25
de abril de 2013 | N° 17413
EDITORIAIS
A CULTURA DA DESOBEDIÊNCIA
Pesquisa
divulgada nesta semana pela Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas
evidencia, com percentuais, o que já se sabia pela prática: a maioria dos
brasileiros considera fácil desobedecer às leis e vê com naturalidade o chamado
“jeitinho”, que permite burlar normas, enganar autoridades e levar vantagem
individual mesmo quando isso causa prejuízos à coletividade.
A
percepção das pessoas em relação a esses temas é preo-cupante: dos 3,3 mil
entrevistados em oito Estados, 82% reconhecem facilidade em descumprir as leis
no Brasil, 79% acreditam que todos usam algum tipo de subterfúgio para
desobedecer a regras legais e 54% veem poucas razões para esta obediência.
Uma
das curiosidades do levantamento relaciona-se à impunidade. É elevado o
percentual de brasileiros que temem ser punidos por delitos como pequenos
roubos e infrações de trânsito, mas estas mesmas pessoas consideram tolerável
fazer barulho capaz de incomodar os vizinhos, fumar em local não permitido,
jogar lixo na rua ou comprar produtos piratas.
O
ideal é que todos esses comportamentos fossem repudiados pela maioria da população,
pois grandes crimes e tragédias invariavelmente têm na sua origem descasos e
omissões com coisas que aparentam ter pouca importância.
Vale
lembrar, por exemplo, que o incêndio da boate Kiss, em Santa Maria, foi o
resultado de um conjunto de inépcias e descuidos com recomendações técnicas que
existem exatamente para prevenir dissabores, somados à ganância e à irresponsabilidade
de quem colocou seus interesses acima do bem público. Existe no país uma
cultura da irresponsabilidade, pela qual as pessoas, das autoridades aos cidadãos,
costumam adiar decisões, transferir atribuições, fingir que não é com elas.
Precisamos,
decididamente, de uma revolução cultural, para que cada cidadão assuma a sua
parcela de obrigações. Nossa Constituição e nossos códigos preveem muitos
direitos e poucos deveres.
E a
população habituou-se a tolerar o desleixo, a conformar-se com pequenos
desvios, a considerar normal o descumprimento de normas e convenções. Essa
tolerância, além de se transformar em salvo-conduto para a impunidade, acaba
também estimulando comportamentos pouco civilizados e até mesmo delituosos.
É este
o ambiente retratado pela pesquisa recém-divulgada: os brasileiros se reconhecem
como protagonistas das pequenas infrações, mas acreditam que a corrupção é praticada
apenas pelos ocupantes do poder. Aí está o grande equívoco: o padrão ético de
um país é sempre resultado do comportamento de cada indivíduo. E, quando a
maioria dos cidadãos convive pacificamente com a irresponsabilidade, não há jeitinho
que resolva.
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