31
de maio de 2013 | N° 17449
PAULO
SANT’ANA
Cada um na sua
Vejo
pessoas empenhadas em promover a Copa das Confederações e a Copa do Mundo no
Brasil, enquanto eu tristemente estou empenhado em clamar para que os poderes
públicos melhorem a assustadora situação das filas em consultas e cirurgias do
SUS.
Também
gosto de futebol, por sinal a minha origem no jornalismo. Mas a gente tem de
ter prioridades, a minha é a situação da saúde pública brasileira.
Não
tenho nada contra os que aplaudem a iniciativa do governo brasileiro de gastar
bilhões de reais para realizar as duas Copas. Mas me recuso a ser puxa-saco de
governo que gasta fortunas colossais com as duas Copas e continua
miseravelmente abandonando a saúde pública, jogando os pacientes nacionais à
dor, à mutilação e à morte.
Cada
gol que for marcado nas duas Copas corresponderá a milhares de pacientes
abandonados à própria sorte, a milhares de pessoas não atendidas nas
emergências dos hospitais, a milhares que morrem sem cirurgias e sem consultas.
Golaços!
Infelizmente não poderei aplaudi-los.
Cada
um na sua: de um lado, os cantores e elogiadores das duas Copas, eu prefiro ser
cantor do réquiem dos doentes abandonados.
No
meu delírio sanitarista, chego a imaginar todos os jogos de futebol das duas
Copas sendo arbitrados não por juízes de vestes coloridas, mas por médicos e
enfermeiros vestidos de preto, os juízes e os bandeirinhas em luto pela saúde
brasileira.
Dia
haverá em que o Brasil sediará a Copa do Mundo da Saúde!
Dizem
os aduladores das duas Copas que, se elas não fossem realizadas, a saúde
pública continuaria abandonada no Brasil. Só que então nosso país seria mais
coerente: manteria abandonados e à porta da morte os pacientes mas não se daria
ao luxo, ao mesmo tempo, de gastar bilhões e mais bilhões de reais com o
entretenimento de torcedores que daqui a pouco, ali adiante, serão recusados
pelos hospitais, apodrecerão nas filas do SUS e morrerão à míngua, sem
assistência médica.
Hoje,
lotando os estádios construídos pelos contribuintes, amanhã perecendo como
pacientes recusados pelo sistema sinistro.
Melhor
seria não sediar as duas Copas, isso em nada melhoraria a saúde pública.
Mas
manter a saúde pública abandonada e sediar as duas Copas bilionárias é um
acinte, um escárnio, um desaforo nacional que retumbará na repercussão por todo
o mundo.
Por
sinal, os estrangeiros, ao ver o fausto dos estádios e de todas as outras obras
em torno das duas Copas, imaginarão que quem faz duas festas faustosas dessas
com certeza atende bem os seus doentes.
Ledo
engano! O futebol estará em alta, os doentes em baixa, doentes que não recebem
alta porque nunca conseguiram dar baixa nos hospitais.
Mas
eu preciso manter-me assim, ridículo mas digno. Vou ver as duas Copas pela
televisão, mas sem esquecer-me das crianças, dos idosos, dos adultos
desprezados pelas estruturas assassinas do fingimento de atendimento da saúde.
Se
eu saudasse, neste contexto, a realização das duas Copas, estaria também
fingindo orgulho. Quando
o que sinto é vergonha.
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