MARCELO
GLEISER
Universo consciente?
Para
o físico John Wheeler, a existência da partícula depende de sua interação com a
consciência humana
Entre
os vários mistérios da física contemporânea, poucos se comparam à existência de
não localidade na física quântica. Não localidade significa que interações
entre entidades separadas podem ocorrer instantaneamente. É como se o espaço e
o tempo não existissem!
Quando
uma bola vai ao gol ou uma gota de chuva cai, existe um efeito local por trás: o
chute, a nuvem carregada. No mundo quântico, dos elétrons e fótons --as partículas
de luz--, efeitos podem ocorrer sem causa local, algo de que tratei na coluna
do dia 28 de abril.
Imagine
gêmeos, um em São Paulo e outro em Manaus. Entram num bar, um em cada cidade. Se
o de São Paulo pede pinga, o de Manaus pede chope. Se o de São Paulo pede
chope, o de Manaus pede pinga. Isso ao mesmo tempo, como se soubessem o que o outro
pediu. Como é possível, dado que estão longe e não podem se comunicar?
Essa
sincronicidade, se não com gêmeos, foi verificada entre pares de partículas em
experimentos à distância que comprovam que a correlação é mais rápida do que a
velocidade da luz.
Imagino
que muitos leitores estejam pensando na premonição, na sincronicidade junguiana
etc.
Lembro
que o cérebro humano e os pares de fótons são "sistemas" bem
diferentes. Mas cientistas sérios, como o vencedor do Nobel Eugene Wigner e seu
colega de Princeton John Wheeler, se questionaram sobre o papel da mente na física.
Quando
medimos algo usamos um detector. Não temos contato direto com um elétron. Sua
existência é registrada quando interage com o detector e ouvimos um clique ou
vemos um ponteiro mexer.
Na
interpretação "ortodoxa" da física quântica, é essa interação que
determina a existência da partícula: antes da medida, não podemos nem dizer que
a partícula existe.
Wigner
e Wheeler acham que, sem um observador, essa medida não faz sentido; foi o
observador que montou o detector. A existência da partícula depende de interação
com a consciência humana: mais dramaticamente, a consciência determina a
realidade em que vivemos.
Wheeler
imaginou um experimento no qual uma partícula passa por um anteparo com dois
orifícios e vai de encontro a uma tela móvel. Atrás dela, há dois detectores
alinhados com os orifícios. Se a tela é retirada, os detectores acusam por qual
orifício a partícula passou.
Porém,
no mundo quântico, partículas podem agir como ondas. Ondas passando por dois
orifícios criam padrões de interferência, estrias claras e escuras.
Portanto,
duas opções: com tela vemos interferência, sem tela vemos detecção de uma partícula.
Wheeler
sugeriu que a tela fosse retirada após a partícula ter passado pelo anteparo. Por
meio da sua escolha, o observador cria a propriedade física da partícula agindo
retroativamente no tempo! O incrível é que a previsão de Wheeler foi confirmada.
Observador e observado formam uma entidade única que existe fora do tempo.
Wheeler
extrapolou: "Não somos observadores no Universo, somos participadores. Sem
consciência, o mundo não existe! O Universo gera a consciência e a consciência
dá significado ao Universo". Essa visão traz o dilema: será que o Universo
só faz sentido porque existimos?
MARCELO
GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e
autor de "Criação Imperfeita". Facebook: goo.gl/93dHI
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