem descritas por W. Riso em Amores de Alto
Risco)?
O amor torturante, o amor
desconfiado, o amor subversivo, o amor egoísta, o amor perfeccionista, o amor
violento, o amor desvinculado ou indiferente, o amor caótico, o amor saudável
(ou a sabedoria do “não”).
Ou no fenômeno
sociológico-editorial de Cinquenta Tons de Cinza, de E.L. James, que mesmeriza
40 milhões de leitores no planeta (mulheres, em sua enorme maioria),
independentemente de idade, estado civil e nível cultural? Ou, ainda, na empreitada
de Virgins Wanted, documentário realizado pelo cineasta australiano Justin
Sisely, que busca moças virgens desejosas de vender esse “produto” tão raro
atualmente, beneficiando a dona do corpo e o “empreendimento” cinematográfico
que produz e vende.
Nos aventurarmos a responder é,
certamente, uma tarefa de alto risco e, também, atribuir tudo à sede de
consumo, ao lucro e a voragem do capital, empobrecedora e reducionista. Vivemos
a orfandade dos estereótipos, do status congelado das evidências, o coma
anestesiado do excesso (fluxo, velocidade e intensidade da informação), sob o
efeito dos discursos vazios, da tirania da mídia, do peso econômico do lucro.
Me atrevo a pensar que estamos atravessando uma crise ética, ou, a inscrição em
uma dimensão ética desconhecida, ainda sem registro.
Os cânones conceituais, os
princípios organizadores de nossos pensamentos e práticas, se descolorem,
debilitam e colapsam. Não temos hipóteses plausíveis, ferramentas explicativas
eficazes, nem próteses convincentes, que aliviem o mal-estar gerado pela
incerteza, a fugacidade, a inconstância dos valores.
O Ocidente construiu um
formidável dispositivo de sexualidade, entrelaçando verdade e sexo. De que
formas estamos nos constituindo como sujeitos, com a falta de espessura, a
tirania do breve, do descartável, da total “transparência” (ou será
opacidade?), da ausência do encantamento, do mistério? Estamos em mutação. Uma
outra ética subjetiva contempla as questões do amor. Uma nuvem de ignorância
nos envolve, e instiga.
*PSICÓLOGA
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