07
de abril de 2013 | N° 17395
VERISSIMO
Poemas
Poesia
é isso mesmo, não é? Perguntas sem respostas
Prezado
M:Recebi o e-mail com seu mais novo poema e entendo seu entusiasmo. Realmente,
é um raro exemplo de exteriorização poética da angústia moderna, a começar pela
reiteração inicial: ‘Eu mato, eu mato...’
A
brutal assertiva evoca à perfeição a têmpera destes dias, o nosso “zeitgeist”.
Perderam-se as ilusões com a justiça, com as esperanças de regeneração e com
todas as instâncias jurídicas. Vivemos num deserto de valores morais. O poeta
não diz “eu reprimendo”, “eu castigo”, “eu mando prender”, “eu condeno”. Diz e
repete “eu mato”.
Que
retribuição se pode esperar onde a justiça não faz justiça e a cadeia não
segura o ladrão? O poeta ameaça fazer sua própria justiça porque não existe
outra. Revertemos ao animal primevo com as presas à mostra, num ricto de
vingança selvagem. Uma hiena ganindo entre as ruínas de uma civilização falida.
Segue
o poema:
‘...quem
roubou minha cueca...’
Há
aqui algo que evoca Eliot, com seu constante recurso ao aparentemente banal —
no caso, a cueca – em contraponto a alusões clássicas e míticas, e que acabou
sendo um viés da poesia moderna (Auden, Drummond). Não seria, talvez, demais
ler a cueca como metáfora. A cueca representa o que temos de mais íntimo,
recôndito, profundo. O que temos de mais nosso. O que o “zeitgeist” nos roubou.
Ou seja: a nossa alma. Onde está “cueca” leia-se “alma”. Sem a cueca ficamos
nus. Sem a alma também estamos reduzidos a apenas nosso corpo.
Mas
quem roubou a nossa cueca/alma? Quem trouxe nosso corpo desprotegidos para este
deserto?
Quem
merece a raiva do poeta? Que a raiva é merecida fica evidente na última linha
do verso:
‘...
pra fazer pano de prato!´
A
suprema degradação. Nossa alma secando pratos. O fim de uma geração que
conseguiu chegar à Lua, mas se perdeu no caminho da privada. Quem é o culpado?
Também queremos ganir de indignação como o poeta mas não sabemos em que
direção. Para o alto? Para o lado? Para que lado? Quem, afinal, roubou nossa
cueca pra fazer pano de prato?
Mas,
enfim, poesia é isso mesmo, não é não? Perguntas sem respostas. Se houvesse resposta
não seria poesia. Só me resta invejar o seu poder de síntese e a síntese do seu
poder, que reduz toda a condição humana a um verso singelo, e o Universo a um
gemido terminal. Parabéns!
E um
grande abraço do L.”
“Prezado
L:
Gostei
muito do que você escreveu sobre o verso que mandei, mas preciso fazer uma
confissão: mandei o verso errado. Queria que você comentasse o poema caudal em
170 estrofes que me custou quase um ano de trabalho mas me atrapalhei (sou um
pré-eletrônico, você sabe) e acabei mandando a letra de uma antiga marchinha de
Carnaval que, sei lá por que, meu neto de doze anos armazenou no meu laptop.
Mas obrigado assim mesmo. Grande abraço, M.”
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