20
de abril de 2013 | N° 17408
ARTIGOS
- José Alberto Wenzel*
Por que os humanos matam e
ferem?
Após
Wallace e Darwin, a humanidade poderia sentir-se privilegiada, uma vez que as
criaturas se transformariam evolutivamente, de forma gra-dual e contínua, num
processo de multiplicação das espécies e da seleção natural. Nos restaria a
questão da morte. Tanto que ao próprio Darwin se lhe assaltou, com extremo
desconforto, a morte de sua amada filha Annie. Situação que se exacerbou ao
final de sua vida, quando o reconhecido naturalista teria pronunciado as
palavras emblemáticas:
“Oh,
Deus”, alinhadas ao desespero do Gólgota: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”.
Por certo Dar- win conhecia a ponderação de Epicuro (341-270 a.C.), que nos
conclamou à usufruição da vida qualificada, uma vez que, estando vivos, ainda
não morremos, e se mortos, de nada nos adiantaria a preocupação com a morte,
pois não estaríamos mais vivos.
Três
dilemas basilares estariam, assim, solucionados: dispormos de vigorosa tese
para nossa origem e desenvolvimento, sabermos que vale a pena viver bem e,
quanto ao futuro, interceptado pela morte, este nos seria desprovido de maiores
providências. Se religiosos, poderíamos acrescentar que, com a intermediação da
espiritualidade, nos qualificaríamos para ainda maior merecimento celestial.
Contudo,
frente às recentes tragédias, as pessoas percebem-se surpreendidas e questionam
o porquê dos assassinatos e agressividades, em nítidas manifestações de
desconforto civilizatório. Diversas têm sido as respostas, ou melhor, as
possíveis tentativas de elucidar o enigma, instalado justamente quando, em alto
grau, é celebrada a vida, seja por convicções profundas e legais, seja pela
glamorização do lazer e “bem viver”.
Nem
de Epicuro, nem de Darwin. A resposta não nos chega convincente. Por que,
continuamos a ferir e matar? O fazemos conosco mesmos, com nossos semelhantes,
com as demais criaturas e com o meio em geral.
E se
tivermos girado a roda para o lado equivocado? Ao invés da evolução da vida,
por que não a da morte? Ou, se mais precavidos: evoluem tanto a vida quanto a
morte. O brotamento da vida, nos mais inóspitos sítios, constitui-se em grande
probabilidade, contudo a morte impõe-se como uma certeza irrecorrível. Não
será, pois, a morte, o motor maior, que tanto se nutre da vida, como pode
pairar além de todo e qualquer alento vital? A morte se lhe descabe a
impermanência.
Eis
a possível chave secreta: os humanos intuem, embora não aceitem, que estão
destinados à morte, e por isto matam e ferem. Não o fazem para se nutrir,
abrigar, garantir território ou fluxos procriativos. Com o que, estariam em
descompasso e destituídas de efetiva concretude as classificações e claves
evolutivas a partir do desenvolvimento da vida.
Talvez,
mais uma vez, nem Darwin nem Epicuro. Pode ser o inverso de tudo isto. Inverso
que tememos mais do que tudo o que aflora meridianamente. Seremos
suficientemente arrojados para nos expor a esta nova possibilidade?
*Escritor
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