30
de maio de 2013 | N° 17448
FÁBIO
PRIKLADNICKI
Música para se indignar
De
vez em quando, surge um desses discos com vocação para trilha sonora de uma
geração. É o caso do terceiro trabalho da banda Apanhador Só (o segundo de inéditas),
intitulado Antes que Tu Conte Outra, disponível para download gratuito no site
da banda (apanhadorso.com) desde a semana passada.
A
Apanhador Só lançou um excelente disco homônimo em 2010. Um ano depois, veio a
fita cassete (?) Acústico-Sucateiro. Antes que Tu Conte Outra é mais nervoso e
bem menos bonitinho. O recurso de utilizar sons diversos e ruídos para compor a
atmosfera das músicas agora assume o primeiro plano e disputa atenção com os
instrumentos.
Chega
a incomodar, mas acho que essa é a intenção. Uma vez que você esteja
acostumado, a beleza – sim, a beleza – das composições se sobressai, e os
rapazes se revelam excelentes melodistas. Daqui a pouco, as músicas não saem da
sua cabeça.
A
Apanhador Só tem o que falta a muitos jovens envolvidos com a arte da criação: ideias.
E política. Não me entenda mal: política no sentido de posicionamento, de
valores. É o som de um pessoal que talvez não saiba exatamente o que quer, mas
sabe o que não quer. Ainda está vivo na memória o protesto que colocou abaixo o
tatu inflável da Copa, em outubro de 2012, em Porto Alegre.
Entre
os motivos da manifestação, estava a luta contra a privatização do espeço público
– o mascote literalmente vestia a camiseta de uma marca de refrigerante. Pois,
em uma das músicas do mais recente disco, a Apanhador Só ironiza um certo líquido
preto “que é uma delícia / te deixa gorda/ ninguém sabe a fórmula / mas tem
muito sódio”. Não sugiro que a manifestação tenha motivado a música, mas as
coincidências também fazem parte do espírito do tempo.
Mais
de uma composição do álbum chama o interlocutor para um acerto de contas. Mordido
diz assim: “Negócio aí não é nada mais do que nã nã e meter no nosso”. Por Trás
questiona: “Qual é, afinal, o peixe que tu tá vendendo?” Pense nas manifestações
que pediram – e conseguiram – a revogação do aumento do preço das passagens de ônibus
na Capital, entre março e abril.
Pense
em qualquer outro protesto – por exemplo, contra o corte de árvores. A
Apanhador Só tem a trilha para a sua indignação. Não é sempre que se vê jovens
talentosos respondendo aos anseios de seus pares com tanto barulho e, ao mesmo
tempo, tanta melodia.
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